No último sábado, participei de um encontro festivo de ex-seminaristas da década de 1980. Mas por que um encontro de velhos amigos valeria um artigo de jornal? O que vale para refletir é mais que a boa comida, o chimarrão, a cerveja, a música e a conversa jogada fora.
Tivemos a alegria da presença de um grande mestre de todos nós, o Pe. Adilson José Colombi. Pe. Adilson nos incitou a relembrar em que o seminário marcou nossa vida, e falamos da experiência de vida comunitária, do aprendizado da disciplina no uso do tempo, da formação intelectual privilegiada, comparada com a maioria dos nossos contemporâneos, das marcas da formação ética, dos princípios que continuamos carregando. Então, o fato de nos reunirmos para colocar a conversa em dia e relembrar os velhos tempos é também ocasião para uma tomada de consciência do nosso papel no tempo e no lugar em que vivemos.
É claro que não poderia faltar política e filosofia na conversa, e a figura de Pe. Adilson foi essencial para isso. Pe Adilson doutorou-se na França, especializando-se na obra do filósofo Emmanuel Mounier, um grande defensor do valor da pessoa humana, que junto com outros humanistas cristãos, enfrentou o fascismo, o nazismo e o comunismo, os grandes flagelos do século XX. Alguém perguntou ao Pe. Adilson o que Mounier diria hoje da política brasileira, ao que ele respondeu com uma expressão emblemática: “desordem institucionalizada”. De fato, estamos em vias de tirar alguns corruptos do poder para colocar outros. Movimentos sociais, que dizem defender a democracia, promovem a baderna para defender corruptos, e a descrença e a desesperança são cada vez mais frequentes. O debate intelectual parece ter se cristalizado em posições fechadas e acríticas. A qualidade do ensino decai a olhos vistos. Em âmbito mais próximo, nossas relações estão cada vez mais baseadas no egoísmo e na busca de proveito próprio, o que destrói os laços familiares e sociais, ameaçando gravemente o futuro. Vivemos um tempo de intensas contradições.
Nesse contexto, podemos entender melhor o nosso papel, não apenas nós que passamos pelo seminário, mas todos os que, da nossa geração, aprenderam os mesmos valores. O Pe. Adilson, há tantas décadas, vem sendo o elo entre nós e esses grandes valores, que sustentaram combatentes em situações piores que a nossa. Cabe a nós também fincar o pé, e com a mesma serenidade e firmeza, que são a marca registrada do nosso mestre, deixarmos também uma marca, que possa influenciar, de algum modo, as novas gerações. Em 20 ou 30 anos, estaremos todos fora de combate. O que ficará de nós para o futuro? Estamos todos imersos nas contradições do nosso tempo, sentimos tudo isso, em grau maior ou menor, em nossos filhos, nossos alunos – já que boa parte de nós propendeu para a carteira docente – ou nas nossas próprias limitações pessoais. Mas não podemos simplesmente nos entregar à murmuração e ao saudosismo. Nossa vida deve dar testemunho dos valores que absorvemos e nos quais acreditamos. Não vamos salvar o mundo, mas podemos, cada um ao seu modo, sermos sal e luz, setas que indicam um caminho, mesmo que haja poucos interessados em segui-lo. Esses poucos, por sua vez, continuarão o trabalho. Precisamos estar conscientes disso. Creio e espero que nossos encontros sirvam para reforçar essa consciência.