Eu não gosto de viajar
de avião. Quando vou a São Paulo, em menos de uma hora de voo, já fico agoniado
para que aquele troço desça logo ao chão. Claro que não tenho saudades das
horas intermináveis das dezenas de viagens de ônibus que fiz para lá. Mas eu
sou taurino, e prefiro deixar o desejo de voar para a poesia. A terra me deixa
mais sossegado.

Essa coisa física de
pisar o chão se liga também a outra, mais psicológica e espiritual, de querer
estabilidade e segurança. Para muitas pessoas isso não é tão importante. Elas
se sentem menos presas, são mais amigas do ar e se deslocam com mais facilidade
e prazer, seja do ponto de vista físico, seja na mudança de estados ou
situações. Ambos os tipos de personalidade existem e são perfeitamente
legítimos. Ajudam a compor a pluralidade do mundo, que é um dos seus inúmeros
encantos.

Mas, o contraponto
entre a terra e o ar, a estabilidade e a fluidez nos deixa muito a refletir. Nossa
vida, independente da nossa personalidade específica ou das nossas
circunstâncias históricas, precisa, em alguma medida, dessas duas coisas.

Por
ser mais amigo da estabilidade, às vezes, tenho dificuldades com as mudanças
necessárias, e acabo pagando algum preço por isso. Quem não faz questão de ter
raiz nenhuma, usufrui da sua liberdade psicológica mais ampla, pois não se
prende muito a nada, mas isso também não sai de graça. De algum modo,
certamente se ressentem da insegurança e da instabilidade. Os pássaros também
têm seus ninhos e as aves migratórias, por mais que vaguem, têm destinos
traçados para onde chegar.

Penso que a vida é a
busca constante do frágil equilíbrio entre esses dois pontos. O apego excessivo
ao chão pode nos tornar conservadores e inflexíveis. Mas, a falta de raízes nos
torna demasiado vulneráveis. Creio que nossa natureza exige de nós alguma
estabilidade, uma base sólida sobre a qual possamos nos estabelecer.

Determinados valores e convicções são parte dessa base, como o são nossos
hábitos, nossa família, nossos compromissos. O ser humano não pode viver como
um caniço agitado pelo vento, ao sabor dos desejos e modismos que vão e vêm.
Percebo que muita gente parece tratar a vida como se fosse uma barraca de
camping, que se monta e desmonta em alguns minutos, e pode ser levada de
qualquer lugar para qualquer lugar.

Uma barraca dessas é muito útil e pode ser
agradável para alguns dias durante as férias, mas duvido que alguém queira
morar permanentemente nela. É preciso ser acomodado demais para se contentar
com tão pouco.

Onde fica nossa casa,
o local onde estão guardadas nossas convicções e nossos tesouros? Onde, e em
que circunstâncias nosso coração repousa? Ser um andarilho pode até parecer
romântico, mas certamente está abaixo das exigências da nossa humanidade.