Universidade Gratuita: cresce número de estudantes de Brusque rejeitados no programa
Insatisfação motiva mobilizações em várias regiões de Santa Catarina
Insatisfação motiva mobilizações em várias regiões de Santa Catarina
Nos últimos dias, estudantes de Brusque e de diversas universidades de Santa Catarina têm se mobilizado para questionar a distribuição dos recursos do programa Universidade Gratuita (UG), criado pelo governo estadual.
Lançado com grandes expectativas e promessas de inclusão, o programa despertou a esperança de milhares de jovens catarinenses que sonhavam em conquistar um diploma universitário sem custos.
Porém, segundo vários grupos de estudantes, “esse sonho se transformou, para muitos, em um pesadelo financeiro, marcado por dívidas, frustração e abandono precoce dos estudos”.
Em uma nota conjunta, alunos dos cursos de medicina da Unifebe, Univille (Joinville), Unochapecó (Chapecó), Furb (Blumenau) e Unidavi (Rio do Sul) afirmam ter se unido para “denunciar o colapso” do programa;
Uma nota também foi divulgada, separadamente, pelos estudantes da 1ª fase de medicina da Unifebe, há quatro dias. Nela, os alunos afirmam que, em 2025, dos 60 estudantes da turma, apenas quatro foram contemplados com a bolsa de estudo.
Segundo os acadêmicos, a seleção dos candidatos às bolsas do programa deveria considerar o “percentual de comprometimento da renda bruta familiar” com a mensalidade. Dessa forma, teriam prioridade os estudantes cuja renda estivesse mais comprometida com os custos da graduação.
No entanto, eles alegam que o critério adotado pelo governo do estado tem sido apenas o Índice de Carência (IC), sem considerar o peso da mensalidade no orçamento. Isso teria prejudicado especialmente os estudantes de medicina, cujo curso custa em torno de R$ 10 mil por mês em algumas fases.
“A maioria dos alunos dos outros cursos terão mais recursos disponíveis do que quem está estudando medicina, onde quase toda a renda vai para a mensalidade. O índice, portanto, nem sempre revela a realidade da vida de cada um”, relatou um aluno de Brusque, que preferiu não se identificar.
Outro ponto crítico, segundo os estudantes, é a exigência de matrícula antes da confirmação da bolsa. Com mensalidades elevadas, muitos acabam contraindo dívidas, alegam não conseguir reembolso ou apoio e, em alguns casos, ainda têm o nome negativado.
Eles também apontam demora nos editais e ausência de transparência nos critérios de seleção como fatores que tornam o processo ainda mais angustiante.
O jornal O Município conversou com outra estudante que preferiu não se identificar. Segundo ela, mesmo cumprindo todos os requisitos do programa, não foi contemplada com a bolsa.
Ela diz que no último dia da seleção, apenas os contemplados receberam e-mails de aprovação. Os demais não foram oficialmente informados sobre o encerramento do processo.
“Disseram apenas que notificariam até onde houvesse verba disponível. Passamos o dia inteiro angustiados, até que começou a circular, em grupos de WhatsApp, um documento oficial com a lista dos contemplados. Foi assim que descobrimos que as bolsas haviam acabado. Isso não é ser transparente”.
Ela também critica a condução do programa alegando que a distribuição de recursos é desigual entre as instituições. “Embora essa verba aumente a cada ano, para Brusque, os recursos são menores do que em outras instituições. Na Univali, por exemplo, sobra bolsa; aqui, falta”.
Ela conta que era bolsista do Uniedu (programa com objetivo parecido) com 50% e, no início do UG, teve receio de migrar. Quando colegas começaram a ser contemplados, decidiu acreditar na ‘promessa’ e tentar, mas não foi selecionada. Por ter ficado sem nenhuma das duas bolsas, diz que pensa em trancar o curso.
Uma terceira estudante, que está vivendo o mesmo cenário, relatou ao jornal que procurou deputados estaduais e federais em busca de apoio. Segundo ela, alguns responderam e demonstraram solidariedade.
“Eles disseram que já estão pautando o tema com o governo. Enquanto isso, sonhos são adiados e famílias, dilaceradas pelo peso das dívidas. Queremos acreditar no potencial do programa, mas, para isso, ele precisa cumprir sua promessa que, ao que me parece, não passou de uma propaganda forçada”, disse.
Questionada por O Município, a Unifebe afirmou que, neste semestre, 222 novos alunos foram contemplados. Somando os três primeiros semestres do programa — 2023.1, 2024.1 e 2024.2 — já são 743 acadêmicos beneficiados com auxílio financeiro integral.
Reconheceu, no entanto, que nem todos os inscritos foram beneficiados, já que a procura superou os recursos disponíveis, conforme previsto em lei. “Embora o recurso não tenha sido suficiente, vale ressaltar que o processo é bastante transparente, com muita lisura”.
Sobre as dívidas acumuladas pelos estudantes e suas famílias, a instituição informou que já adota uma prática consolidada de negociação. O parcelamento de débitos é analisado individualmente, e o aluno deve procurar o setor financeiro para avaliação.
Ainda de acordo com a universidade, alunos que já recebiam bolsa do Uniedu à época da implantação do programa tiveram a continuidade garantida. A instituição também explicou, em detalhes, que a variação no número de contemplados está diretamente ligada ao perfil dos alunos e aos cursos.
“Se o montante total de recursos disponíveis para auxílio financeiro em 2025 for de R$ 2 milhões, e forem contemplados mais alunos de cursos com mensalidades mais altas, por terem um menor Índice de Carência, naturalmente serão contemplados menos alunos. Caso o mesmo valor seja direcionado a cursos com mensalidades mais acessíveis, será possível beneficiar um número maior de estudantes. É apenas uma questão matemática, e nem o governo nem a instituição tem gerência sobre isso. Tudo depende do perfil dos alunos habilitados e dos cursos em questão”.
Sobre o movimento dos estudantes, declarou que ele é legítimo, mas salientou que nenhuma lei foi descumprida. “Não há surpresa, não há fato novo, não há descumprimento de lei. Logo, neste momento, não cabe à instituição qualquer movimento em prol de recursos adicionais. Mas a mobilização estudantil é legítima”.
A nota finaliza reforçando que a lei foi proposta pelo governo estadual, amplamente debatida e aprovada pela Assembleia Legislativa.
Em meio às manifestações e notas de repúdio, a Secretaria de Estado da Educação (SED) passou por uma mudança de comando. Aristides Cimadon deixou o cargo, sendo substituído por Luciane Ceretta.
Além dos desafios propostos por ela e pelo governador Jorginho Mello (PL), a nova secretária também terá de lidar com as demandas relacionadas ao programa.
“Precisamos fazer ajustes no Universidade Gratuita para deixá-lo ainda melhor, ampliando o número de catarinenses beneficiados”, afirmou o governador durante a cerimônia de posse, realizada na segunda-feira, 26, em Florianópolis.
Luciane tem 30 anos de atuação no magistério superior e foi uma das principais entusiastas do programa. “Vou dar continuidade aos projetos que estão dando certo e aprimorar o Universidade Gratuita, além de melhorar as estruturas físicas das escolas da rede estadual”, declarou.
Em nota enviada ao O Município, a SED informou que os recursos repassados às instituições cadastradas no programa aumentaram de 2024 para 2025.
Segundo o edital, a assistência financeira do UG está prevista da seguinte forma:
Ainda conforme a nota, a distribuição do valor da assistência financeira às instituições é feita conforme os limites financeiros e orçamentários, proporcionalmente ao número total de estudantes matriculados em cursos de graduação presenciais, como prevê a legislação.
“Para concorrer, o estudante precisa cumprir os requisitos legais, e a concessão respeita a classificação pelo Índice de Carência, priorizando quem mais precisa do apoio financeiro”.
Desenvolvedor de Guiné-Bissau, na África, conheceu Brusque após contato no LinkedIn: