Virose, fratura, capotamento e festa: a história de Deni Nascimento no Sertões 2023
Piloto revela bastidores e aventuras que enfrentou com o navegador Gunnar Dums para conquistar seu segundo título
Piloto revela bastidores e aventuras que enfrentou com o navegador Gunnar Dums para conquistar seu segundo título
Quando o piloto brusquense Deni Nascimento e o navegador Gunnar Dums se tornaram os campeões do Rally dos Sertões 2023 na categoria UTV1, neste domingo, 20, todos os percalços e obstáculos dos últimos dias haviam se tornado histórias com finais felizes em meio a uma conquista que ficará para sempre na memória da dupla e da equipe Bompack Racing. Costela quebrada, capotamento que quase afundou o veículo na água e uma parada que não estava prevista são relatados com leveza por Deni; temperos que fazem desta vitória uma das mais especiais desde que entrou no automobilismo off-road.
O título teve um detalhe especial no UTV: o Can-Am Maverick X3 RS era movido a álcool. Além de utilizar um combustível menos poluente, a ideia era otimizar temperaturas de motor e correia. Os testes foram feitos nas primeiras competições do ano, e o resultado foi ótimo. “Era um foguete”, comenta Deni, que é natural de São João Batista, mas vive em Brusque há vários anos. Com o UTV a álcool, ele e Gunnar Dums venceram o Rally Minas Brasil e o Rally RN 1500 neste ano.
Foram verificados alguns desgastes em engrenagens no Rally Jalapão, depois de duas provas com excelente desempenho. Foi tudo verificado e corrigido para o Sertões. “Fomos acertando ele. Compramos um kit dessas peças que desgastavam e fazíamos a troca a cada dois dias. O carro ficou muito forte.”
Bicampeão do Sertões, o piloto de 45 anos acumula os títulos de 2019 e 2023 no UTV. Com o navegador Gunnar Dums, de São Bento do Sul, é a primeira vez. “O Gunnar é um excelente navegador, tem uma rapidez de raciocínio e cálculo, que são necessários na navegação. E é um cara muito tranquilo. Na hora da decisão ele é calmo, diz que vai dar certo, não é um cara nervoso ou estressado. Tínhamos todas as qualidades para disputar este título.”
Deni também destaca o nível da categoria UTV no Rally do Sertões, que inclui campeões de grandes competições internacionais, Rally Dakar. Há também campeões mundiais de UTV. “Hoje o Brasil é um celeiro de pilotos de UTV. O nível de pilotagem é muito alto. Tem Nelsinho Piquet, que já correu em fórmula 1; Felipe Fraga, já foi campeão de Stock Car. Jean Azevedo, multicampeão no mundo off-road.”
“Dos 90, tem pelo menos 20 caras para ganhar o Sertões. Não tem outra prova no mundo com esta quantidade de UTVs”, completa.
Sua equipe, a Bompack Racing, tem estrutura e equipe reduzidas em comparação às principais adversárias. Deni exalta o ambiente interno, mas também o bom relacionamento com outras equipes.
“Somos vistos como uma equipe amiga, que joga limpo. Já perdi provas, às vezes temos até participação nas conquistas de nossos amigos. Fazemos o bem e recebemos o bem de volta.”
“Rali não se ganha sozinho. Não adianta só ter o melhor piloto ou o melhor navegador. Tem que ter uma equipe. Os guris entregaram o carro zero, todos os dias. Quando alguns podiam a equipe ‘se batendo’, ou o caminhão nem tinha chegado, nosso carro estava com a revisão quase pronta. Eles montavam e desmontavam aquele carro todos os dias”, elogia.
Finalizando a quarta etapa, no último dia 15, Deni e Gunnar avistaram um UTV parado. Era o também brusquense André Hort, da MH Racing.
“Não tinha como eu não parar para ver o que tinha acontecido. O André tava dentro do carro, o navegador dele [Henry Kirst] tava do lado de fora, pedindo para a gente parar. Estávamos liderando a prova até então. Mas bateu mais forte a questão da amizade, isso colocou de lado a competição”, explica Deni.
Era um problema de pane seca. A ideia inicial da dupla parada era ser puxada pelos últimos 500 metros da etapa, no final da qual seria possível fazer o abastecimento. Contudo, não foi possível. O UTV de Deni e Gunnar atolou na areia.
A solução encontrada foi a pé. Era a mais simples. Deni e Gunnar finalizaram a etapa e pediram para que fosse entregue combustível a André Hort e Henry Kirst.
A dupla da Bompack Racing acabou perdendo a liderança naquele momento. Hort não queria que fosse Deni e Gunnar a tentar ajudá-los, sabendo que significaria um sacrifício de tempo na prova dos amigos. De qualquer forma, o episódio acabou não comprometendo a conquista. A MH Racing finalizaria o rali e a Bompack Racing seria campeã.
Uma semana antes do Sertões, Deni recebeu uma moto que havia encomendado. Quando recebeu um convite de amigos para fazer uma trilha, decidiu testar seu novo veículo. “Mantenho a moto como um treino físico e também de leitura de terreno, da estrada”, explica.
Durante a trilha, caiu em um atoleiro. Sentiu falta de ar, mas, pela dor, não conseguia sentar na moto. A princípio, imaginou ser apenas um mau jeito. Os primeiros exames, mesmo com a radiografia, foram inconclusivos, e pareciam ser apenas uma lesão muscular mais forte.
Já no Sertões, as dores eram muito fortes. Para a primeira etapa, a equipe colocou uma suspensão mais macia no UTV, na tentativa de amortecer impactos ao piloto. Contudo, a suspensão se provou macia demais, e o veículo teve problemas em sua balança. Foi utilizado, a partir da segunda etapa, o equipamento original. “Pedia pro Gunnar me ajudar na segunda etapa. ‘Me ajuda aí, parece que to vendo bichinho nessas curvas”, relata. Era a combinação das dores, da medicação forte e da alimentação reduzida.
Inconformado com a dor, Deni consultou a equipe médica disponível na competição, em Petrolina, no dia 15. Somente ali, com quatro etapas concluídas, o diagnóstico foi confirmado: fratura na costela, sofrida na trilha de moto na semana anterior ao Sertões. O piloto foi liberado para continuar a prova. “A conclusão foi de que, se eu havia chegado até ali, poderia continuar. Se fosse para ter sofrido alguma lesão mais grave por conta da fratura, já teria acontecido.”
No dia 16, Deni realmente pensou em desistir, após ter contraído uma virose, e comunicou a possibilidade à equipe que estava presente no local. “O Fê [Felipe de Amorim, chefe de equipe] disse: ‘por que não tenta fazer pelo menos os 60 quilômetros de deslocamento [para a etapa]? Se tu não melhorar, aí sim.”
A largada da quinta etapa, em Petrolina (PE), foi dada sem Deni ter tomado o café da manhã, precisando tomar as fortes medicações para a dor na costela. “Me senti melhor no deslocamento. Tomei um shake, um comprimido e fomos. A adrenalina subiu e consegui evoluir.”
Na sexta etapa, disputada no último dia 17, Deni e Gunnar tinham um ótimo desempenho, até um momento em que se perderam em algumas curvas com elevações. O UTV derrubou algumas cercas que margeavam um açude e caiu a um metro da água, capotado, com a porta do lado de Deni no chão. Se o veículo caísse no açude, seria o fim do Sertões para a Bompack Racing.
“Íamos pegar uma cinta, esperar passar algum colega e tentar desvirar o carro. Até que pensei que poderíamos fazer isso sozinhos. No um, dois, três, empurramos e conseguimos”, relembra Deni. O carro voltou à posição normal e a dupla retomou a prova.
1) Deni Nascimento e Gunnar Dums – 28h30min17
2) Rodrigo Varela e Matheus Mazzei – a 1min39
3) Thiago Fraga e Álvaro Amarante – a 33min00
4) Bruno Varela e Gustavo Bortolanza – a 35min06
5) Gabriel Cestari e Jhonatan Ardigo – a 35min50
1ª etapa – 12/08
Petrolina (PE)
2ª etapa – 13/08
Petrolina (PE)
3ª etapa – 14/08
Petrolina (PE) – Xique-Xique (BA)
4ª etapa – 15/08
Xique-Xique (BA) – Petrolina (PE)
5ª etapa – 16/08
Petrolina (PE) – Crato (CE)
6ª etapa – 17/08
Crato (CE) – Sobral (CE)
7ª etapa – 18/08
Sobral (CE) – Cruz (CE)
8ª etapa – 19/08
Cruz (CE)
Distância total: 3.793 km
Deslocamentos especiais: 2080 km
Deslocamentos de apoio: aprox. 1.100 km
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