Dia desses aí, durante a fala de um cara estudado, sobre as novas tecnologias, fui carregada para momentos em que presenciei muitas certezas que ouvimos lá e cá pulsadas de “nuncas” ou “se fosse meu filho…”. Gosto de desconfiar das certezas, inclusive as minhas. Por isso, quando as encontro, fico atenta.
– Meu filho não faria um vídeo desses. Ele iria se arrepender para o resto da vida. Também, já viu os pais? Cheio dos rolos. A filha vai no mesmo caminho, já viu as fotos que ela posta?
– Nunca que eu daria um celular pra uma criança de oito anos. Isso é um absurdo!
O moço da palestra dizia que as crianças de hoje encaram os celulares, por exemplo, como uma extensão do próprio corpo, e não como uma ferramenta que se guarda vez e outra na estante ou que o uso é uma opção. Tratam o aparelho com afeto.
Resolvi colocar em prática outro exercício que também gosto por demais. Trocar os papéis. Eu, aos quinze, catorze, quem sabe treze, aquela idade bem bagunçada, florida ao cúmulo, rasa de responsabilidades e mais rasa ainda de noções de consequências. Eu!, fui lá para trás, me imaginei com uma câmera nas mãos e audiência global a um segundo de assistir o que eu julgaria “legal” naquele momento. O que eu teria feito? Que coisas teria dito? Que confusões teria me metido? Afinal, foi sorte ou azar passar a adolescência sem registrar tudo, sem fazer de uma fofoca “prints” eternos, sem morrer de medo que aquele segredo virasse foto ou vídeo, sem ter que administrar uma vida real e outra virtual? Sem ter que me sentir a pior pessoa do mundo por ter enviado um “nuds” achando que era prova de amor?
“
Pera lá”! Por que citei somente o que é negativo? Tanta certeza? São simplesmente registros de uma cultura da imagem? Será só isso? Uma geração perdida nas telas?
Essa geração ampliou suas extremidades para o mundo e é a primeira a possuir uma ferramenta absurdamente poderosa nas mãos e usufrui-la em busca de um equilíbrio com o meio, com os outros. Trata-se de OUTRA maneira de se relacionar. Não é errada. É a geração de adolescentes e crianças que experimenta o acesso a maior quantidade de informação, conhecimento humano já catalogado na história – também um monte de porcarias, sabe-se disso.
É essa galera que está driblando o consumo presente nessas maquininhas, imagens toscas, violentas, sensuais, perversas, pervertidas, saradas, falsas, ridículas, pessoas felizes de mentira com a magnífica literatura, imagens da natureza, rezas, arte, notícias boas, pessoas felizes de verdade. É um montão de coisas para se perder, e outro monte para se achar.
Como exigir discernimento do adolescente e da criança no manuseio do que é tido como tão natural para eles? E nós? Os mais velhos que adolescentes, vivenciamos pela PRIMEIRA VEZ esta relação com filhos, sobrinhos, netos que nascem virtualizados.
Não tenho certeza que seja errado uma criança usar ou ganhar um celular. Talvez considere pior algumas serem privadas das novas tecnologias, devido nossos problemas econômicos sociais. Tão pouco penso que uma ou um adolescente que tenha divulgado fotos ou vídeos nus seja condenado às pedras dos demais imaculados.
Não há a época perfeita para liberar o uso do tablet, computador, celular para os pequenos. O que temos é uma ideia baseada em NADA, pois não há passado de referência. É importante perceber o presente e conversar, decidir com cuidado, sentir as limitações, vestir os sapatos dos outros.
Quantos “nãos” devo proferir em relação à comida, o consumo de brinquedos e roupas, a relação com os amigos e a escola? QUEM É QUE SABE? Minha aposta é na dúvida, na busca de um mais ou menos. Num acordo que respeite o sol real e o virtual, que leve meu filho para os barrancos aqui de casa e para a chuva, mas que a vontade dele de passar uma tarde jogando vídeo game também prevaleça e seja respeitada.
Enfim, não curto as certezas.
Professora Karline Beber Branco