“… e isso quer dizer que um dos inimigos da leitura é a própria vida. A vida não é leitora porque não é contemplativa. A ambição, o amor, a avareza, os ódios, sobretudo os ódios políticos, os ciúmes, as rivalidades, as disputas locais, tudo o que torna a vida agitada e violenta nos afasta psicologicamente da própria ideia de ler alguma coisa. Millevoye, em sua juventude, era ajudante de livreiro. Seu patrão o surpreendia lendo: “Você lê, meu jovem; jamais será livreiro.” Ele tinha razão: o homem que lê não tem paixões, essa é a sua marca; ele não terá sequer a paixão pelo seu ofício, ainda que tal ofício fosse vender livros.”

Todo bom shopping, uma livraria

O melhor de ir a um shopping completo é poder visitar uma boa livraria e, se der sorte, esbarrar com uma baita promoção. Sim, em um sábado de maio, tive esta sorte, encontrei várias etiquetas nos livros indicando o valor de R$ 9,90.

Bati o olho no livro “A arte de ler”, de Émile Faguet e o carreguei comigo até o piso superior da livraria, onde fui em busca de outra obra, “A causa sagrada de Darwin: Raça, escravidão e a busca pelas origens da humanidade”, de Adrian Desmond e James Moore, também pela módica quantia de R$ 9,90.
Desci as escadas, olhei para a obra de Faguet e embora não o conhecesse, segui meu instinto de leitora e o levei para casa. Alguns dias depois da compra, iniciei a leitura e não consegui mais parar até terminá-la.

Certa vez, o escritor e filósofo francês Voltaire disse: ‘Lê-se muito pouco. E, entre os que desejam se instruir, a maioria lê muito mal.’ Voltaire talvez repensasse essa afirmação se soubesse que essa maioria que ‘lê muito mal’ simplesmente o faz por não saber como ler.

Isso quer dizer que a leitura nada mais é do que técnica? Sim, e não apenas uma, mas um conjunto delas – é o que afirma Émile Faguet, autor de A arte de ler, que chega às livrarias com o selo da editora Casa da Palavra, traduzido por Adriana Lisboa.

Èmile nos ensina como ler: os livros de ideias, de sentimento, as peças de teatro, os poetas, os escritores obscuros, os maus autores. Nos apresenta os inimigos da leitura e a leitura dos críticos, finalizando com o tópico “reler”.

O original é em francês e permanece atual após mais de 100 anos da sua publicação (1911), nesta época de excesso de informações, em que otimizar a leitura é oportuno.

O autor se utiliza de diversos exemplos e cita pensadores valorosos, o que nos dá a dimensão do seu conhecimento e do arsenal de leituras realizadas por ele. Talvez o livro tenha me conquistado, primeiro: pela escolha da capa; segundo: por iniciar em companhia aos pensadores (sempre adorei lê-los); terceiro: pela argumentação “amarrada” do autor.

Naquele dia, saí do shopping feliz e em ótima companhia.

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Méroli Habitzreuter – escritora e ativista cultural