Ao ler ano passado a matéria da Jornalista Rita Lisauskas para o Estadão, fiquei pensando quando colocaria minha pitada de sal neste angu. A hora chegou e, embora minha opinião pouco importe aqui ou acolá, correndo o grande risco de desagradar a muitos ou ser taxada de radical, não me importo, já que o tema, creio eu, valha pelo menos um pensar sobre a que ponto chegam alguns de nós para viver o “american dream”.

O tema de Rita era  o “bebê gourmet”. O “in” agora é nascer em Miami – destacando que não tem bastado para brasileiros fazer enxoval nos States ou matricular o filho em escola bilíngue. A nova moda agora entre os pais brasileiros é que o filho nasça em Miami.

Pergunto-me o que pensam os que tem esta genial ideia, assegurar um futuro brilhante a seus filhos simplesmente porque nasceram em solo americano e não precisarão mais de vistos para entrar na terra do Tio Sam? Sim, porque de imediato apenas isto conseguirão, já que até a vida adulta continuarão a ser brasileiros como todos nós aqui, vivendo neste país não tão digno de orgulho por seus genitores, haja vista que terão juntamente com seus pais, nada “norte americanos”, de retornarem ao Brasil nosso de todos os dias com suas malas e mamadeiras, a não ser, claro, que tais pais geniais tenham significativo potencial financeiro (bem significativo por sinal) para lá nos “States” permanecerem com o filhote, edificando cada vez mais e mais o sonho e o crescimento norte americano.

tio sam
arte: Silvia Teske

Tudo bem, entendo que o Brasil não está lá em tão perfeito rumo, e penso que talvez nunca estivemos, face as eternas e difíceis lutas diárias motivadas pela gama de crises sociais, morais, políticas, econômicas e várias outras que temos que transpor quase todos os dias. Mas daí você optar por burlar intencionalmente a ordem natural da vida de um filho apenas para dar-lhe uma cidadania que não será verdadeiramente sua, mais numa tentativa, talvez, de  negar a si próprio a realidade, é pelo menos reprovável. E aqui me imponho ser educada, porque penso na verdade ser bem mais que isto, já que mais parece a prova inequívoca do velho “jeitinho brasileiro” de tentar mudar o que lhe convém ou possa parecer-lhe vantajoso de certa maneira, pouco se importando com valores.

Rita, em seu texto apimentado, acrescentou: as crianças logo voltam ao Brasil porque apenas elas são americanas. Seus pais, não. Só eles, os bebês de Miami, obtém a dupla cidadania. Seus pais continuam dois rapazes latino-americanos, sem parentes importantes e nascidos em terras brasilis, onde não se fala espanhol, mas português, cuja capital é Brasília e não Buenos Aires. Daqueles que têm de tirar visto para visitar a terra do Tio Sam, já que só o bebê não pega fila na imigração. Seus pais ainda têm de responder ao “Where are you from?

Esses pais, cheios de boas intenções, claro, dizem que querem que os filhos tenham mais chances e um “futuro melhor”…  Eu continuo me perguntando, será esta mesmo a intenção desta “gourmetização da maternidade”? Sei não …

avatar sandra tomasoni

 

 

 

Sandra Tomasoni – advogada