Quem diria… o espetáculo de abertura das Olimpíadas do Rio alcançou o que mais nada tem conseguido, nestes últimos anos conturbados: praticamente reunificar os brasileiros, nós, que andamos até desfazendo amizades por conta de opiniões divergentes. Aplausos foram quase unânimes, mesmo com ressalvas e críticas. Talvez a gente esteja com uma necessidade tão grande de oxigenar a autoestima nacional que o talento dos envolvidos na produção da festa virou combustível para a esperança na criatividade e eficiência made in Brasil.

Mas, enquanto uns se derretem por Gisele Bündchen e outros riem da escalação “global populista” de Regina Casé, o meu momento preferido da cerimônia foi esse aí acima, que não vimos na TV e que foi publicado no Twitter oficial de Elza Soares: o selinho que a novata Karol Conka deu na cantora veterana, nos bastidores da festa. Um encontro de forças, vindas de momentos tão diferentes no tempo… mas que dividem a mesma missão.

Mulheres, negras, artistas, representando seus tempos e enfrentando preconceitos. Elza Soares tem uma energia palpável, uma força absurda, tão grande hoje, em seus mais ou menos 80 anos (há controvérsias sobre sua data de nascimento), quanto nos anos 60, quando desafiou o Brasil a engolir sua relação com o ídolo Garrincha.

Já a curitibana Karol Conka… fiquemos de olho nela. Ela representa a mulher no rap brasileiro de hoje. Poderosa e cheia de autoridade. É no meu tempo / As minhas regras vão te causar um efeito / É quando eu quero, se conforma, é desse jeito / Se quer falar comigo então fala direito, fala direito

 

Está na moda dizer que a gente não pode lutar a luta alheia. O que está certo, até certo ponto. A gente pode ter empatia e pode, claro, apoiar as lutas específicas. Homens podem ser feministas, desde que não se achem no direito de definir quais são as prioridades femininas. Portanto, não sendo negra, posso só imaginar essas artistas, de épocas e condições tão diferentes, fazendo parte de uma corrida em busca de espaço, de direitos, de (mais uma vez o tal) empoderamento. Aplaudo. Reverencio.

O beijo da foto é a melhor representação do revezamento de uma tocha que não é olímpica, mas histórica.

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Claudia Bia – jornalista e praticamente incolor