É preciso saber quando mudar de ares. Sair da conveniência, para buscar o afeto. Ela não aguentava mais sua vida de indisciplina e descompasso. Então, num dia qualquer ao final da tarde, ela reencontrou uma amiga.  Elas já se conheciam, pois vinham da mesma cidade, pegavam o mesmo ônibus, todos os finais de semana para voltarem para a Universidade.

Ambas estavam à procura de algo. A amiga queria dividir seu quarto, no apartamento que morava com uma dentista mais velha que alugava o  extra, para ajudar nas despesas e não ficar sozinha. Ela, cansada de morar em um cubículo e em uma casa que não lhe dava o conforto de lar. Conversaram, e foi muito rápida a mudança…somente cinco andares.

O prédio de tijolinhos angustiados, possuía no décimo segundo andar, um lugar-lar e uma amiga com quem trocar confidências. Essa amiga foi muito importante para que ela somasse as suas descobertas vários imaginários que tinham sido engavetados na ânsia de fugir de sua vida interiorana. Havia o cheiro de lar, o linguajar da terra…havia carícia. A dentista, uma mulher feita tinha um jeito peculiar de viver sua vida, e aparecia pouco.

Então as duas, acabaram por criar hábitos divertidos: iam a praia, o círculo de amigos mudou, as referências se ampliaram. Ganhou mais confiança nessa época, pois a amiga era um ser especial, de uma ternura e humor ímpares. Alguma coisa entre a doçura e a sensatez foi transmitida, e ambas ganharam.

Época cristalina, época em que os medos eram assumidos e as coragens reveladas. Dias de sol, mar e conversas no sofá. Menos bares, menos despesas, uma noção maior de responsabilidade. Horários determinados, marcavam uma rotina tranquila. Mesmo que as conversas não fossem especialmente sobre arte, beirava a reflexões sobre a vida, sobre as mulheres que eram, e que queriam ser. Ivana, uma moça terna, forte e íntegra…anos depois se foi desse mundo, muito jovem ainda, mas com a certeza de que já tinha cumprido seu papel aqui…

Foram poucos os anos que ela dividiu com Ivana, mas esta experiência foi importante para as próximas decisões e os próximos trânsitos. Foi, a partir dessa convivência que se viu, pela primeira vez dona do seu nariz.

Silvia Teske – artista