Casa Lar: como funciona espaço de acolhimento em Brusque para crianças que tiveram direitos violados

Serviço acolhe crianças de 0 a 18 anos incompletos de forma temporária

Casa Lar: como funciona espaço de acolhimento em Brusque para crianças que tiveram direitos violados

Serviço acolhe crianças de 0 a 18 anos incompletos de forma temporária

Em novembro deste ano a Prefeitura de Brusque inaugurou a Casa Lar, um serviço de acolhimento para crianças em situação de violação de direitos. A casa é uma modalidade de acolhimento institucional. O acolhimento temporário acontece durante o processo judicial que trata da situação que gerou uma medida protetiva, documento esse que serve para o encaminhamento da criança ou adolescente para a Casa Lar.

A principal diferença da Casa Lar para as demais modalidades de acolhimento institucional para crianças está na capacidade quantitativa, que acolhe até dez crianças, independentemente de gênero ou deficiência. Entretanto, o número é reduzido quando são recebidas crianças com deficiência por conta da demanda necessária para os cuidados.

Atualmente, a Casa Lar de Brusque atende quatro crianças. O serviço é disponibilizado para crianças de 0 a 18 anos incompletos.

A coordenadora da Casa Lar, Leila Cipriani, enfatiza que a capacidade é justamente para “garantir um processo de acolhimento mais individualizado, mais singularizado, respeitando a identidade de cada um, respeitando o histórico de vida de cada um”.

Entre os trabalhadores, o espaço possui cuidadores, que são educadores sociais ou monitores. Eles trabalham em duplas em uma jornada 12/36. “A gente tem duas duplas noturnas que se revezam no 12/36 e duas duplas diurnas que também se revezam. Além dos cuidadores, a gente tem a equipe técnica: eu, que sou psicóloga, mas que estou na coordenação; uma psicóloga; uma assistente social e um motorista disponível para a residência”. No próximo ano, a casa deve receber também uma merendeira.

“Hoje, a gente recebe marmitas e, às vezes, a gente cozinha também, porque a ideia é que seja uma casa mesmo”.

Preservação da identidade

Leila também conta que diferente de outras modalidades, a casa trabalha de forma a preservar a identidade das crianças. Em outros tipos do serviço, alguns instrumentos e objetos acabam sendo compartilhados.

“Aqui cada um tem seus pertences, cada um tem seu local no guarda-roupa, cada um tem suas roupas, as coisas não são divididas. Tudo é identificado e individualizado. Os brinquedos, claro que tem coisas que são de uso comum, como qualquer casa. Mas a ideia é que se preserve a identidade. Se um gosta mais de uma coisa, a gente consegue garantir que ele acesse aquela determinada coisa. Então, a principal diferença é essa”.

Sobre as regras da casa, a coordenadora conta que ela não funciona como uma instituição, cheia de comandos e proibições: “toca o sino todo mundo vem comer, a hora de dormir, a hora de acordar, todo mundo vai comer a mesma hora”. Mas que o intuito é que as crianças se sintam como em uma casa.

Casa Lar
Árvore de Natal enfeitada pelas crianças da Casa Lar | Vitor Souza/O Município

Processo até a Casa Lar

Por tratar-se de uma modalidade de acolhimento institucional, ele ocorre somente por meio de medida protetiva. Assim sendo, a determinação só pode ser emitida pelo Conselho Tutelar junto ao poder Judiciário.

Em toda rede de atendimento municipal ou estadual da qual profissionais atuam em contato com crianças e adolescentes, se identificada uma suspeita de qualquer tipo de violência contra as crianças, os profissionais são obrigados a notificar o Conselho Tutelar, como explica Leila.

Antes de ser levada à Casa Lar, existe todo um processo por trás. Por exemplo, o Conselho é acionado e então começa averiguação do caso, enquanto isso, já no começo, a Casa Lar, é atualizada sobre a situação. Ao ser identificado um risco grave ou que de fato houve violação do direito da criança ou do adolescente, o Conselho Tutelar ou a rede de proteção que está acompanhando o caso então solicita a medida protetiva, que são encaminhadas para o Ministério Público.

Leila reforça que todo o processo é muito delicado, pois o afastamento da criança também prejudica ela própria e não somente os pais. “Uma medida protetiva só vai ocorrer quando for realmente uma situação extremamente gravosa, onde todas as outras situações já foram tentadas junto à família. Porque a prioridade é que a criança ou o adolescente fique na família”.

Ela explica também que há duas formas do acolhimento ser feito, uma através do processo a partir do Conselho Tutelar onde é feito um trabalho junto à família, e através de uma medida protetiva emergencial, que como o próprio nome diz, acontece quando é identificada “alguma situação muito pontual, uma criança que está em castigo severo, que está sofrendo violência física. Mas todas elas precisam necessariamente e obrigatoriamente do aval do poder Judiciário”.

Deferido o pedido de afastamento da criança ou do adolescente da família, se inicia o processo judicial. E é então durante este período que a crianças é acolhida. A cautela para emissão da medida também passa pela possibilidade de negativa da Justiça, que pode acontecer caso entenda-se que não há motivos suficientes para tal.

“Então, a ideia aqui da Casa Lar é que nesse período do processo, que se entende pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que seja o mais breve possível, porque pelo tempo da criança, um mês é muita coisa. Então, existem tempos já pré-determinados, e o tempo máximo que deve acontecer o trâmite é de dois anos. Mas esse é o máximo do máximo, porque dois anos, imagina uma criança que tem três anos, vai ser desacolhida com cinco anos”, conta.

“A ideia é que não se passe tanto tempo, mas há esse tempo na lei porque os processos são morosos, é dentro do trâmite judicial como todos os outros. Só que a Vara da Infância possui uma prioridade, para o tempo correr mais rápido. Então, assim, no tempo de acolhimento da criança, ela fica aqui, vai à escola e faz atividades na comunidade. Dependendo da situação, ela pode ter acesso à família ou não. É tudo muito relativo dentro do processo, dependendo da situação, do contexto do qual ela vem. Se é permitido, promovemos visitas, tanto aqui quanto na casa da família”.

Já no começo do processo também são buscados demais familiares que possam ter tido algum contato da criança para evitar ao máximo a institucionalização.

“Por mais que a gente tente garantir um espaço acolhedor, que tenha uma dinâmica mais afetuosa, ainda assim é uma instituição, ainda assim tem uma rotatividade de trabalhadores, tem uma lógica institucional. Por mais que a gente tente fugir dela, a estrutura é essa”, pontua.

E complementa ainda a importância da Família Acolhedora, outro serviço viabilizado pela Prefeitura de Brusque. “Inclusive a prioridade é ele, porque o acolhimento familiar vai, de fato, garantir isso, essa individualidade, só aquela criança que está ali. Diferente daqui, onde há dez – se referindo a capacidade”.

Caso a família ou responsáveis pela criança ou pelo adolescente não superem a situação que causou o afastamento, caso seja inviável o retorno da criança ou adolescente à família, mesmo com os acompanhamentos e atendimentos feitos, ela então é destituída do poder familiar e é encaminhada para adoção.

Processo difícil

Leila conta que todas as fases do processo são difíceis e muito desgastantes para todos, pois trata-se de um trabalho feito com vidas, com histórias e com crianças, que possuem diversas emoções e sentimentos.

“Eles sabem da situação que eles estão. Eles entendem que estão passando por essa medida por determinada situação, eles reconhecem. Eles compreendem, a gente conversa. Eles também precisam falar sobre isso. A gente não deve subestimar as crianças”.

“Infelizmente, devido a esses contextos, muitas dessas crianças já vêm com uma maturidade que não condiz com a idade. Muitos deles têm vivência que nós, adultos, não tivemos. Mas, de fato, a gente precisa lidar com o que é real, com o que é concreto. Eles sabem que eles estão vivendo, até porque eles precisam saber. Não tem como simplesmente você ir lá e tirar a criança da casa dela, e porque há um local com piscina de bolinha, uma cama, está tudo certo”.

E diz que as crianças costumam fazer perguntas e ressalta ainda que elas têm o direito de saber o que está acontecendo. “Claro que dentro da linguagem deles, do que é compreensível para eles, mas eles têm uma compreensão muito boa da situação”.

O tempo após a visita de familiares geralmente costuma ser mais delicado ainda. Conforme a coordenadora, é onde há uma grande emoção por parte dos pequenos. “Eles choram muito, porque daí veem a mãe, o pai indo embora. Às vezes é uma ou duas horas de colo, de carinho. Mas isso pra gente faz parte do trabalho também”.

Envolvimento com as crianças

Apesar de ser um trabalho e mesmo dentro de todas as responsabilidades dos profissionais que atuam no local, Leila ressalta que não há como não se envolver com as crianças. “A gente consegue – cumprir o papel profissional -, mas claro, antes de qualquer coisa, somos seres humanos. A gente se envolve com as crianças, a gente tem afetuosidade por elas”.

“Como a gente não é robô, a gente também se emociona, também nos envolvemos. E penso que não poderia ser diferente. O dia que a gente não se emocionar mais, o dia que olharmos para isso com frieza, então não servimos mais para estar aqui, porque não tem como”, ressalta.

“Eu sempre falo pro pessoal, se não for pra ser assim, não serve, porque a gente precisa se emocionar sim, precisa se sensibilizar, pois enquanto a gente tiver sentindo isso, tá tudo bem. Então tem o conteúdo da humanidade, que é o ingrediente da humanidade, que é extremamente necessário. E acho que o principal tempero da Casa Lar é isso, por mais que seja uma instituição, por mais que tenha todo o processo burocrático, moroso, Judiciário, a gente tenta misturar nesse caldeirão o tempero da humanidade”.


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