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Devota caminha por quilômetros na madrugada para doar primeira imagem do padroeiro da capela na Barra da Areia, em Botuverá

Igreja foi a quarta a ser construída em uma comunidade do município

Ao adentrar pelo caminho verde e íngreme do bairro Barra da Areia, é possível chegar na capela da comunidade. Registros paroquiais apontam que a primeira estrutura de madeira foi construída em 1936 e, de acordo com a moradora e atual capelã Nilza Maria Brogni, de 61 anos, a primeira imagem de São Sebastião do local foi doada por Ernesta Lira, em 1943.

Segundo Nilza, Ernesta saiu de Ribeirão do Ouro e foi até o bairro em um domingo de madrugada, junto de Alice Barni e Orlandina Barni Brogni. O trajeto tem cerca de 15 quilômetros.

“Na escuridão, elas usavam uma lamparina de querosene e fizeram a caminhada até o bairro”, diz. “Antes, faziam a festa de Bom Jesus, pois tinha a imagem. Aí trouxeram a imagem de São Sebastião e ele passou a ser padroeiro”, completa.

Quando acompanhou Ernesta e Alice, Orlandina tinha 13 anos de idade; em 2015, aos 89, ela contou a história para Nilza, que fez o registro em um caderno; segundo Nilza, essa imagem não existe mais no local | Foto: Luiz Antonello/O Município

A moradora Maria Martinenghi Dalabeneta, de 83 anos, recorda da pequena igreja na localidade. Ela detalha que chegou ao bairro em 1957, quando se casou. Antes disso, morava com os pais no Ourinhos.

“A igreja ficava em um morro, tinha um caminho para irmos a pé, uma escadinha, e era bem simples. Tinha um altar grande, o São Sebastião no meio e, ao lado, estava o Bom Jesus de Iguape”, recorda.

Conforme Maria, a comunidade fazia duas festas: a do padroeiro São Sebastião, no final de semana próximo ao 20 de janeiro; e a do Bom Jesus, em 6 de agosto. “Era sem dança, só tinha pão e churrasco. Não tinha bolo, cuca, cachorro quente, não tinha nada. Era só uma festinha. Era divertido, uma festa bem legal e com todos unidos”, cita.

Maria conta que Ângelo Brogni doou o terreno para a igreja; Celso Brassiani doou a cruz que hoje está debaixo do altar; já a toga do padre foi doado por Brandina Colzani | Foto: Luiz Antonello/O Município

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Sobre a igreja de madeira, uma memória que marcou Maria foi de um morador, que rezava na cantoria nos fundos. Ela se refere a Humberto Mazzoli, escrivão de paz na época.

“Naquele tempo, não tinha reza, tinha só terço. Ninguém via ele lá embaixo, ele se apoiava na tábua da cantoria e rezava, a gente não se virava pra trás. Alguns iam lá com ele para rezar o terço, até crianças. Depois começaram as vias sacras e ele ia no coro”, continua.

Antigamente, a comunidade tinha uma capelinha de madeira em um morro, próximo da igreja atual | Foto: Luiz Antonello/O Município

Antigamente, Maria ressalta que o padre ia a cada três meses na comunidade e ficava por três dias. Ela conta que havia um quartinho na igreja separado para o sacerdote. “Na missa, ele rezava de costas e em latim, não víamos a cara do padre. Nós rezamos um Pai Nosso e um Salve Rainha no fim da missa, não tinha a bênção”, detalha.

“Nós não sabíamos o que ele rezava. Depois, mais tarde, começaram a rezar em português. Aí ficamos mais contentes, porque rezamos juntos. Quando nós éramos pequenos, a minha mãe também não rezava em português, ela rezava tudo em italiano e nós também. A minha irmã passou trabalho para fazer a Primeira Comunhão”, acrescenta.

Uma nova igreja é feita

Luiz Antonello/O Município

Com o passar dos anos, Maria relata que a capela começou a “cair”, pois era muito velha. Então, surgiu na comunidade a vontade de fazer uma igreja nova, mas nem todos concordavam.

“Depois, não tinha lugar para fazer. Foram para dentro [do bairro], mas o dono da terra não deixou. Hoje, onde tem a igreja, era um morro e a escola era uma casa velha, onde chovia dentro, que ficava onde está o pé de jabuticaba na casa da Nilza. Na escola, também davam doutrina, a catequese. Era tudo ali”, detalha.

Apesar da confusão sobre o local da nova estrutura, a obra foi desenvolvida. Segundo Nilza, a nova capela foi construída em 1975. Para isso, um pedreiro de Nova Trento veio ajudar na construção, o forro foi feito por Adolfo Bruch e os bancos vieram da igreja de Dom Joaquim, de Brusque.

Luiz Antonello/O Município

O ladrilho do piso veio de uma cerâmica de Imbituba. Já o altar foi feito por Érico Brogni, sogro de Nilza. “Muito do que se tem é de doação da comunidade. As festas não davam tanto dinheiro na época”, salienta. O primeiro capelão foi Adão Pedrini.

Natural de Vidal Ramos, Nilza começou a frequentar o templo no ano da inauguração. “Vim com uma amiga aqui na festa de inauguração da igreja, em 24 de agosto de 1975”, pontua.

Na época, ela namorava Valdir Brogni, com quem se casou em 1979. Naqueles anos, a cunhada, Marlene Colzani Brogni, cuidava da igreja. “Depois, em 1986, comecei a dar catequese e ainda dou suporte”, completa.

Público diminuiu com os anos

Luiz Antonello/O Município

Ao longo do tempo, o espaço da igreja foi aumentando, mas o público foi diminuindo. “Na época, lotava, tinham muitas famílias. Havia cultos todo domingo, o pessoal frequentava muito a igreja. Eram lavradores, colonos, plantavam fumo, mas não deixavam de vir”, frisa Nilza.

“A gente se encontrava, todos os amigos e conhecidos. Todos que moravam um pouco para baixo das cavernas vinham para cá. De lá de cima da metade da Areia Alta para baixo também vinham para cá”, diz.

Luiz Antonello/O Município

Com o novo templo, Nilza conta que passou a ter missas uma vez por mês. O padre ia até o Barra da Areia durante a semana. No início, ele ia a cavalo, depois começou a vir com Fusca, de Botuverá.

“Depois, de uns anos para cá, na época do padre João Miguel [de 1984 a 1992], começamos a ter mais missas por mês, com duas. Começamos a ter também a procissão de Corpus Christi. O padre João movimentou bastante a comunidade”, enaltece.

Atualmente, Nilza relata que a população não é tão participativa nas missas. São 22 famílias na localidade, mas a igreja não lota como antigamente.

Além de outras reuniões, a capela tem missas a cada 15 dias, no primeiro sábado do mês, às 18h, e na terceira quinta-feira, que é a missa do dízimo, às 19h. “Antes era aos domingos, às 19h30, mas devido a pouca participação, as pessoas vem mais durante a semana”, conta.

Segunda casa

Luiz Antonello/O Município

Por conta da idade e de problemas de saúde, Maria relata que atualmente comunga em casa. Escuta a via sacra e a novena. Contudo, ela aproveita todas as oportunidades que tem de ir ao templo. “Não tenho palavras para dizer o que é essa igreja para mim, é tudo. Se não tivesse a igreja aqui eu não iria, aqui eu pouco vou, só quando me levam. O que eu puder rezar, eu rezo”, diz.

Nas memórias, ela recorda dos que se mudaram e daqueles que já faleceram, além dos encontros que foram marcados na igreja. Outra grande saudade é do marido Santo José Delabeneta, já falecido.

Para Nilza, a igreja é a segunda casa. “A minha filha fala para eu arrumar alguém para cuidar da capela, mas é difícil. Vivo o tempo todo pensando na igreja, cuido como se fosse a minha casa. Com amor, carinho e dedicação, pela comunidade também. Gosto muito do que faço”, afirma.

Nilza trabalha durante a tarde como professora, duas vezes por semana ela e a cunhada vão à noite limpar a capela. “Ter uma capela na comunidade é importante, para muitas pessoas é. Dedicam-se bastante em vir, participar, trazer os filhos, seguir a rotina de antigamente”, finaliza.

Luiz Antonello/O Município

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