Uma das perguntas mais frequentes nos consultórios médicos de especialistas em doenças do cérebro e saúde mental é a seguinte: Doutor, meu vô e meu pai tiveram mal de Alzheimer, será que eu vou ter também? Tem algum exame que possa fazer para descobrir?

Há um motivo para que essa preocupação tenha aumentado muito nas últimas décadas e está relacionado com o aumento da expectativa de vida da população. É bem conhecido o fato que a cada década de vida após os 60 anos de idade a incidência de demência aumenta progressivamente. Ao redor de 70% dos casos de demência são provocados pela Doença de Alzheimer.

Perto de 5% da população com 65 anos sofre de Doença de Alzheimer (DA) e a cada 5 anos este risco se duplica. Uma de cada duas pessoas com mais de 90 anos tem DA, essa incidência tão alta mostra que a longevidade extrema pode não ser tão vantajosa. Existem entre 50 e 60 milhões de pessoas com Doença de Alzheimer no mundo e ao redor de 2 milhões no Brasil.

A Organização Mundial da Saúde estima que em 2050 haverá 153 milhões de pessoas com DA no mundo, 6 milhões serão brasileiros. Nos últimos anos se desenvolveram alguns “biomarcadores” para a detecção da Doença de Alzheimer.

Existem duas alterações patológicas características nos cérebros das pessoas com DA, o acúmulo de placas de proteína beta-amiloide e os acúmulos neurofibrilares de proteína tau.

Essas alterações podem ser medidas através de um exame altamente especializado chamado de tomografia por emissão de pósitrons (Pet-Scan) e também pela dosagem dessas proteínas no líquido cefalorraquidiano.

Infelizmente o primeiro método é de altíssimo custo e não é utilizado na prática clínica cotidiana enquanto o segundo depende de um exame invasivo como é a extração do líquido cefalorraquidiano.

De tal forma que a medida dessas substâncias ou biomarcadores passou a se realizar no sangue através de um teste chamado de PrecivityAD2.

Este teste determina a possibilidade de ser portador de placas amiloides no cérebro o que certamente ajuda no diagnóstico de pacientes que já tem sintomas de declínio cognitivo.

O teste não está indicado para pessoas que não tem nenhum sintoma ou tem idade inferior a 55 anos, isso porque ainda não foi estudado nesse grupo de pessoas.

Recentemente um estudo liderado pelo Dr. Jianping Jin da Capital Medical University de Beijing-China fez um acompanhamento durante 20 anos desses biomarcadores para a doença de Alzheimer.

O estudo publicado em fevereiro deste ano no New England Journal of Medicine acompanhou um grupo de 648 pacientes que desenvolveram Doença de Alzheimer e outro grupo com o mesmo número de pessoas que não desenvolveram a doença.

O acompanhamento foi feito por dosagens das proteínas beta-amiloide42 (BA42) e beta-amiloide40 (BA40), proteína tau181 e neuro filamentos de cadeia leve no líquido cefalorraquidiano, além das avaliações clínicas e exames de imagem cerebral.

Estes exames eram realizados a cada 2 ou 3 anos nos dois grupos.

Eles descobriram que os níveis de proteína BA42 começaram a aumentar no grupo que desenvolveu Alzheimer 18 anos antes que o grupo que se manteve sem a doença.

O índice BA42/BA40 começou a divergir entre os dois grupos 14 anos antes do desenvolvimento dos sintomas de Alzheimer.

O nível de proteína tau181 começa a aumentar 11 anos antes do aparecimento dos sintomas cognitivos e o aumento da proteína dos filamentos de cadeia leve 9 anos antes.

Já os testes cognitivos começaram a ter diferenças entre os dois grupos 6 anos antes da confirmação diagnóstica.

Isso significa que no futuro a padronização desses biomarcadores podem ser de utilidade para o diagnóstico antecipado ou precoce da Doença de Alzheimer, principalmente se há a confirmação que essas alterações no líquido cefalorraquidiano se repetem também no sangue.

Sabemos também que existe uma predisposição genética no desenvolvimento da DA sendo que o gene da Apolipoproteína 4 (Apoe4) é o principal gene associado a esta doença, porém muitos portadores deste gene não desenvolvem a doença.

No estudo do Dr. Jianping, apenas 37% do grupo com a DA tinham este gene enquanto no grupo de pacientes normais estava presente em 20% dos casos.

Além disso existem no mundo todo ao redor de 500 famílias portadoras de Alzheimer genético, nelas a DA se manifesta com muita frequência em todas as gerações.

O departamento de Antióquia na Colômbia tem uma das mutações para Doença de Alzheimer genética mais conhecidas com 25 famílias envolvidas.

A mutação acontece no cromossoma 14 e tem sido extensamente estudada e descrita pelo famoso neurocientista Dr. Francisco Lopera, se trata da famosa “mutação paisa”.

Supondo que consigamos predizer quem vai desenvolver Alzheimer, o que a medicina tem para oferecer no momento para tentar evitar o aparecimento da doença? Em termos medicamentosos absolutamente nada.

Esse conhecimento antecipado poderia trazer mais problemas que soluções, porém não devemos esquecer que há pelo menos uma dezena de fatores modificáveis que aceleram o aparecimento dos sintomas da DA e justamente é nessa direção que devemos focar nossos esforços, tenhamos ou não risco genético para desenvolver a doença.

Esses fatores são a inatividade física (sedentarismo), a hipertensão arterial, a obesidade, a diabetes mellitus, o tabagismo, a depressão, o baixo nível educacional, a falta de atividades cognitivas principalmente a leitura, as perdas auditivas e o isolamento social.

Tudo o que possa ser feito para combater estes dez fatores certamente vai ajudar a reduzir o risco de padecermos desse trágico mal chamado de Doença de Alzheimer.

Lembrando que as pessoas que se dedicam com disciplina à prática de atividade física além de acabar com o sedentarismo geralmente modificam totalmente seu estilo de vida: melhoram sua alimentação, param de fumar, dormem mais, ingerem menos bebida alcoólica.

A atividade física ajuda a controlar sua pressão arterial e seus níveis glicêmicos, melhora sua disposição mental e seu humor e geralmente tem uma vida social renovada junto aos colegas de esporte.

Acabar com o sedentarismo é imprescindível se queremos preservar nossas funções cognitivas e ter uma boa saúde mental.