Em um ano, Hospital Azambuja realiza sete cirurgias de captação de órgãos
Ideia é que com o passar do tempo, os transplantes possam ser feitos em Brusque
Ideia é que com o passar do tempo, os transplantes possam ser feitos em Brusque
Em outubro do ano passado, o Hospital Azambuja realizou a sua primeira cirurgia de explante, ou seja, retirada de órgãos para doação. De lá para cá, foram sete captações em Brusque: três no ano passado e quatro neste ano.
Para poder realizar este tipo de cirurgia, o hospital precisou passar pelo credenciamento da SC Transplantes – Central de Captação, Notificação e Distribuição de Órgãos e Tecidos de Santa Catarina.
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Após o credenciamento, foi montada a Comissão Hospitalar de Transplantes (CHT), formada por três enfermeiros e um médico, que é responsável por gerenciar as captações no hospital.
A enfermeira coordenadora do pronto-socorro do Hospital Azambuja e membro da comissão de transplante, Ana Paula Quirino Lucena, explica que um integrante da comissão sempre está de sobreaviso, caso haja algum paciente que preencha os critérios de morte encefálica.
A comissão é responsável por fazer a investigação dessa morte, com exames físicos que seguem um protocolo estadual. “São quatro exames realizados por três médicos diferentes. O último exame é o de imagem onde é detectado se tem atividade elétrica ou circulação no cérebro. Este é o exame decisivo para o diagnóstico de morte encefálica ou não”.
Todo esse protocolo pode levar de dois a sete dias, dependendo do paciente. Quando se chega na fase dos exames confirmatórios, os membros da comissão já começam a conversar com a família com o objetivo de conhecer melhor o paciente, mas só quando tem a confirmação da morte encefálica é que os profissionais entram no assunto da doação de órgãos.
“As pessoas ainda tem essa dificuldade de entender que morte encefálica é morte, até então grande parte da população acha que morte é só quando para o coração. Os outros órgãos continuam funcionando, inclusive o coração, porque o paciente está ligado às máquinas. Por isso, é bem difícil de as famílias entenderem”.
Neste ano, foram nove protocolos abertos. Desses, quatro foram convertidos em doação. Os outros cinco ou não tiveram o aceite dos familiares ou apresentaram alguma complicação que impede a doação, como uma parada cardiorrespiratória no meio do processo, por exemplo.
Para Ana Paula, o número de captações realizadas pelo hospital neste primeiro ano de trabalho é surpreendente. “Já percebemos que esse ano foi bem mais fácil esse contato com a família do que no ano passado. Aos poucos, as pessoas estão compreendendo a importância de autorizar a doação. É um ato de desprendimento, proporcionar que mais pessoas tenham a chance de viver”.
Atualmente, para ser doador de órgãos, basta que a pessoa manifeste esse desejo para seus familiares em vida. “Muitas famílias não conversam sobre isso e alguns casos em que não tivemos o aceite é porque a família não sabia se a pessoa queria doar ou não. Por isso, é fundamental deixar explícito”.
A única forma de viabilizar a doação é quando ocorre a morte cerebral, que pode ser em decorrência de acidente de trânsito, arma de fogo, algum problema neurológico como derrame, tumores, ou alguma doença que prejudique o cérebro.
Para doar, a pessoa pode ter qualquer idade. Não importa o sexo, o tamanho e a cor da pele. O que define para onde vai o órgão é o tipo sanguíneo e o perímetro corporal do doador e do receptor.
“É importante lembrar que doenças como HIV e Hepatite não são empecilhos para doação. Tem pessoas com HIV, Hepatite que também precisam de um órgão e aí tem a chance de receber de pessoas que têm a mesma doença”.
Nos grandes centros, é realizada a captação, inclusive, de pele e ossos. Como o Hospital Azambuja recém iniciou o trabalho e também devido a dificuldade de transporte aéreo em Brusque, o hospital realiza somente a captação de córneas, fígado, rim e pâncreas. Como o coração e o pulmão tem durabilidade máxima de apenas quatro horas, a captação desses órgãos ainda não é feita em Brusque.
“Não conseguimos transporte aéreo nesse tempo máximo, por isso, captamos somente órgãos que têm durabilidade maior”.
A enfermeira explica que a cirurgia de explante dura de três a quatro horas, dependendo do número de órgãos que serão retirados. “Quando acham alguém compatível, a equipe da SC Transplantes vê o que o paciente precisa e diante disso, os órgãos são retirados, somente sob necessidade da lista, que é nacional e única. Todos que precisam de um transplante de órgãos fazem parte da mesma lista, não importa se é particular ou SUS”, destaca a enfermeira.
Realização de transplantes nos planos
Responsável pela UTI e diretor técnico do Hospital Azambuja, o médico Eugênio Paiva Maciel faz parte da Comissão Hospitalar de Transplante da instituição. Ele atua também no Hospital Santa Isabel, de Blumenau, que é referência em transplante de órgãos em Santa Catarina.
Ele trouxe o projeto de captação de órgãos para o hospital de Brusque e a ideia é que, no futuro, a instituição evolua e consiga realizar transplantes na cidade.
“Os médicos querem isso. Estamos crescendo muito, agora vamos colocar hemodinâmica, novas UTIs e a ideia é que depois se comece a fazer o transplante propriamente dito. É um processo natural”.
Após 20 dias internado na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Azambuja lutando para se recuperar de um acidente de trânsito, Godofredo Mosimann Júnior, 33 anos, não resistiu aos graves ferimentos e teve morte encefálica.
Ele foi o primeiro a passar por uma cirurgia de captação de órgãos em Brusque, em outubro de 2017. A esposa de Godofredo, Soraya Cordeiro, conta que o marido já havia demonstrado a vontade de ser doador de órgãos, mas ao se deparar com a situação, tomar a decisão de autorizar a cirurgia não foi uma tarefa fácil.
“Para qualquer pessoa é uma decisão super difícil, assim como foi para nós. Ele ficou 20 dias na UTI e nesses dias, a esperança e a fé não morreram em nenhum momento. Ao receber a notícia da morte cerebral, seus pais e irmãos aceitaram sem resistência, mas eu como esposa, confesso que fiquei pensativa”, diz.
“Não consigo descrever o que senti naquele momento tão doloroso, principalmente sobre as córneas, mas ao pensar que esse gesto poderia proporcionar um novo jeito de ver o mundo a alguém, também acabei autorizando”, completa.
Godofredo foi doador de córneas, rins e fígado. A decisão de autorizar a doação foi realizada em conjunto entre os pais, Ivete e Godofredo Mosimann, os irmãos, Maiara, Eugênio e Fábio e a esposa Soraya.
“Sua morte veio seguida de muita dor. Sabemos que ele não está mais entre nós, mas ainda permanece vivo em nossos corações e lembranças. Ao doar seus órgãos proporcionamos uma vida nova para alguém. Ele foi um grande marido, amigo, companheiro tanto para mim quanto para meus filhos. Me sinto confortada em saber que mesmo após a morte ele fez o bem a outras vidas”.
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Em janeiro deste ano, a família de Altamir Tholl, 59 anos, passou pela mesma situação. O morador do bairro Guarani sofreu um acidente de trabalho e após ficar por cinco dias na UTI, faleceu. Como também já havia demonstrado vontade de ser doador, a família decidiu respeitar.
Os quatro filhos e a esposa de Altamir se reuniram para conversar sobre o assunto. “No fim todo mundo concordou, pois sabíamos que era o que ele queria”, diz o filho mais novo, Altamir Francisco Tholl Júnior.
O pai doou as córneas, rins e o fígado. “Ele era uma pessoa muito boa, muito conhecida, só fez o bem durante a vida e fechou como foi a vida dele, fazendo o bem. Tem muita gente que não quer doar, mas temos que pensar que poderia ser alguém da nossa família precisando”.
Júnior afirma que o atendimento do hospital durante todo o processo de doação foi feito com muito carinho e atenção, o que tornou tudo mais fácil. Os filhos querem seguir o exemplo do pai e também já manifestaram desejo de serem doadores.