Futebol amador sofre com violência
O ano do futebol amador da região foi marcado por quebra-quebra, jogador hospitalizado e árbitros intimidados
O ano do futebol amador da região foi marcado por quebra-quebra, jogador hospitalizado e árbitros intimidados
O objetivo da criação de competições esportivas amadoras em um município, em sua maioria, é a integração dos membros da comunidade. Mas em Brusque e região, a paz entre as equipes vem sendo deixada de lado e trocada por cenas de violência. Jogadores inconformados com decisões da arbitragem partem para cima do juiz e por vezes o agridem. Pequenos desentendimentos entre os atletas são vistos como motivos para brigas generalizadas. E o esporte, enquanto isso, é deixado de lado.
Este ano, dois episódios chamaram a atenção pelos excessos cometidos em campo. No Campeonato Municipal de Futebol Amador de Brusque, o jogo de volta das quartas de final entre Santos Dumont e Mazza foi marcado por uma confusão que durou dez minutos. O desentendimento só acabou com a presença da polícia. Em Guabiruba, também em partida eliminatória do campeonato local, o zagueiro José da Silva, do Bahia, chutou propositalmente as costas do atacante Godo, do Olaria. O atleta precisou ser hospitalizado por dois dias devido à agressão.
‘Momento violento’
Espectador do esporte amador da região há décadas, Eduardo Gohr, Coordenador de Esportes de Participação da Fundação Municipal de Esportes de Brusque, afirma que o futebol daqui vive um de seus momentos mais violentos nos últimos anos. “A situação está um pouco fora de controle. Esses casos vêm aumentando, sim. Tem dirigente e atleta que sai de casa disposto a fazer qualquer coisa para que sua equipe vença. Inclusive usar da violência”.
Os motivos para as brigas em campo são incertos. Os dois campeonatos, de Brusque e Guabiruba, não reservam prêmio em dinheiro para os campeões, somente troféus e medalhas. Das 14 equipes que participaram do amador de Brusque, somente o Carlos Renaux pagava aos jogadores. A quantia não era mensal, e sim por fase avançada. Em Guabiruba, nenhum atleta recebia dinheiro para jogar.
Gohr foi um dos principais organizadores do campeonato brusquense. Participou ativamente das reuniões e congressos técnicos da competição. Para ele, os atos violentos desestimulam quem trabalha pela continuidade dos campeonatos. “Não acho correto a FME viabilizar os custos de arbitragem para que jogadores entrem em campo dispostos a brigar. Às vezes, temos que chamar a Polícia Militar para separar marmanjos brigando dentro de campo. Isso é um absurdo. No esporte competitivo, um ganha e outro perde. No caso do futebol, é de conhecimento de todos que a arbitragem está sujeita a erros”.
Apesar de lamentar os recorrentes casos de brigas, o coordenador tem esperança de que a situação mude. Ele afirma que não desistirá de encontrar uma solução para que a paz reine nos campeonatos de futebol da região. “Acaba sendo um desafio para nós, da organização, que podemos modificar este quadro. Queremos iniciar um processo de conscientização de todos os envolvidos, em que o maior vencedor será o futebol amador”.
Dirigente culpa FME
Presente na partida contra o Mazza, o diretor de futebol do Santos Dumont, Andrione Reis, faz duras críticas à FME. Ele conta que após a falta sofrida por Jhonatan Damasceno, atleta do clube rival, (veja mais sobre o assunto no destaque), precisou correr para o vestiário para não apanhar dos atletas adversários. Com medo de represálias, Reis diz que o clube não registrou boletim de ocorrência na Polícia Militar. Segundo o dirigente, a briga foi inédita dentro do tradicional clube brusquense. “Havia famílias presentes, crianças chorando… Foi uma situação complicada, nunca vista antes no Santos Dumont”. Além da briga, a sede do clube foi depredada, de acordo com ele.
O dirigente acredita que casos como este estão se tornando rotineiros ‘porque não há punição’ da FME. “O Mazza é uma equipe com histórico de confusões. Não são todos os jogadores, mas alguns sempre se envolvem em brigas. Mesmo assim, continuam nos campeonatos”, reclama. Ele ainda comenta que a fundação dá pouca importância ao assunto. Gohr defende que a entidade só pode tomar alguma atitude mediante o documento oficial do árbitro, a súmula. “Somente podemos aplicar alguma punição a jogadores ou equipes fundamentados no relatório da partida. Existem situações em que o árbitro não relata todos os fatos. Isso faz com que fiquemos de mãos atadas.”
“Árbitros pensam que são deuses”
Um dos personagens principais do ‘quebra-quebra’ no Santos Dumont foi Jhonatan Damasceno, atleta e dirigente do Mazza. Ele sofreu falta de Tiago Candido próximo ao fim da partida. A cotovelada desferida pelo defensor foi o estopim para a confusão. O que se viu na sequência foi uma briga generalizada. Enquanto Damasceno ficou estirado no chão, outros atletas tomavam as dores do companheiro. Apesar do episódio que chocou a torcida presente, o jogador minimiza o incidente. “Não me arrependo do que aconteceu. Foi o time deles que começou”. A exemplo do dirigente adversário, o atleta do Mazza responsabiliza a FME. Ele acredita que a falta de punição fez com que a fundação beneficiasse os rivais. “Eles não tomaram nenhuma atitude. Nenhum atleta foi advertido depois do que aconteceu. Não quiseram punir jogadores nossos porque senão teriam que punir do Santos Dumont também. Como a equipe avançaria para as semifinais, não fizeram nada”, critica. O jogador também apontou a metralhadora para a arbitragem local. Segundo ele, a violência no esporte brusquense só irá acabar quando forem selecionados juízes de fora da região. “Os árbitros daqui pensam que são deuses do futebol. Tomam as atitudes que querem e deixam que os problemas aumentem”.
Mesmo com as criticas, ele adianta que o Mazza estará presente no Campeonato Municipal de Futebol Amador de Brusque do ano que vem.
Apito com receio
Com quase 20 anos de experiência em arbitragem, Dgiuvano Gartner concorda que a indisciplina no amador de Brusque vem piorando com o tempo. O juiz federado apita atualmente o Campeonato Amador de Balneário Camboriú. Lá, ele diz que existe segurança, o que não acontece nas competições brusquenses. “Chegamos a ter quatro policiais durante toda a partida. Eles asseguram a integridade da comissão de arbitragem. Aqui, quase nunca há policiamento”, reclama.
Gartner revelou que os competidores locais levam as rixas do campo para o lado pessoal. Morador de Brusque, o árbitro, que também é instrutor de autoescola, admite que pensa duas vezes antes de mostrar um cartão a um jogador. Segundo ele, tanto torcida quanto atletas da região ameaçam os árbitros. “Já ouvi um caso em que um torcedor passou um facão pela grade, próximo ao juiz, para intimidar. Eu temo pela nossa arbitragem. Não temos segurança nenhuma”.
Gartner foi juiz da fatídica partida entre Mazza e Santos Dumont. Diferente da versão de Damasceno, ele afirma que não houve briga generalizada, e sim, um excesso por parte exclusiva dos atletas do Mazza. Questionado sobre o motivo de não ter colocado nada na súmula, o árbitro diz que foi por princípios. “Queriam que eu colocasse que foi confusão generalizada. Isso significa que todos os 22 jogadores brigaram. Não foi o que aconteceu”. Ele comenta que pediu instrução para os membros da LDB e para a FME sobre o que poderia incluir ao documento, mas não obteve respostas.
Em busca de soluções
Ciente de que a situação da violência no futebol de Brusque se agrava, A FME planeja alterações no regulamento. Para Gohr, a lista de regras precisa ser mais rígida. “Só assim teremos como punir e tirar de circulação os jogadores que são causadores de confusão”.
O Coordenador de Esportes de Participação também deseja dialogar com os membros da Liga de Desportos de Brusque (LDB), órgão responsável pelas comissões de arbitragem. “Para o próximo campeonato, temos como prioridade uma reunião com a LDB e com todo o quadro de arbitragem para que possamos melhorar esta situação. Vamos procurar orientar sobre a questão do preenchimento da súmula. O relatório da arbitragem deverá afirmar exatamente o que aconteceu na partida”.
Gohr vai além ao anunciar uma nova pretensão da FME. “Queremos adotar como procedimento padrão entre os árbitros: a paralisação da partida quando existir alguma intimação por parte de jogadores com a arbitragem. Neste caso, o juiz paralisa o jogo. Caso a situação persista, dará a partida como terminada”.