Entre as palavras que andam na moda nos últimos meses, duas são especificamente ligadas à questão feminina: empoderamento e sororidade. Confesso que acho as duas palavras estranhas. Se é que existe palavra feia (a estética aplicada às letrinhas, ninguém merece…), a gente pode dizer que as duas não seriam candidatas a Miss das Letras.
Mais do que isso, são palavras que trazem conceitos necessários, mas duros. De repete é essa dureza que causa estranhamento. Ou talvez seja uma implicância pessoal com o que elas parecem representar. Empoderar, para mim, parece ser algo como “dar poder”… e poder, é claro, não se dá. Se agarra, conquista, convence. Não se ganha.
Sororidade, o companheirismo (e empatia) entre mulheres, palavra com carinha de importada sem adaptações, entrou “na moda” há menos tempo. É algo que precisamos pensar diariamente. Cada vez que uma mulher julga outra, deveria chover sororidade na cabeça da juíza, para ver se consegue mudar uma postura que dura milênios.
Quanto menos empoderadas, mais julgamos, já percebeu? A figura clássica da vizinha no muro ou na janela, fiscalizando as mocinhas da rua (e sempre pronta a fofocar sobre elas), é uma boa representação disso. Dona de casa no nome, mas dona de nada na prática, ela se apropria da moralidade da vizinhança, até para justificar a sua existência. É uma figura em extinção. Na vida de hoje, a obrigação de produzir, de entrar na correria multitarefa… meio que assassina o tempo ocioso que podia ser usado nessa vigilância. Isso e as mudanças sociais que, mesmo que não sejam tantas quanto a gente gostaria, tornam menos aceitável a farta distribuição de condenações morais. Já é um avanço.
Esses dias, a Beltrana Jaicieli Lana compartilhou no Facebook esta imagem que estou trazendo para cá. Preste atenção nela. A gente só vai poder falar em sororidade, de verdade, quando deixar de ser fiscal do corpo alheio. Quando a palavra piriguete sair do vocabulário feminino (meninos também precisam parar com isso, mas aí é outra história…). Se nós queremos ser donas do nosso corpo, isso inclui roupa curta – mesmo no frio… e sem repetir aquela velha gracinha de que piriguete não sente frio, combinado? – e decote, inclui maquiagem “demais” e qualquer coisa que a dona do corpo em questão goste de usar. Você pode não achar bonito, mas não pode usar isso como motivo para estabelecer um julgamento que, pensando bem, é irmão gêmeo siamês daquele “ela estava pedindo”… típico da cultura do estupro. Passou da hora de não se incomodar com as garotas que só querem se divertir.
Por outro lado… sororidade não pode significar sermos coniventes com qualquer tipo de atitude. Existe mulher capaz de truque, de manipular os próximos e distantes, de agir de má fé. Existe golpe da barriga, existe casamento por interesse. Tem todo tipo de gente entre as mulheres, inclusive as que usam as ferramentas específicas das mulheres como armas. Assim como em todas as etnias ou gêneros. Não é porque é mulher (ou negro, ou gay) que a pessoa é correta, boazinha ou excelente ser humano. E, quando estiver errada, merece críticas justas e retirada de apoio.
Sororidade irrestrita acaba sendo tão preconceituosa quanto a falta de sororidade. Quando, um dia, quem sabe, chegarmos ao ponto de ver no outro o ser humano que ele é, independente de categorias, o companheirismo e a empatia, inclusive entre mulheres, sejam mais fluidos e naturais. Até lá, melhor manter os olhos abertos. Começando por observar nossas próprias atitudes!
Para honrar o título desta conversa… que tal uma versão de Girls Just Wanna Have Fun… com Miley Cyrus, aquela que é sempre criticada por suas atitudes despudoradas? Encaixa!
Claudia Bia – jornalista