João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Que democracia é esta que não pode conceder anistia?

João José Leal

Promotor de Justiça, professor aposentado e membro da Academia Catarinense de Letras - [email protected]

Que democracia é esta que não pode conceder anistia?

João José Leal

Ninguém pode negar que no dia 8 de Janeiro de 2023 foram praticados graves crimes de dano contra o patrimônio público e que seus autores devem ser processados e severamente punidos. No entanto, somente por meio de uma equivocada hermenêutica, para dizer o mínimo, pode-se afirmar que aqueles depredadores cometeram tentativa idônea, muito menos, crime consumado de abolição ou golpe de Estado.

Nenhum “golpista” portava qualquer tipo de arma; nenhum representante das instituições da República foi objeto de violência ou grave ameaça; nenhum grito ou manifesto de destituição dos representantes dos três poderes foi proclamado. Na verdade, os poderes constituídos não sofreram qualquer tipo de restrição ao exercício das suas funções constitucionais e essa é uma condição indispensável para a consumação desse grave crime.

Diante dessa equivocada narrativa do STF, a justa e legítima bandeira da anistia está sendo desfraldada e ganhando força. É evidente que, enquanto o principal interessado, Jair Bolsonaro, estiver à frente deste legítimo movimento, uma futura lei de anistia dificilmente será aprovada. Também é evidente que não se pode esperar apoio da OAB, que continua batendo palmas para as mais de 1.200 prisões, como se a instituição não existisse para defender todo e qualquer culpado ou inocente.

No entanto, com o povo manifestando-se por todos os meios de comunicação contra esse gravíssimo e supremo equívoco, poderemos ter a esperança de que o Congresso Nacional, apesar de tudo, ouça a voz das ruas, das praças e das redes sociais e aprove a merecida e justa lei de anistia.

Por tudo isso, fiquei estarrecido com a declaração de alguns ministros do STF. Deixaram de lado o pudor judicial que a negra toga lhes impõe para mandar um recado aos parlamentares. Segundo reportagem da Folha de S. Paulo, esses ministros anteciparam o voto em eventual julgamento sobre a matéria e “afirmaram que uma anistia, mesmo que aprovada pelo Congresso, não teria efeito prático porque certamente seria anulada pelo Supremo”.

Dizem ainda, que o questionável “precedente firmado na anulação do indulto concedido ao ex-deputado Daniel Silveira” seria um indicativo de que “a corte teria maioria folgada para invalidar uma anistia”. Trata-se de afirmação falaciosa, pois a Constituição Federal só proíbe a concessão de indulto ou anistia para crimes hediondos e de terrorismo. Mesmo assim, essa norma tem sido questionada pelo STF.

Dizem os supremos juízes, sem qualquer base legal, que a Constituição não admite “anistia para crimes contra a democracia”. Infelizmente, esses ministros ignoram ou deliberadamente procuram confundir a opinião pública. Na verdade, a história da anistia deste país sempre esteve relacionada aos crimes políticos. É da sua natureza levar o perdão legal aos processados e condenados, a fim de se restabelecer a paz política no âmbito da nação. Foi o caso de todas as leis de anistia deste país, da primeira promulgada em 1892, à última aprovada em 1979. Se Rui Barbosa, o grande patrono das três primeiras leis de anistia, pudesse viajar nas asas do tempo, com certeza, indignado, estaria bradando:

Que democracia é esta em que o STF não se vexa em mandar recado dizendo ao Parlamento o que pode ou não ser votado? Que democracia é esta em que os parlamentares que representam a vontade popular são previamente advertidos (e se calam!) de que não podem aprovar uma lei de anistia que venha a pacificar a nação brasileira?

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