Jornal O Município completa 70 anos de desafios superados e compromisso com a informação
Primeira edição do jornal foi publicada em 26 de junho de 1954
Primeira edição do jornal foi publicada em 26 de junho de 1954
*Colaborou Bárbara Sales
Em 26 de junho de 1954, foi publicada a primeira edição do jornal O Município. Nesta quarta-feira, 26, exatos 70 anos depois, o jornal publica sua edição de número 8.052, indo, provavelmente, muito além do que imaginou o advogado Raul Schaefer, quando iniciou sua empreitada para criar um veículo de comunicação na cidade de Brusque.
Fundado também por Wilson Santos, que tinha a função de gerente, o semanário logo se tornou a principal fonte de notícias de Brusque e, há sete décadas, é testemunha da evolução e do desenvolvimento da cidade e da região.
Logo na primeira edição, Schaefer apresentou os motivos que o levaram a fundar o jornal e explicou porque o batizou de O Município. “Tínhamos de batizar o jornal que estava no nascedouro e, além de tudo, imprimir-lhe uma diretriz acertada, justa e correta. Assim veio à lume ‘O Município’, porque está fadado, mercê de Deus, a constituir-se um batalhador incansável em prol do engrandecimento de Brusque. Nós o queremos assim, lutando pelas boas causas. Foi com este intuito que o fundamos”, escreveu no texto intitulado Apresentação, na primeira capa do jornal.
Em outro trecho, Raul Schaefer conclui: “Este é o nome que escolhemos: ‘O Município’ por ser o município a célula viva do organismo nacional, a oficina onde se forjam as forças que agigantam um país”.
Filho do industrial Otto Schaefer, Raul se formou em Direito no Paraná e, logo em seguida, abriu seu escritório de advocacia em Brusque. Em 1946 fundou a Rádio Araguaia, disputou e venceu o pleito a deputado estadual, casou e viveu em Florianópolis até 1951.
Antes de fundar O Município, colaborou com os jornais Correio Brusquense e O Rebate, mas desejava ter seu próprio jornal para impor suas próprias ideias e personalidade.
“Ele teve a sorte de ter ao lado um amigo fiel, presente nas horas boas e ruins, um companheiro trabalhador que foi Wilson Santos. Assim surgiu O Município, que não foi o primeiro jornal de Brusque, mas, que recebeu bases tão sólidas e existe até hoje”, disse a filha de Raul Schaefer, Ana Maria Schaefer Ferreira de Mello, em entrevista concedida ao jornal O Município em 2019.
Wilson Erasmo Quintino dos Santos colaborou com o jornal O Município por 51 anos. Desde a primeira publicação, em 1954, até 2005, ele assinou seu nome no jornal, seja como gerente fundador, jornalista responsável, repórter ou colunista.
Nascido em 1927, em Rio do Sul, Santos era filho de professor e desde cedo mostrava interesse pelas palavras e pela comunicação. Ainda jovem, começou a atuar na Rádio Clube, em Blumenau, até que veio para Brusque em 1947, a convite de Raul Schaefer.
No período em que atuou como repórter ou que esteve à frente do jornal, Wilson Santos cobriu os principais acontecimentos da cidade, desde grandes enchentes até a visita de ex-presidentes da república, como a de Juscelino Kubitschek em 1955, ou de grandes artistas que vinham para Brusque.
Raul Schaefer permaneceu na direção do jornal até 1958. Em 29 de novembro daquele ano, Jaime Mendes iniciou oficialmente uma história de quase 30 anos à frente do semanário. Antes de atuar em O Município, Mendes trabalhou como coletor estadual em Mafra, Capinzal e Rio Negrinho e também foi fiscal da Fazenda em Caçador e Rio do Sul. Ele descobriu sua verdadeira vocação ao fundar e manter o Jornal da Semana, entre os anos de 1944 a 1952, em Rio do Sul.
Em entrevista publicada na edição de 26 de junho de 1973, Jaime Mendes contou que na época que O Município foi fundado, colaborava com o jornal O Rebate, único órgão de imprensa de Brusque até então. Foi somente em 1956 que passou a integrar a equipe de O Município e, dois anos depois, assumiu sua direção.
“Comprei logo depois uma nova máquina impressora – a primitiva era muito velha e pequena – que pertencia ao jornal Evolução, de propriedade do senador Saulo Ramos. Mais tarde, adquiri uma linotipo e uma impressora maior, que imprime quatro páginas de cada vez, que me permitiram ampliar o jornal e executar serviços de encomenda de revistas e livros”.
Mendes foi um verdadeiro apaixonado pelo jornal. Dedicou boa parte de sua vida a manter o jornal ativo, muitas vezes, inclusive, tirando dinheiro do próprio bolso para que o semanário pudesse ser entregue aos assinantes todas as sextas-feiras.
“É bom a gente fazer aquilo que gosta. Nunca fiz outra coisa que me satisfizesse tanto, estou na profissão certa”, disse em entrevista publicada na edição de 26 de junho de 1973.
Enquanto esteve na direção de O Município, lançou a campanha em prol da construção da rodovia Antônio Heil, com o objetivo de melhorar a infraestrutura do município. Da série de artigos publicados ao longo de quase 15 anos de campanha, surgiu o livro Uma Estrada para Brusque, de sua autoria.
Jaime Mendes só parou de trabalhar nos dias que antecederam sua morte. Após seu falecimento, em 9 de outubro de 1986, O Município passou quase um ano sem direção efetiva. Wilson Santos assumiu a direção editorial e a família Mendes colocou o jornal à venda.
Do início até a década de 1980, o crescimento do jornal O Município foi impulsionado pelas indústrias têxteis de Brusque. As grandes empresas centenárias incentivavam seus operários a se tornarem assinantes do semanário, de onde vinha boa parte dos recursos para manter o jornal ativo.
“O que mantinha o jornal eram as assinaturas. Não existia um departamento comercial para ir atrás de anunciantes. Quem queria anunciar é quem procurava”, conta Glória Zen, funcionária do jornal há 49 anos, atualmente executiva de vendas.
Durante muitos anos, a Fábrica de Tecidos Carlos Renaux pagou 50% do valor da assinatura para seus operários. “A Renaux descontava 50% do valor da folha de pagamento do funcionário e os outros 50% ela pagava para que os operários pudessem ter o jornal. A Buettner e a Schlösser também tinham grande número de assinantes entre seus funcionários”.
Na época, Glória atuava na distribuição do jornal e lembra que toda sexta-feira de manhã deixava em torno de 400 a 500 jornais na portaria de cada fábrica.
“Os porteiros se encarregavam de distribuir, mas já iam os fardos separados por setor, com o nome do assinante e do departamento que ele trabalhava, para facilitar na hora de entregar. Esses nomes eram impressos nas máquinas e eu recortava semanalmente nome por nome. Sexta-feira de madrugada colava a etiqueta e só depois ia para a distribuição”.
Mais tarde, quando as empresas Buettner, Schlösser e Siemsen assumiram a sociedade do jornal, Glória lembra que o jornal começou a se modernizar. “A Buettner tinha um departamento de tecnologia e sempre às quintas-feiras eu ia até lá e conseguia imprimir as etiquetas dos assinantes. Cancelava no cadastro quem tinha que cancelar e acrescentava as novas assinaturas. Facilitou muito o trabalho”.
Após a morte de Jaime Mendes, as indústrias Buettner, Schlösser e Metalúrgica Siemsen (atual Skymsen) e seus respectivos diretores assumiram o jornal O Município e delegaram a Cyro Gevaerd a missão de administrar o semanário, em junho de 1987.
A sociedade, entretanto, não durou muito tempo. Em 1989, a área têxtil passou por uma crise e, por isso, os industriais já não tinham interesse em continuar com o jornal. Por outro lado, Herbert Pastor, que era diretor da Buettner, não queria que o principal jornal da cidade fechasse as portas, por isso, convenceu os diretores e a indústria assumiu as demais cotas da sociedade.
“Não queria deixar O Município morrer. Era o único jornal da cidade. Tinha que preservar. Conversei com o meu pai (Gotthard Pastor) e ele concordou. A Buettner então assumiu sozinha a direção. Nunca tivemos lucro, mas conseguíamos pagar os salários”, destaca Herbert, que mais tarde atuou como colunista do jornal durante seis anos.
Herbert foi designado como diretor do jornal a partir de 1989 e, durante sua gestão, o semanário ganhou uma nova identidade. Ele decidiu adotar uma linha editorial mais independente, propondo uma redação sem ligações políticas. Foi ele também que contratou os primeiros repórteres.
“Pela primeira vez, o jornal teve repórteres. Era uma novidade na época. Eu passava lá todo dia e via como era difícil manter um jornal em Brusque. Começamos com duas repórteres e as matérias ficaram mais dinâmicas. Mas tinha muita dificuldade, porque muita gente não queria receber as repórteres, consideravam uma intromissão, quando na verdade, se queria saber dos fatos para explicar para o público”.
Herbert ficou na direção do jornal até 1993. Ele considera que o principal feito de sua gestão à frente do semanário foi permitir a continuidade de O Município.
“A grande emoção que eu sinto foi que conseguimos manter o jornal vivo. Se a Buettner não tivesse assumido naquele momento, teria fechado as portas, porque não havia interesse. Até tentamos sensibilizar outras empresas, mas não teve jeito”.
Jorge Colzani, que estava em ascensão com a Colcci na época, assumiu o comando do jornal em 1993 e deu um novo fôlego a O Município, que passou a pertencer, portanto, ao Grupo Colcci.
Ele fazia parte de um grupo de oito empresários dispostos, inicialmente, a administrar o jornal, mas, depois de diversos encontros sem definição de como a divisão seria feita, ele decidiu que compraria o jornal sozinho. “Alguns falavam que o maquinário tinha muito valor (ele descobriu depois que, na verdade, não tinha), mas eu não me importava com isso. O grande valor estava nas histórias e no acervo”, disse Jorge em entrevista a O Município em 2014. Ele faleceu aos 65 anos em setembro de 2018.
No início, a maior dificuldade encontrada por sua administração foi a de formar uma equipe de jornalismo para a produção de notícias. Ele conta que ele e Glória Zen, que trabalha no jornal até hoje no setor comercial, precisavam escrever conteúdo para fechar uma edição. Naquela época, a publicação era semanal. “No final daquela edição precisamos rir sozinhos. Quando o repórter assumiu foi um alívio”, contou Jorge na mesma entrevista.
Uma de suas preocupações era manter o jornal isento e sem influências políticas. Quando o editor assumiu seu posto, ele deu liberdade editorial, destacando apenas a importância de manter uma postura isenta. Ele também orientou que a sua imagem só deveria ser usada em último caso. Sua preocupação era administrar sem influenciar editorialmente.
Durante o primeiro ano da administração de Colzani, o jornal passou a ser impresso em off-set, na gráfica do Jornal de Santa Catarina, em Blumenau, ao invés do método de linotipo. Segundo o empresário, o maquinário que o jornal tinha na época “não valia nada” e ele gastou mais “para tirar as máquinas – que pesavam toneladas – do que para comprar o jornal”. Sob a administração dele, foi impressa a primeira edição colorida do jornal O Município, em 1997.
Atual proprietário e diretor-geral do Grupo O Município, Cláudio José Schlindwein trabalhou anos com Colzani, seu tio, na Colcci. Em 2000, ele, que já tinha uma relação com o jornal, assumiu a desafio de comandar um dos mais tradicionais veículos de comunicação do estado e, até hoje, está à frente d’O Município, que passou por diversas transformações ao longo dos últimos 24 anos, mas segue sua trajetória de crescimento e credibilidade.
Uma das mudanças importantes nesse período aconteceu em 2002, quando O Município passou a circular diariamente no formato tabloide e se tornou Município Dia a Dia – nome que se manteve até 2017, quando todas as marcas do jornal foram unificadas.
A primeira página do jornal na internet foi criada em 2000 e, ao longo de 15 anos, O Município realizou vários teste no digital, com mudanças de layouts e utilização de novas linguagens, mas sem uma atenção especial ao conteúdo na internet, já que a cultura do veículo ainda era muito ligada ao digital.
Em 2012, foi lançado o portal Município Mais, com a intenção de utilizar conceitos da Web 2.0, onde o conteúdo do impresso era ampliado no digital, com informações extras, links e galerias, entre outros elementos.
Foi em 2015, porém, que o jornal passou a ter um foco maior à produção de conteúdo exclusivo ao digital, o que mudou principalmente o modo de trabalhar da redação e do comercial, expandindo as possibilidades. “O processo digital sempre foi de muita tentativa e erro”, destaca Cláudio.
O Município fez a transição com muito sucesso. Em pouco tempo, assumiu a liderança de audiência no digital e passou a ser referência para outros veículos de comunicação.
“Com o passar dos anos, a experiência no digital começa a ser ampliada e, a partir disso, precisamos repensar nosso negócio. Não éramos mais só um jornal, atrelado a um formato físico. Nosso negócio agora era a geração de conteúdo local, distribuído em várias plataformas (jornal impresso, portal e redes sociais)”, destaca.
O jornal, que continua forte no impresso, passou por essa grande transformação digital, e atualmente é mais lido do que nunca foi. Além disso, se transformou em grupo com a abertura das sedes em Blumenau, em 2017, e Joinville, em 2020. A expansão de O Município só foi possível graças ao sucesso do portal de Brusque, que também refletiu em um reforço da marca no impresso.
“O jornal impresso tem uma reação positiva com o fortalecimento do jornal. Aconteceu algo interessante, o jornal passou a ter uma imagem de modernidade, de inovação. E quando vemos que o jornal dá um salto significativo de audiência no digital, isso nos motiva a dar um passo fora da nossa cidade e ir para Blumenau”, explica.
Com a expansão, O Município deixou de ser um jornal importante apenas para a região de Brusque e se tornou uma força estadual, já que hoje está presente em duas das maiores regiões de Santa Catarina com uma audiência expressiva, o que reflete no aumento da relevância. “Hoje somos reconhecidos pela nossa qualidade em várias esferas, o que chancela a nossa credibilidade”, resume.