Juíza fala sobre a implantação do processo eletrônico e relações trabalhistas

Karin Correa de Negreiros diz que "A legislação trabalhista pesa bastante para a cultura da busca ao Judiciário"

Juíza fala sobre a implantação do processo eletrônico e relações trabalhistas

Karin Correa de Negreiros diz que "A legislação trabalhista pesa bastante para a cultura da busca ao Judiciário"

No dia 12 de setembro deste ano, a juíza Karin Correa de Negreiros conduziu a primeira audiência no processo judicial eletrônico (PJE), realizada na 2ª Vara do Trabalho de Brusque. Em entrevista ao Município Dia a Dia, ela comenta essa transição, assim como o fluxo de trabalho na 2ª Vara, que foi implantada em agosto deste ano para desafogar a Justiça do Trabalho em Brusque, na qual audiências de instrução (para coleta de depoimentos) estavam sendo marcadas somente para o fim de 2015, devido ao acúmulo de processos.

Município Dia a Dia: A 2ª Vara do trabalho foi criada para reduzir o tempo de tramitação dos processos. Como isso está funcionando?
Karin Correa de Negreiros: Não é bem um desafogamento, é uma distribuição melhor do trabalho, e uma antecipação das pautas, das audiências. Na 1ª Vara, as audiências de instrução, quando vão ser ouvidas as partes, estão sendo designadas para outubro de 2015. Esse é o nosso maior problema. O volume de ações sempre vai haver, porque há uma alta empregabilidade em Brusque. Com a instalação em agosto, para quem fizer a audiência inicial hoje, a audiência de instrução, que é aquela para coleta da prova oral, está sendo marcada para dezembro deste ano. Uma diferença de quase um ano, da 1ª para a 2ª Vara. As pessoas que ingressarem com novas ações vão ter essa audiência próxima, isso significa uma sentença também próxima, uma decisão de primeiro grau rápida.

MDD: Qual a sua opinião sobre o processo judicial eletrônico (PJE), no qual a 2ª Vara opera, em relação ao processo convencional, feito na base do papel?
Karin: Ele é um processo em construção, ainda enfrentamos dificuldades. No meu trabalho, particularmente, que se limita basicamente às decisões, tenho achado tranquilo; os advogados poucos reclamaram. Eventualmente, existe um problema técnico que nem sempre o Tribunal daqui consegue resolver, precisa ser em Brasília. O pessoal da secretaria, onde se desenvolve o trabalho de cumprimento das ordens judiciais, tem um pouco de dificuldade, o sistema não está aperfeiçoado para tornar ágil como era no processo físico. O processo eletrônico está tentando alcançar isso. Imagino que, a longo prazo, devemos ter uma resposta neste sentido. Pelo que vemos de demora na solução destes obstáculos, vai levar um tempo ainda.

MDD: Em que ponto o PJE foi projetado para funcionar, mas na prática não tem dado resultado?
Karin: Um exemplo é a estatística do juiz. Nas varas de processo físico, tem um sistema que é alimentado e sai automaticamente, no final do mês. No processo eletrônico ainda não temos isso. Não sei porque razão não temos, pois isso toma tempo da pessoa responsável pela estatística. Os atos processuais na secretaria são mais lentos, em razão da dificuldade desse sistema.

MDD: Que tipo de ação tem sido mais comum, das que tramitam na 2ª Vara do Trabalho?
Karin: Aqui em Brusque temos, de forma bastante recorrente, questões sobre intervalo intrajornada, aquele dentro do horário de trabalho, no qual o trabalhador tem direito a uma hora de intervalo. Houve muita discussão sobre isso, para redução do intervalo. Havia um pedido dos próprios trabalhadores para essa redução. Ela foi incluída em norma coletiva, e a CLT não permite isso, tem que ser ato do Ministério do Trabalho e Emprego. Um ato do Ministério autorizava a redução por norma coletiva, e isso foi feito, muitas empresas, de boa fé, fizeram, mas tem que ser um ato específico para cada empresa, em autorizações individuais. Isso vai contra a norma legal e, em razão disso, tem uma demanda muito grande neste tipo de regularização.

MDD: Existe uma manifestação, por parte de magistrados, de que o Judiciário está sobrecarregado porque as pessoas não buscam a conciliação, mas sim o litígio, a disputa judicial. Isso é uma realidade, atualmente?
Karin: A conciliação é a melhor saída, mas existe o aspecto moral da coisa. Quando não se faz a conciliação judicialmente, ela não tem valor. Ainda que se queira fazer um acordo, o ideal é que se busque o poder Judiciário. É uma forma do empregador se resguardar. Ali vão se estabelecer os limites do acordo. Eu penso que, se moralmente as pessoas mantivessem sua palavra, e que se cumprisse o que foi combinado fora do Judiciário, estaria resolvido. Mas a gente sabe que o ser humano nem sempre segue essa regra. No acordo, não se entra no mérito da situação, é uma questão de cada uma das partes abrir mão de alguma coisa, é uma saída bastante pacificadora e que traz satisfação para todos.

MDD: O conflito entre empregado e trabalhador sempre existiu, as relações de trabalho costumam ser muito conflituosas. Isso é uma questão cultural ou que está mais ligada à legislação vigente?
Karin: A norma trabalhista está inserida na cultura há muito tempo. Tem um pouco dos dois. Estamos bastante habituados às pessoas dizerem que, na Justiça do Trabalho, só o empregado ganha, o que não é verdade. No entanto, o Direito do Trabalho já nasceu protetivo, esse é o espírito dele, porque a ideia é que existe uma relação de hipossuficiência (condições financeiras mínimas) da parte do empregado, e de poder econômico, da parte do empregador. Há muitas regras que beneficiam e tratam de forma diferente o empregado, em razão dessa desigualdade. O empregado, sabe, no Brasil, que tem um amparo, o que é muito importante. É claro que ele vai buscar essa procura pelo Judiciário já com essa ideia de proteção. Mas não é bem assim essa ideia de que o empregado sempre se dá bem. Ouvimos a prova oral, e muitas vezes a prova oral revela muita coisa contra a pessoa que a postula. A legislação trabalhista, em suma, pesa bastante para essa cultura da busca ao Judiciário.

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