#MariellePresente

Difícil não ter ouvido falar em Marielle Franco nos últimos dias – infelizmente – devido à fatalidade da sua morte e do motorista Anderson Gomes. Mas, talvez você não saiba muito sobre sua vida e é preciso conhecê-la um pouco.

Suas amigas e amigos enfatizam sua gargalhada marcante, sorriso aberto, bom humor, força, abraço apertado e longo, parceria, garra, militância, coragem, honestidade, ousadia, solidariedade, humanidade… Ela se reconhecia mulher negra, mãe, cria da favela da Maré, LGBT, feminista.

Aos 19 anos foi mãe. Perdeu uma amiga vítima de bala perdida. Ingressou no pré-vestibular comunitário. Formou-se em Ciências Sociais pela PUC-Rio, como bolsista, e posteriormente no mestrado em Administração Pública pela UFF. Aos 37 anos – em 2017 – assumiu o cargo, para qual foi eleita com mais de 46 mil votos, de vereadora do Rio de Janeiro pelo PSOL.

Sua trajetória na política foi marcada por representar, defender e dar voz das pessoas que normalmente não estão representadas na esfera legislativa – ou seja, as mulheres, as pessoas periféricas, negras, LGBTs. Ocupou e ousou defender pautas que versam sobre direitos humanos fundamentais no intuito de reduzir desigualdades, conquistar e resguardar direitos para a população mais vulnerável – afinal, não deve ser este o objetivo de todas as legislaturas? E, em tempo, direitos humanos dizem respeito a todas e todos nós.

Seu precoce assassinato nos faz pensar sobre quais representantes e sociedade que queremos, qual política fazemos no dia-a-dia das nossas relações, quais dores e humanidade sentimos. Eu sou porque nós somos. E você?

“Entre os becos e viela da favela, sobreviver é a nossa maior resistência. Agora chegou nossa vez, vamos ocupar nosso lugar na cidade e na política, ter o que nos é de direito. Nossa voz, muitas vezes silenciada, terá de ser ouvida. Agora é para fazer valer. Sou força, porque todas nós somos. Sigo, porque seguiremos todas juntas. Eu sou Marielle Franco. Mulher, negra, mãe, da favela. Eu sou porque nós somos.”


Rafaela F. Kohler
– antropóloga, integrante do Coletivo Maria Vai Com As Outras e CDH Brusque

 

 

Quem vive grita contigo, Marielle

Desde a última semana temos acompanhado o caso Marielle Franco. Proponho-me a fazer essa reflexão para aquelas e aqueles que se perguntam o motivo deste fato repercutir tanto em um país em que todos dos dias a violência – seja ela social ou doméstica – rouba a vida de tantas Marielles, Angelas, Anas ou Lucianas. Reforço aqui, cara leitora, caro leitor, que nenhuma morte é mais importante que a outra. E, para tentar compreender a repercussão desta, em específico, é preciso fazer o esforço da reflexão a respeito dos motivos (perceptíveis a olho nu) que levaram Marielle à morte.

Insisto em dizer que Marielle morreu porque ousou. Marielle ousou quando decidiu ser, agir, falar e participar. Ousou, quando na condição de mulher, negra, favelada e homossexual participou efetivamente do parlamento. Ousou quando, contrariando todas as estatísticas, foi mãe na adolescência, foi para universidade, tornou-se mestra, ativista social e uma das vereadoras mais votadas do Rio de Janeiro. Ousou, por defender os direitos da vida – de quem quer que fosse, pobre, rico, preto, branco, policial ou bandido. Por fim, ousou sonhar e lutar para a construção de uma sociedade mais justa e igualitária.

Ao elencar as suas ousadias torna-se evidente os motivos pelos quais Marielle morreu. Marielle morreu porque falou, porque agiu, porque sua voz trazia visibilidade às vozes das minorias. Mas, sobretudo, Marielle morreu porque quis compreender a fundo o que se passava nas entranhas do sistema. A morte de Marielle foi um claro recado a todas e a todos que intentam ousar, ser, agir, falar e participar. Fazendo uso das palavras de Djamila Ribeiro, afirmo, poderia ter sido eu, poderia ter sido qualquer uma ou qualquer um de nós. Basta ousar.

Para finalizar, trago à lembrança Milton Nascimento que em homenagem a um estudante brutalmente assassinado – em uma repressão militar nos anos 60 – compõe a música de título “Menino”. Nas palavras do compositor a morte nunca poderá silenciar, diminuir a força ou tirar a legitimidade da luta daquele ou daquela que deitou sangue, em prol de causas que visam uma sociedade melhor. Por isso “quem vive grita contigo”, disse Milton a Edson Luis. Quem vive grita contigo, Marielle, dizemos nós.


Marlina Oliveira Schiessl
– professora

 

 

 

Toda vida tem valor

Não preciso

pensar como ela

gostar da mesma cor

Ou do mesmo Sol a SE PÔR.

Posso até mesmo gostar do mundo sem COR e sem SOL.

Mas não posso aceitar

que te calem

para que eu me cale

Pelo medo de ser calada!

Será na surdina, na calada

Que duas vidas trarão força na voz de um povo

Centenas de gargantas reverberando os gritos de socorro.

Marielle?…

Presente!

E com ela

TODOS OS MORTOS em decorrência

da ganância humana

da hipocrisia burguesa

da incapacidade minha e sua

de sermos realmente BONS

COMPASSIVOS

de olhar além de mim.

Olhar o outro

Identificá-lo

considerá-lo

valorizá-lo

RESPEITÁ-LO

Tentando compreender

Sem julgar ou sobrepor

Afinal,

Sabemos Marielle que para

VOCÊ

EU

NÓS

ELES

Todas as vidas têm valor.

Constansa Becker – Gestora ambiental e colaboradora do Banco de Tempo de Brusque

 

 

Mulher!!

Que luta, que agarra com garra o que quer

Justa, justiça, na luta que disputa a causa do ser

Um crime que causa, elimina a causa de ser o que quer

Chocante, intrigante o que vê

Por quê? O que move quem não vê?…

Se quer sabem, se quer compreendem a complexidade do ser;

E foi ela, uma mulher eleita por tantos que sabem o querer ser;

E agora…, que raça que caça pra quê?

É um crime entre tantos crimes, por quê?

Ô gente, carente de ser!

Ô gente, como podemos ser tão forte a ponto de embrutecer o SER…

E o respeito dessa gente, cadê?

E a justiça que não se vê…

Um pouco de amor, na dor, na perda do ser!

E o que mais ainda há de ser…


Sabrina Maria Schlindwein
– Psicóloga

 

 

ilustração no topo da página: Larissa Ribeiromuseu inventado