Costumo dizer que achar um ponto comercial, depois mobiliar, decorar, comprar as louças e bibelôs são a parte mais fácil e romântica quando se considera encarar o desafio de abrir um estabelecimento relacionado à gastronomia. Seja esse local um café, uma confeitaria, um bar, um boteco, uma lanchonete ou um restaurante.

Com o passar dos anos percebi que muitos estabelecimentos têm adotado a prática de adornar seus espaços, mas e os alimentos oferecidos tem acompanhado essa melhora? Gosto de zanzar por aí conhecendo lugares e infelizmente tenho encontrado mais ambientes lindos e aconchegantes do que comida boa e saborosa. Arranjos temáticos, variedades de tecidos, papel de parede, móveis, acabamentos, cores, tintas, molduras, objetos, tudo isso e muito mais, estão disponíveis a qualquer pessoa com muita facilidade. Criar um ambiente personalizado e decorado hoje em dia não é tarefa complicada e isso é muito bom, pois é extremamente agradável estar num ambiente confortável e acolhedor. No entanto, o que é mais importante? A embalagem? Ou o conteúdo?

Quando se trata de um estabelecimento gastronômico, ou seja, que atua na área da alimentação, minha opinião é que o conteúdo (aqui me refiro aos alimentos e bebidas servidos) deve se sobressair à embalagem (aqui me refiro à decoração e móveis do ambiente). Mas será que é isso que temos encontrado por aí? Mais comida gostosa do que ambientes “fofos”? Tenho minhas dúvidas. Geralmente, meu paladar tem se frustrado mais do se alegrado. Volta e meia encontro produtos com aparência incrível (isso também mudou e melhorou bastante) e empolgante, que me faz desejar saborear aquela joia que seduz o paladar. No entanto, após a primeira bocada, a emoção desempolga e novamente sou tomada por questionamentos. Será que só eu que não achei gostoso? Seria a baixa qualidade dos ingredientes? Seriam as medidas, mal medidas? Seria a própria receita? Seria a falta de experiência do(a) cozinheiro(a) ou confeiteiro(a)?

Esbarro ainda em mais um impasse dessa complicada gestão da gastronomia: como afirmar se um produto é “gostoso” ou não? Como aferir esse adjetivo tão precioso? Sem dúvida essa é uma tarefa extremamente complexa, além de delicada. Dizem por aí que “gosto não se discute”, mas, e quando estamos pagando pelo produto? Não dá mesmo para discutir? Não tem uma provinha para experimentar? Será que uma pesquisa de satisfação do cliente, em relação aos alimentos, pode ajudar? Será que os cardápios não deveriam ter informações mais completas, dando pistas de como será a preparação? Ou seja, se é ácido, apimentado, crocante, salgado, muito doce, pouco doce, bem quente, frio, etc, etc.

Meu palpite é que para decorar um ambiente basta fazer isso uma vez, já os alimentos têm que ser produzidos todos os dias, repetidamente várias vezes. Embora os proprietários estejam cientes disso, será que estão cientes da importância de investir num profissional qualificado e dedicado para ser o chef da cozinha ou confeitaria? Será que estão dispostos a encontrar os melhores ingredientes? Será que os gestores estão preparados para identificar que acima de tudo, o mais importante é uma boa comida?

Hoje fui invadida por questionamentos… e com muita vontade de comer algo bem gostoso!

 

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Michelle Kormann da Silva – Gastrônoma