No
dia 02 de abril foi dado um destaque especial para o autismo, que tem nessa
data o seu “Dia Mundial de Conscientização”. Muitas foram as matérias na
imprensa acerca do tema, e eu, é claro, não tenho nada a acrescentar ao que
pais e mães de crianças autistas e os competentes profissionais que se
manifestaram já disseram sobre o assunto. Não vou falar, portanto, dos autistas
clinicamente diagnosticados e em tratamento, mas tentar tirar deles algumas
lições para nós, que nos consideramos socialmente bem ajustados.

Lembrei-me
do psicólogo suíço Pichon-Riviere, que criou os chamados “grupos operativos”,
quando ele fala sobre a loucura. Segundo esse autor, a loucura não é um
fenômeno isolado de um indivíduo. Aquele que chamamos de louco é apenas uma
pessoa mais sensível, que capta a nossa loucura coletiva e a manifesta de modo
mais evidente. Portanto, ele não é o único louco, mas é o porta-voz da loucura
do seu grupo social. Nós apenas somos mais competentes em disfarçar nossas
neuras.

Penso
que se pode fazer uma analogia com o autismo. Observo o quanto nossa sociedade
tem mergulhado num individualismo exacerbado. Parece que vivemos unicamente
para satisfazer nossos desejos e interesses individuais, enquanto os outros
estão aí para nos servirem ou nos atrapalharem nesse propósito. Estamos
perdendo o senso da convivência social mais básica. Colocamos em risco nossa
vida e a dos outros no trânsito, quando, pensando unicamente na nossa pressa ou
na necessidade infantil de não ficar atrás de ninguém, efetuamos manobras
arriscadas. O que move uma atitude irracional como essa, para ganhar quinze ou
vinte segundos numa viagem? Isso é autismo. Vemos os outros, mas não nos
importamos com eles. A única coisa que nos move é um ímpeto egoísta, cego, de
satisfazer um desejo ou uma necessidade individual.

Vejam
o desrespeito absurdo dos inúmeros “sem noção” que nos obrigam a ouvir suas
músicas ridículas, porque colocam o som num volume estratosférico, sem se
importarem com o direito fundamental da outra pessoa, que quer descansar e que
não tem a obrigação de vibrar na mesma frequência do indivíduo que pensa que o
seu ouvido é o ouvido do universo.  Nas
vizinhanças, nos condomínios e mesmo entre familiares, os conflitos mais simples
tomam proporções desmedidas e, não raro, vão parar na justiça, para que um juiz
declare solenemente o que todo mundo saberia, se estivesse atento ao mínimo bom
senso. Os exemplos se multiplicariam. Relacionamo-nos com nossos celulares e
fones de ouvido, mas a pessoa do outro é, em geral, um obstáculo para nós. Como
ousamos nos considerar socialmente ajustados?

Talvez
as crianças autistas venham ao mundo como uma espécie de profetas, como que
para nos dizerem: “Por que vocês acham estranho meu comportamento, se fazem
exatamente o mesmo? Que tipo de habilidade social vocês desenvolveram para
estranharem a minha?

Ou
aprendemos a reconhecer e valorizar o outro com respeito e solicitude, ou nosso
autismo coletivo nos levará a todos para o abismo.