José Francisco dos Santos

Mestre e doutor em Filosofia pela PUC/SP, é professor na Faculdade São Luiz e Unifebe, em Brusque e Faculdade Sinergia, em Navegantes/SC e funcionário do TJSC, lotado no Forum de Itajaí/SC.

Promíscuos poderes

José Francisco dos Santos

Mestre e doutor em Filosofia pela PUC/SP, é professor na Faculdade São Luiz e Unifebe, em Brusque e Faculdade Sinergia, em Navegantes/SC e funcionário do TJSC, lotado no Forum de Itajaí/SC.

Promíscuos poderes

José Francisco dos Santos

O infame julgamento da chapa Dilma/Temer no TSE, na semana passada, abre espaço para se analisar, mais uma vez, os poderes da República, suas relações e prerrogativas. Quando o filósofo francês Charles Louis de Secondat, o Barão de Montesquieu, escreveu o Espírito das Leis, evidenciando a necessidade de uma tripartição de poderes, estava fundamentando um dos pilares de um Estado democrático de direito. Mas, para que isso funcione, é preciso que cada um dos poderes trabalhe no limite de suas funções, e não abra mão de suas prerrogativas. O que temos visto em Brasília, bem ao contrário disso, é uma relação promíscua, que transforma o Estado pretensamente democrático numa zona de meretrício, numa espécie de “triângulo sexual”. O executivo detém a chave do cofre, e pode comprar os “favores” do legislativo, que se prostitui e trabalha no ritmo ditado pelo “cliente”. Se a motivação fosse apenas a agenda necessária à boa governança, estaria tudo correto. Mas as frequentes negociatas, os mensalões e mensalinhos, o loteamento de cargos públicos e tantos outros expedientes pouco virtuosos mostram que se trata de prostituição de luxo. O judiciário, em especial as cortes superiores, detém a prerrogativa de decidir por último, e deveria fazê-lo com independência e baseado apenas em critérios técnicos e jurídicos. Mas frequentemente tem feito o jogo sujo dessa cafetinagem política e jurídica, ora decidindo claramente contra a lei e em nome de valores espúrios (como a decisão de declarar que o aborto não é crime até o terceiro mês de gestação), ora fazendo arranjos politiqueiros deprimentes, como no espetáculo grotesco da semana passada. O ministro Gilmar Mendes, que presidiu o julgamento no TSE, havia arrotado, dias antes, que o judiciário não era lugar para resolver crises políticas. Mas devia estar se referindo apenas à solução que previa o afastamento do presidente. O ministro Herman Benjamin honrou a toga, e proferiu um julgamento realmente jurídico, fundamentado e irretocável. Coube a Gilmar e seus seguidores tentarem justificar o injustificável, esconder o óbvio, para manterem uma decisão seguramente já negociada de antemão.

Ora, dizer que não houve abuso de poder econômico na campanha que elegeu Dilma e Temer, fingindo não ver ou arranjando desculpas esfarrapadas para não considerar as abundantes e gigantescas provas é um claro desvio da função judiciária. O mesmo TSE cassou o prefeito Paulo Eccel por um capricho interpretativo da lei orçamentária, numa controvérsia sobre o uso semestral ou anual do valor destinado à publicidade. Ora, isso não é nem troco de pinga, e nem sequer caracteriza corrupção nos termos em que a ação contra a chapa Dilma/Temer deixou mais que evidente. Uma contradição absurda e inaceitável para um poder que se diz técnico e independente. O judiciário age como o cafetão, que surra a prostituta – e o “cliente” – quando quer ou os beneficiam, estendendo ou atrasando julgamentos conforme a conveniência. Ora se descabela para não deixar o mosquito escapar pela fresta da janela, ora deixa o elefante sair tranquilamente pela porta da frente. Nesse jogo de promiscuidade, quem está ferrado – e pagando a conta – é o povo, enquanto a democracia escoa pelo ralo. Que as prostitutas me perdoem por compará-las a esse tipo de gente.

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