Quase 70 casais de Brusque aguardam crianças aptas à adoção
Busca por perfil específico dificulta processo em todo o país
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Crescer em uma família, rodeada de amor e cuidados, é essencial para a formação de uma criança. O direito à família é, inclusive, reconhecido e assegurado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Caso não possa crescer na convivência da família de origem, é direito da criança que ela tenha uma família substituta.
Para dar todo o amparo necessário ao desenvolvimento da criança e do adolescente, muitas vezes, entra em cena a família adotiva: famílias que, por um ato de amor, decidem adotar uma criança que, por alguma razão, precisou ser retirada do lar biológico.
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De acordo com o Cadastro Nacional de Adoção (CNA), hoje, há 8.669 crianças e adolescentes registradas e aptas para serem adotadas no Brasil, sendo 2.598 na região Sul. Destas, 310 estão em Santa Catarina.
Também segundo dados do CNA, há mais de 43,6 mil pretendentes, ou seja, pessoas querendo adotar. Na região Sul, são 12.675 pretendentes habilitados, sendo que 2.686 se encontram no estado de Santa Catarina. Em Brusque, há 68 possíveis pretendentes – porém, não há nenhuma criança apta para adoção no município.
Confira o quadro do Cadastro Nacional de Adoção:
Para melhor visualizar os dados, passe o mouse sobre os gráficos.
Com um número maior de crianças buscando uma família do que de possíveis adotantes, por que ainda há crianças nos abrigos? Parece ilógico, mas a questão é que, quando se preenche o cadastro para entrar na fila de adoção, o pretendente escolhe o perfil da criança que quer adotar.
É possível escolher crianças pela idade, pela raça, e também optar por adotar ou não irmãos, crianças ou adolescentes que possuam algum tipo de deficiência física, mental, HIV ou qualquer outra doença. Muitos pretendentes – 27.543, totalizando 63.1% dos cadastrados – optam por adotar apenas crianças sem nenhum tipo de doença ou deficiência.
Porém, de acordo com Ana Paula Garcia Scheffer, presidente Grupo de Estudos e Apoio a Adoção de Brusque, o perfil dos pretendentes está se ampliando nos últimos anos. “Uma grande parte já está aceitando crianças de ambos os sexos, e também crianças pardas, mulatas, negras ou indígenas”, afirma.
De acordo com dados do CNA, dos 40 mil pretendentes habilitados, 79% aceitam receber crianças pardas ou mulatas, 50% aceitam negras ou indígenas e 63% são indiferentes em relação ao sexo, enquanto 30% optaram por receber apenas meninas.
A média de tempo de espera na fila de adoção em Brusque é de cinco anos, período que é diferente em cada município, de acordo com a disponibilidade de famílias e de crianças ou adolescentes e também com o perfil desejado pelos adotantes.
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Segundo Ana Paula, isso acontece devido ao perfil desejado pelos pretendentes: “aqueles que indicam a possibilidade de receber crianças maiores ou com irmãos vão receber seus filhos em menos tempo. Já os que aceitam somente crianças com menos idade ou sem irmãos, vão esperar mais”.
Em Brusque, não há, no momento, crianças ou adolescentes aptos para adoção. Porém, de acordo com Ana Paula, há crianças com a situação sendo avaliada pelo juizado da Vara da Infância e da Juventude, que estão no abrigo Lar Sagrado da Família ou com famílias acolhedoras.
Naturais do interior de São Paulo, Berenice e Agnaldo são pais de três filhos, todos adotivos. Moradores de Brusque desde 2009, o casal conta que a adoção, embora apresente um processo de adaptação tanto para os pais quanto para as crianças, trouxe a eles muito mais alegrias do que dificuldades.
“Eu sempre tive em mim essa vontade de adotar”, diz Agnaldo, que, ainda solteiro, iniciou um processo de adoção. Ele conta que, na época, seus pais o fizeram mudar de ideia e ele acabou desistindo, mas, depois de conhecer a esposa Berenice, os dois compartilhavam desse desejo.
“Por coincidência ou por destino, nós descobrimos que não podíamos ter filhos”, conta ele. E foi então que, com apenas um ano de casados, cadastraram-se no CNA. O casal ficou pouco tempo na fila, e logo puderam adotar Gustavo, o filho mais velho, que era um bebê de sete meses.
“Eu sempre digo que é tudo igual, a única diferença é que meus filhos não nasceram da barriga, mas do coração”, afirma Berenice, que comenta como a adoção era um tabu na época em que ela e o marido receberam o filho mais velho, que tem hoje 21 anos. “Mas nós sempre tratamos tudo normalmente, educamos eles com tranquilidade”, conta.
Como Gustavo foi adotado ainda bebê, a adaptação dele foi muito fácil. Já Berenice e Agnaldo, pais de primeira viagem, sofreram um pouquinho mais: o filho teve refluxo, intolerância à lactose, vários pequenos probleminhas que bebês têm na tenra idade.
Mas o desafio mesmo veio mais tarde, quando o casal quis adotar novamente. Gustavo queria irmãos e, ainda morando em São Paulo, o casal deu entrada num novo processo de adoção. Desta vez, o perfil esperado já era diferente. “Nós já tínhamos tido a experiência de ter filho bebê e pensamos que quem mais espera pela adoção nos abrigos são as crianças maiores. Então deixamos no nosso perfil que aceitaríamos irmãos com idade de 3 a 6 anos”, conta Berenice.
Agnaldo lembra que, nesse segundo processo, com a chamada “adoção tardia” (quando a criança já é mais velha), o casal teve muito medo de não dar conta. “Adotar crianças maiores também é um tabu, todo mundo diz que ‘já vem com a personalidade’ e que ‘só traz problema’. Mas não foi assim. Nós também tínhamos amadurecido.”
Com a mudança para Brusque, interromperam o processo de adoção até que estivessem estabilizados na cidade. Berenice diz que o filho mais velho cobrava, mas ela, em setembro de 2015, há dois anos na fila da adoção, já estava quase desistindo: “Eu disse para o meu marido que, se não desse certo até o fim do ano, não quero mais”. Em dezembro, receberam a ligação do fórum.
“Nos ligaram dizendo que havia duas meninas, irmãs, que nós poderíamos adotar. Quando você recebe o contato, tem que dizer na hora, sim ou não. Nós dissemos sim e ouvimos ‘parabéns, papai e mamãe'”, relembram. O casal lembra também da agonia da espera, de não poder ir imediatamente ao abrigo buscar as filhas.
“Quando fomos fazer os primeiros contatos com elas, nós soubemos que eram nossas filhas. Parece que sempre foi seu. Não tem como não amá-las desde o primeiro momento, aquelas carinhas de assustadas”, diz Berenice.
Após poucos dias de contato com as crianças, o casal pôde levar para casa as filhas Pâmela e Sofia, cujos nomes foram alterados a pedido da família, hoje com 8 e 4 anos, respectivamente. As meninas faziam parte de um grupo de quatro irmãos que, por decisão judicial, foi separado. Porém, a ordem do juiz era de que as duas famílias mantivesse contato, para que as crianças não perdessem o vínculo que tinham. Os pais adotivos dos irmãos de Pâmela e Sofia também moram em Brusque, e tornaram-se uma “família estendida” de Agnaldo e Berenice.
Até hoje, eles mantêm contato frequente com a família que adotou os dois irmãos das meninas. “É como se a gente fosse mesmo uma família só. Os filhos deles nos chamam de tio e tia, e nós nos visitamos pelo menos uma vez no mês”, contam os pais.
Quase três anos se passaram desde a adoção das meninas. Agnaldo ri quando conta que o período de convivência deles foi de “um final de semana”. Mas foi, mesmo: Berenice relembra que elas se adaptaram muito bem à nova casa e à família, até por que a filha mais nova tinha pouco mais de um ano, então, não sabia muito bem o que estava acontecendo.
“O mais difícil foi com a Pâmela, que já era mais velha e lembrava mais do que acontecia com elas antes de irem para o abrigo. Em alguns momentos, ela tinha recaídas, nos desafiava e ficava um pouco rebelde”, conta Berenice. Agnaldo diz também que ela tinha esses picos de rebeldia após os reencontros com os irmãos: “Ela retrocedia, e o casal que adotou os meninos também percebia isso neles, como se tudo o que eles viveram antes da adoção ‘voltasse'”.
O casal conta que, apesar dessas situações isoladas, as meninas são muito respeitosas e obedientes, ao contrário do que ouviam de muitas pessoas quando diziam que iam adotar crianças mais velhas. “Há quem encare a adoção tardia como piedade ou caridade. A caridade nós fazemos para nós mesmos, que desejamos muito ter filhos. É uma troca, é recíproco, nós damos amor e recebemos também”, dizem.
Hoje, eles notam que, especialmente a filha Pâmela quer esquecer a vida que tinha antes de ser adotada pela família. No início, ela tinha dificuldade em desapegar da mãe biológica e chamar Berenice de mãe, mas, com o tempo e muito diálogo, acostumou-se. “A Sofia me chamava de ‘tia’, um costume do abrigo. E, quando era pequena, ela ficava só comigo, resistia muito ao Agnaldo, já que não havia figuras masculinas no abrigo”, conta ela.
“Dá vontade de abraçar elas e apagar tudo o que passou, fazer elas começarem de novo, uma nova vida conosco”, diz Berenice, que relembra o quão difícil foi para Pâmela se sentir parte integrante da família. Por ter a pele mais morena que a dos pais, ela tinha dificuldade em se identificar e aceitar-se como filha do casal. Isso só passou quando os pais a levaram para conhecer os irmãos de Berenice, que têm a pele da mesma cor que a da menina. “A aceitação dela também melhorou depois que ela soube que o Gustavo não era filho da barriga, mas do coração, assim como ela e a Sofia”, conta a mãe.
Agnaldo afirma que, para ter filhos adotivos, a família precisa estar disposta a apenas uma coisa: dar amor e carinho àquela criança. “Tem que saber também impôr respeito, dizer não quando necessário. É seu filho, você é pai ou mãe dessa criança”, diz Berenice. “Os pais precisam estar preparados para lidar com eventuais traumas que os filhos possam ter, especialmente se forem mais velhos. Mas, com amor, tudo se supera”, completa.
Os casos em que a família e a criança não se adaptam são raros: em Brusque, de acordo com a presidente do Grupo de Estudos e Apoio a Adoção, Ana Paula Garcia Scheffer, a devolução aconteceu duas vezes.
Ana Paula acredita que essa situação ocorre devido ao desencontro entre a expectativa das famílias quanto ao filho adotivo e a realidade da criança que recebem após o término do processo de adoção. Como não há contato entre os pais e a criança durante o processo, é comum que se idealize algo que será bastante diferente da criança de carne e osso que será adotada.
“É durante o chamado ‘estágio de convivência’ que os problemas aparecem”, explica Ana Paula. “Essas crianças e adolescentes não são nascidas em berço de ouro. Elas vêm de lares desestruturados, e isso gera uma frustração para pais que talvez não estejam tão preparados para a adoção.”
O advogado Bruno Francisco de Souza acredita que, quando ocorrem casos de devolução, eles são causados pelo despreparo dos adotantes. “Às vezes, a família tem a melhor das intenções, mas, depois de adotar, percebe que esse ato não foi motivado pela verdadeira vontade de ter um filho, mas por quaisquer outras razões”, explica.
“É possível fazer uma analogia com o nascimento. Quando a criança nasce, não se pode colocá-la de volta no útero da mulher. A adoção é o mesmo sistema, os adotantes precisam ter a consciência de que não vai ter volta, é para sempre”, acrescenta o advogado.
Nos primeiros meses da adoção, enquanto a família está com a guarda provisória e passando pelo estágio de convivência – que, desde o ano passado, está estipulado por lei como um período de 90 dias -, todos estão enfrentando a mesma dificuldade: a adaptação.
Ana Paula explica que, por parte das crianças, não é tão incomum “testar” os pais adotivos, tendo momentos de rebeldia e até mesmo agressividade. “Isso é um reflexo do trauma pelo qual elas passaram. Sem suporte adequado, muitas famílias não aguentam, acabam desistindo de adotar e cancelam o processo de adoção.”
Souza concorda, e diz que lhe parece que as crianças adotadas trazem consigo um certo trauma e apresentam algumas dificuldades: “uma hipótese é que possam ter vivido episódios de violência ainda na barriga da mãe, diferente de crianças que nasceram de uma gestação que teve todo o acompanhamento”, pondera.
A adoção é um processo judicial regulamentado por lei desde a década de 1990. Antes disso, era feita através de escritura pública: criava-se o vínculo entre o adotante e o adotado, mas esse laço familiar não abrangia a família estendida.
Agora, o processo regulamentar, os documentos prévios que a criança ou adolescente tivesse são destruídos e ela recebe uma nova certidão de nascimento, com os nomes dos pais adotivos. “O processo judicial vem para romper o vínculo da criança com a família biológica, e tudo fica registrado”, explica o advogado Bruno de Souza.
Com o rompimento do vínculo familiar com os pais biológicos, perante a sociedade não há dúvidas sobre os laços familiares entre a família adotiva e a criança adotada. O único caso em que o vínculo não é rompido é para que e impeça o matrimônio entre um casal de irmãos, e situações como essa, de acordo com o advogado, já aconteceram no Brasil.
Para evitar que ocorra um casamento entre familiares, os documentos prévios e todo o processo de adoção ficam arquivados e podem ser acessados apenas pelo fórum e pelo Ministério Público. Porém, podem também ser requisitados pelo adotado, caso manifeste interesse em conhecer o processo de ter mais informações sobre a família biológica.
“Quando completar 18 anos, o adotado, já adulto, pode solicitar o desarquivamento de processo, caso manifeste interesse em saber mais informações sobre sua família de origem. Para mim, esse é um dos pontos mais importantes em haver um processo judicial.”
“Jeitinho brasileiro”
Entretanto, ainda ocorrem no país adoções irregulares, conhecidas informalmente como “adoção à brasileira”. Segundo o advogado Bruno de Souza, muitas pessoas ainda desconhecem o processo de adoção judicial. Embora seja menos comum, ainda acontecem casos em que a criança é entregue à uma família, que simplesmente passa a criá-la.
Em situações como essa, quando uma criança é, por exemplo, deixada na porta de uma casa, o ideal é que o cidadão leve o bebê à delegacia e esclareça o caso. A adoção irregular é crime tipificado no Código Penal, e, além das questões judiciais, acarreta também na falta do processo no fórum, o que impede que a criança, quando atingir os 18 anos, possa pesquisar sobre sua origem, caso deseje fazê-lo.
Como alternativa de acolhimento para crianças e adolescentes que, por alguma razão, foram retirados da tutela dos pais ou responsáveis, é a Família Acolhedora. Ao invés de as crianças irem para o abrigo, famílias registradas podem receber as crianças enquanto elas aguardam decisão judicial sobre se voltam à família de origem ou se poderão ser adotadas por outra família.
Essa modalidade é um serviço que ainda não existe em todos os municípios brasileiros, portanto, não segue uma “regra” nacional, mas de uma lei municipal que rege o funcionamento. Em Brusque, é administrada pela Secretaria de Assistência Social e Habitação.
A legislação que regulamenta as famílias acolhedoras em Brusque foi promulgada em 13 de novembro de 2012, com a aprovação do projeto de Lei Ordinária nº 101/2012. O objetivo do programa é garantir que as crianças e adolescentes em necessidade de acolhimento provisório sejam recebidas por famílias, para que tenham essa convivência em ambiente familiar e comunitário, assim como previsto pelo Estatuto da Criança e do Adolescente.
O serviço conta com uma equipe formada por uma coordenadora, uma assistente social e uma psicóloga, responsáveis pela avaliação das famílias que se candidatam para receber as crianças, verificam a possibilidade de elas serem ou não famílias acolhedoras, e analisam também o perfil das crianças ou adolescentes que irão ser abrigadas por elas.
Assim como no cadastro para tornar-se pretendente à adoção, é definido um perfil de acolhido que a família deseja receber. Porém, como está definido por lei, os acolhedores não podem adotar, afinal, sua função é prestar o atendimento à criança ou adolescente e possibilitar a convivência em família durante o período em que aguarda pela decisão judicial.
Mariza Rodrigues de Lima e Iara Garzon nunca tiveram a intenção de adotar crianças, porém, quando conheceram o serviço, tiveram grande interesse em conhecer e participar do programa de acolhimento. Elas ficaram sabendo do projeto social através de uma reportagem, e decidiram buscar o serviço e se inscrever como família acolhedora.
No início de 2015, fizeram cursos de capacitação e passaram por todo o processo avaliativo – dos âmbitos psicológico, social e econômico – realizado pela Secretaria de Assistência Social. Elas contam que a equipe do serviço conheceu até mesmo o círculo familiar e de amizades delas.
Após passarem a integrar o serviço, acolheram por cerca de dez meses uma criança de dois anos e oito meses, que, depois do acolhimento, foi adotada por uma família. “Para ser uma família acolhedora, é preciso amar, educar, ensinar. E amar também é saber dizer adeus”, diz Mariza.
Elas contam que é muito gratificante atuar nessa modalidade de acolhimento, afinal, leva a família a sair do comodismo e se envolver em ações positivas. Atualmente, elas estão acolhendo uma criança de 15 anos de idade, que já vive com elas há oito meses e ainda aguarda decisão judicial sobre se voltará ou não à família de origem.
As duas acreditam que essa criança deve, sim, retornar ao lar: enquanto a criança está em acolhimento, o serviço faz um trabalho intensivo tanto com ela quanto com os familiares, para que possam receber novamente o filho. A psicóloga do serviço Família Acolhedora, Ionara Marques, explica que esse é um dos focos do serviço – fortalecer o lar de origem para que a criança ou adolescente possa voltar para a família.
“Quando a criança precisa de acompanhamento clínico, de terapia, nós encaminhamos para um profissional. Da parte da Assistência Social, fornecemos o apoio emocional e afetivo, observamos a formação dos vínculos e preparamos a família e a criança para quando esse laço precisar ser rompido. Não há garantia nenhuma de que eles se vejam novamente após o acolhimento”, diz Ionara.
A psicóloga conta que é sempre mais difícil preparar a família do que a criança. “Os adultos sofrem mais para ‘desapegar’. Mas as famílias participantes do serviço sabem o papel que têm, de serem temporárias, provisórias. E sabem também que tudo o que elas fizerem pela criança no período de acolhimento vai se refletir para sempre na vida do acolhido”, diz.
Iara e Mariza concordam, e dizem que sentem, durante o período de convivência com a criança, que os acolhidos levam para a vida uma nova maneira de se pensar a família. “É preciso saber ouvir a criança, que tem crenças e valores diferentes dos seus, e saber colocar nela todas as oportunidades, para que elas criem um novo começo”, diz Iara.
Mas é claro que nem tudo são rosas: quando uma criança é acolhida, há o processo de adaptação, tanto por parte da família quanto do acolhido. Ao ingressar numa família acolhedora, a criança precisa se adequar à rotina da casa, ajudar nas tarefas e fazer parte da vida daquele lar. O que Mariza e Iara percebem é que, muitas vezes, é difícil para a criança iniciar o convívio naquela família de pessoas que são estranhas para ela.
A criação do vínculo com a família é um processo natural e bastante questionado: a psicóloga Ionara Marques diz que muitas pessoas encaram como um “trauma” o rompimento do laço familiar que é criado através do acolhimento. “Trauma é o que a criança passa ao ter que sair de sua família de origem para ser acolhida, seja num acolhimento familiar ou num abrigo”, afirma.
Em Brusque, desde a criação e institucionalização do serviço, já ocorreram quatro acolhimentos e, em todos os casos, as crianças foram encaminhadas para uma família adotiva após o período com as famílias temporárias. No momento, há duas crianças acolhidas e quatro no abrigo.
A primeira família se inscreveu para receber crianças e adolescentes em 2014. Hoje, há duas famílias inscritas e outras três passando pelo processo de capacitação – número que, segundo Ionara, é suficiente para atender a demanda municipal. “Se tivéssemos mais famílias – digamos, em torno de dez -, seria ótimo para cobrir mais perfis, para ter mais diversidade. Mas, como Brusque não tem muitos casos e o serviço atende situações muito específicas, essas cinco famílias são uma quantidade ótima para um serviço que ainda está começando a atuar.”
“O ideal seria que essas crianças ficassem em suas casas, sendo amadas e cuidadas por suas famílias. Mas, infelizmente, enquanto ainda houver situações em que o acolhimento é necessário, nós pretendemos continuar sendo uma família acolhedora”, afirmam, frisando a importância de que mais famílias conheçam e participem do serviço.
“Do fundo do coração, espero que esse serviço seja mantido pela prefeitura, com toda a equipe técnica responsável e as capacitações oferecidas. As famílias acolhedoras trazem um resultado muito positivo para as crianças”, afirma Iara.
Ionara acredita que o serviço deve se desenvolver e continuar evoluindo. “Estou bem confiante, tivemos ótimas experiências e os depoimentos são bastante positivos. Estamos cada vez mais parceiros do fórum e nosso trabalho vai avançar muito ainda.”