Daniel Mafra tem a moda em seu DNA. Com apenas 17 anos, o jovem iniciou sua carreira na Colcci como estagiário de Relações Públicas e passados mais de dez anos de muito trabalho e dedicação, ocupa hoje o cargo de gerente de marketing da marca. Nos tempos áureos de São Paulo Fashion Week se tornou íntimo de famosas como Gisele Bündchen e Alessandra Ambrósio, e coleciona inúmeras outras amizades com celebridades do mundo da moda.

Paralelo aos holofotes do universo fashion, o brusquense aprecia um lifestyle regionalista e também curte o sossego da cidade natal, intercalado com finais de semana na praia, sempre cercado de amigos e de uma boa gastronomia.

Criativo, extrovertido e dinâmico, Daniel Mafra também faz sucesso com seus projetos pessoais, entre eles a marca Damma, com destaque para uma linha de joias e de louças da porcelana Schmidt. Inquieto e movido por desafios, Daniel fala do momento que requer a reinvenção da indústria da moda, sobre sustentabilidade e a era dos influenciadores digitais.

André Groh – Dentre tantas histórias junto a Colcci, uma das mais marcantes, talvez seja o acidente trágico que culminou na morte de Paul Walker, que era o garoto propaganda da marca. Como foi para a Colcci se posicionar naquele momento, considerando que havia toda uma campanha pronta?

Daniel Mafra – Foram muitas as situações marcantes, mas é claro que trabalhar com a morte de um garoto propaganda é algo muito complexo. Eu estava nos Estado Unidos na época, em um restaurante e quando olhei para a tela da TV havia a manchete da morte do Paul Walker. Na hora não acreditei, porque parecia uma cena de filme. Era madrugada no Brasil e a Colcci ainda não tinha sido comunicada. Até que consegui contatar a diretoria e o jurídico para ver de que forma iríamos proceder, já que tínhamos acabado de fotografar uma campanha com o Paul e a Gisele em Nova York. O Paul era uma pessoa incrível, super acessível, fácil de trabalhar. Acho que a Colcci teve uma atitude muito bonita enquanto marca. Resolveu não produzir os materiais. Entregamos as imagens dele para a família como uma homenagem. Refizemos a campanha com outro modelo e esse é um dos desafios de quem trabalha com imagem, com moda, que é se reinventar da noite para o dia.

AG – Vivemos uma era digital onde os formadores de opinião se tornaram digitais influencers e digitais influencers se tornaram formadores de opinião. Como é para uma empresa se posicionar diante desse mercado?
DM – Para a marca é importante estar presente em todos os meios de comunicação. O formador de opinião ou o digital influencer hoje é um meio de comunicação. Não substitui a revista ou o jornal, mas é mais um meio de comunicação. Entretanto, a minha opinião é que é preciso ter cuidado, porque dentro do universo da rede social todo mundo se acha formador de opinião e digital influencer. Como olhar de profissional de marketing, temos que estar atentos e perceber quem tem o perfil para trabalhar com a marca. Recebemos press kit de inúmeras pessoas que se acham digital influencer, mas não é bem assim. Tem que avaliar o histórico dessa pessoa, as marcas que ela se envolve, qual o legado no sentido de comunicação. Cada vez mais o influenciador tem que focar numa especialidade, porém isso vem contra ao que a maioria das pessoas estão fazendo. Porque uma só pessoa quer falar de moda, de beleza, de culinária, de viagem e realmente a gente que eleger um caminho, para criar uma estética de trabalho para que as marcas se enxerguem nesse perfil. A dica que eu dou para quem quer trabalhar como digital influencer, é achar um nicho que você entenda, que tenha propriedade, que possa falar com propriedade. Faça o seu Instagram ou seu blog voltado a um segmento único, pois quem fala de tudo, não fala de nada.

AG – O futuro chegou mais rápido do que a gente esperava e Pandemia afetou todas as estratégias de comunicação e marketing, principalmente dentro de uma empresa como a Colcci. O que tem sido feito nesse período para se adaptar ao novo cenário?
DM – Cada dia é um desafio. Temos um país continental, o Brasil é muito grande, são muitas regiões e várias formas de lidar com a pandemia. Em alguns locais os Governos são mais flexíveis, em outros são mais duros. Todos os dias nosso departamento comercial e de comunicação estão em contato com nossos clientes, representantes, franquiados, para entender a realidade de cada um. Passamos a tratar o delivery como algo normal. A comunicação digital está em alta. O vendedor da loja física está sempre em contato com os clientes via telefone, via whats app. A consultoria online virou uma realidade. E a presença da marca no universo digital do e-commerce, que teve um grande crescimento. Sem dúvida, é uma reinvenção. Ainda vamos ter um longo período de pandemia e temos que continuar buscando novas estratégias.

AG – Como avalia o perfil do novo consumidor? Como o posicionamento de uma marca é importante nesse momento?
DM – O novo consumidor, o jovem especialmente, consome muito mais com propósito. Fato é que as novas gerações procuram marcas com projetos que falam de sustentabilidade, que tenham ideais de marca diferenciados. E a Colcci é uma marca que desde 1986 veste o jovem brasileiro e ela passa por mutações já mais de 30 anos. O propósito hoje é uma realidade dentro da companhia. No caso da Colcci, temos a linha Colcci Eco Soul que não para de crescer. Começou tímida há quase três anos e hoje já possui mais de 100 itens dentro da coleção. Penso que é papel da indústria da moda, evoluir e tornar sustentabilidade um dos pilares da cadeia de produto. Temos a fama de ser a segunda indústria que mais polui no planeta, perdendo apenas para a indústria do petróleo. Então é um papel de toda a cadeira têxtil passar por essa metamorfose nessa década e ter como propósito a sustentabilidade.

AG – Quando se fala em sustentabilidade, qual a dificuldade de trabalhar com tecidos sustentáveis, por exemplo, no Brasil?
DM – Nosso departamento de estilo vem fazendo um trabalho incrível, coordenado pela Adriana Zucco, que é apaixonada pela linha Eco Soul e trata essa linha como a mais importante da marca. Então, está buscando novas matérias-primas, novas técnicas de produção de tecidos, de jeans, novas lavações, a estamparia digital que é o método mais ecológico do universo da estamparia. A indústria está passando por essa metamorfose e se tornando mais sustentável.

AG – A Colcci tem uma linguagem pop muito forte desde sempre e agora existe a coleção Disney e também parcerias com celebridades como Anitta e Marina Rui Barbosa. Como são os bastidores dessas campanhas, quais novidades estão por vir?
DM – Os bastidores são sempre muito árduos. As pessoas têm uma imagem da moda de glamour, de festa, que não é bem uma realidade. A gente trabalha muito para conseguir fazer esse ‘navio’ gigante que é a Colcci navegar. A Colcci é a maior marca jeanswear do Brasil, então além da responsabilidade de criar uma imagem fashionista a gente tem uma responsabilidade comercial muito grande. Os bastidores sempre são engraçados, divertidos, acontece de um tudo, porque lidamos com muitos egos, vaidades, celebridades e é um mix de sentimentos. Estamos com uma série de novidades. A Colcci não parou por causa da pandemia, pelo contrário, essa coleção da Disney virou um hit entre os brasileiros. Foi um sucesso nesse momento de quarentena. Vendemos muito e 2021 vai ser um ano de muitas novidades para esse público que ama esse universo pop, que ama a marca, nossos colccilovers.

AG – O Carnaval foi uma grande aposta da marca neste ano também. Como é para uma marca de moda se posicionar no meio da maior festa do Brasil?
DM – É um desafio porque o Carnaval acontece em vários lugares ao mesmo tempo e tivemos que nos desdobrar, foi cansativo, mas valeu a pena. Atingimos o auge de visualizações de imagem da história da marca, porque ficamos literalmente cinco dias atingindo os maiores públicos do universo digital. Fizemos as t-shirts do Camarote nº 1, que é o mais desejado da Sapucaí, então todas as celebridades, as modelos mais famosas, os formadores de opinião estavam de Colcci durante os três dias de Sapucaí. Foi posicionar a marca num momento onde a moda não se posiciona tanto e acredito que conseguimos tanto destaque juntamente porque acabamos surfando uma onda sozinhos. Foi muito positivo para a Colcci.

AG – Ficastes um hiato fora da marca para seguir carreira solo, mas uma força maior te trouxe de volta. Que força é essa?
DM – Tenho uma história muito legal com a Colcci. A Lila e o Jorge que foram os fundadores da marca, eram vizinhos dos meus avós, a fábrica era perto da minha casa, e eu vi a Colcci crescer muito de perto. Não esqueço o dia em que ganhei minha primeira peça da Colcci, era uma camiseta com um detalhe de veludo e era a camiseta mais diferente que eu já havia ganho com 8 ou 9 anos de idade. Veio uma cartelinha de tatuagem junto e achei aquilo tão incrível. Comecei na Colcci como estagiário, super jovem aos 16 anos e fiz uma trajetória de crescimento, aprendi muito com os profissionais com quem convivi. Tem muita gente incrível que passou por lá e tive grande professores. Os quatro anos que fiquei fora, foram muito bons para eu amadurecer ainda mais como profissional, testar novos projetos, um deles é a Damma, que é coleção de joias que eu assino. Sair um pouco do vestuário foi muito bom para eu aprender outros consumos, outros produtos e negócios, e voltar também está sendo muito bom. Voltei num momento com ainda mais desafios, isso me inspira e adoro ter que sair da caixa. Um desafio pós pandemia que é continuar movendo um navio gigantesco que se chama Colcci, uma marca com mais de 2.400 clientes, com mais de 100 lojas no Brasil e operações internacionais. É um desafio muito grande, mas os desafios sempre me moveram.

AG – A Colcci sempre que se envolveu num evento, fez algo gigantesco e os desfiles do SPFW eram os que atraiam a maior parte do público, onde as pessoas disputavam um convite. Como você vê esse novo momento das semanas de moda no Brasil e no mundo?
DM – A semana de moda tem um grande desafio, porque cada vez mais o desejo de ver e comprar é uma realidade e as marcas estão se adaptando a isso. E penso que o que estiver quanto mais inacessível, mais longe do mercado. E o desfile é inacessível porque reúne 600 convidados e por mais que se faça uma versão digital ou transmissão ao vivo, ele não é para todo mundo. As marcas vão ter desafios de se reinventar. É um desafio da mutação da moda e é papel da moda mutar. Penso que a gente passa por um momento de revolução dentro do segmento e as semanas de moda também vão ter que passar por essa mudança, apesar que eu acredito que o conceito é uma necessidade do nosso segmento. Na moda, é preciso inspirar as pessoas.