Dezesseis famílias polonesas foram assentadas no Sixteen Lots

Eles fugiam da miséria no país, que era ocupado pela Prússia, Rússia e Áustria

Dezesseis famílias polonesas foram assentadas no Sixteen Lots

Eles fugiam da miséria no país, que era ocupado pela Prússia, Rússia e Áustria

A bordo do navio Victoria, um veleiro do tipo barca, 16 famílias polonesas sonhavam com as promessas de uma vida nova no Brasil. A embarcação deixou o porto de Hamburgo, na Alemanha, no dia 11 de junho de 1869, chegando ao porto de Itajaí em meados de agosto, após praticamente dois meses de viagem.

O dia 25 de agosto é tido como a data de chegada dos imigrantes polacos, pois foi neste dia que o padre Alberto Gattone realizou o batismo do menino Estevão, filho Maria Kowalska e Thomaz Sieniovski, que havia nascido no navio no dia 3 de julho.

Foto do registro de batismo do menino Estevão, que está no arquivo da Arquidiocese de Florianópolis | Foto: Acervo Celso Deucher

Eram as primeiras 16 famílias etnicamente polonesas que chegaram à Colônia Príncipe Dom Pedro, ou Colônia Águas Claras. Somavam cerca de 80 pessoas originárias da cidade de Siolkowice, na Alta Silésia, que estava sob domínio prussiano, por isso tinha seu nome germanizado: Schalkowitz. Depois, vieram mais famílias.

Os primeiros imigrantes fugiam da grave crise na Europa e tinham como profissão principal o trabalho no campo. Eram pessoas simples, que buscavam um recomeço sem domínio estrangeiro e sem guerras.

Na Polônia, elas trabalhavam na agricultura, em alguns casos como assalariados, pagos por grandes fazendeiros. As terras por lá eram férteis.

Cansados da vida difícil, muitas famílias resolveram pedir autorização ao governo para deixar o país. A Prússia exercia forte domínio sobre os polacos, que tinham de pedir um passe livre para poder emigrar. Muitos o fizeram, assim como outros tantos foram embora ilegalmente.

Ainda em 1869, chegaram à colônia mais 60 colonos poloneses e outras 22 famílias aguardavam no porto de Itajaí.

Sixteen Lots

Os poloneses foram assentados na linha colonial chamada de Sixteen Lots, que, segundo o  escritor Aloisius Carlos Lauth, que é especialista no assunto, ficava na região do ribeirão Cedro Grande, na confluência com o ribeirão Cedro Pequeno. Não é possível determinar exatamente onde seria esse território atualmente.

O nome Sixteen Lots era uma alusão ao número de lotes medidos: 16. Lauth diz que, até hoje, aquela região é montanhosa e pouco propícia à agricultura.

Havia uma estrada que ligava Sixteen Lots à povoação mais próxima, que ficava no bairro Águas Claras, mas a viagem de ida e volta era longa e fatigante para os colonos.

Mapa da linha colonial Sixteen Lots. Crédito: Livro Colonos Ingleses em Águas Claras, 2013. Arquivo Aloisius Lauth

Os camponeses receberam pás, enxadas e foices para abrir clareiras na mata e foram enviados para o campo. Não demorou para que os mesmos problemas da colonização inglesa ocorressem com os poloneses.

A terra não era boa para agricultura por causa do seu relevo, e as promessas feitas quando eles embarcaram não eram cumpridas. O pouco que eles conseguiram plantar foi devastado em uma enchente ainda em 1869.

O desespero tomou conta dos colonos, que foram pedir ajuda na sede da colônia. Uma reconstituição feita pela escritora Maria do Carmo Ramos Krieger, com base em documentos históricos, dá uma amostra de como era a vida naquela época:

“23 de Fevereiro de 1870

Alguns de nós já pensam em desistir, ir embora. Os maridos, principalmente. Mas… Ir para onde? Nosso lugar é aqui.
Há promessas do Governador da Província para os homens conseguirem mais trabalhos nas estradas – frentes que se abrem para dar passagem aos imigrantes, peregrinos em busca de terra e um pouco de paz, em algum lugar do Planeta.
O espírito de luta, fortalecido pelo suor do nosso trabalho diário, às vezes faz esmorecer. É outra, a cultura local; há costumes tão diversos, tanto verde e, dizem, começam a aparecer alguns gentios, primeiros habitantes do lugar. Nossos vizinhos, os imigrantes alemães, já receberam a visita de alguns deles.
Os gentios são arredios para conversar e não hesitam em matar. Notícias dão conta de que um colono foi morto a flechadas. A direção da Colônia avisou para ficarmos atentos aos ataques.
Alguns homens e mulheres procuram disfarçar, porém mostram-se assustados, principalmente por causa das crianças.
Não sei definir direito o que sinto em relação a isso: mistura de vontade de vencer nesta nova terra, com saudades da velha pátria.”

Fusão e fuga

Até esse momento, existiam duas colônias: Dom Pedro e Itajahy. Com os problemas, o governo provincial resolveu fundi-las em uma só, em 6 de dezembro de 1869.

A solução não resultou em melhorias para os colonos poloneses e ingleses. Sem amparo da direção e com problemas com os alemães, que não os aceitavam plenamente, os poloneses acabariam levados por Edmundo Wos Saporski para reemigrar para Curitiba, no Paraná, em 1871.

Fatos históricos

Os primeiros poloneses ficaram por pouco tempo em Brusque, mas deixaram marcas irrefutáveis de sua passagem, antes de emigrarem para Curitiba.

Filha de Felipe Kokot e Isabel Gbur, Isabella Kokot foi a primeira filha de poloneses em Brusque. Ela nasceu em 12 de novembro de 1869 e foi batizada dois dias depois pelo padre Alberto Gattone.

Quem encontrou o registro de nascimento da menina Isabella foi a escritora brusquense Maria do Carmos Ramos Krieger, nos arquivos da Arquidiocese de Florianópolis, já na década de 1980.

Pouco antes dela já havia sido batizado o menino Estevão, na data que é o marco da imigração polonesa. No entanto, diferente de Isabella, ele nasceu no navio, não em Brusque.

O escritor e jornalista Celso Deucher diz que foi a fundo nos arquivos da Arquidiocese de Florianópolis para descobrir o registro de batismo de Estevão.

O historiador Paulo Vendelino Kons narra que, conforme consta no “livro de assentamentos de pessoas falecidas da Colônia”, em 11 de outubro de 1870, ocorreu a primeira morte de um polonês em solo brusquense.

O menino João Otto, filho de Simon Otto e de Rosália Gabriel, foi enterrado no conhecido “cemitério dos polacos”. O mais provável é que o local ficava no atual território do bairro Lageado Baixo, em Botuverá, que na época pertencia a Brusque.

Uma pequena cruz de pedra que estava no túmulo do garoto foi achada anos depois e está exposta no Museu Histórico do Vale do Itajaí-Mirim, mais conhecido como Casa de Brusque.

Segundo Decuher, trata-se do único registro fotográfico onde aparece um dos pioneiros da imigração polonesa para a América Portuguesa, Stefan Kachel. Depois de cerca de dois anos em Brusque, transmigrou para a região de Curitiba, junto com os demais imigrantes | Foto: Acervo Jaime Luiz Schluga

Relação das 16 famílias polacas estabelecidas na Colônia Príncipe Dom Pedro, em agosto de 1869, no Vapor Victoria*

Francisco Pollok
Nicolau Wos
Boaventura Pollok
Thomasz Szymanski
Simon Purkot
Felippe Kokot
Miguel Prudlo
Simon Otto
Domin Stempka
Gaspar Gbur
Balcer Gbur
Walentim Weber
Antonio Kania
Francisco Kania
Andre Pampuch
Josepho Purkott
Julianna Wos/ Julia
Stefan Kachel
Francisco Motzko **

Fonte: Súditos da Rainha: ingleses no Império do Brasil. Aloisius Carlos Lauth, 2017
*Atestado da Secretaria do Governo de Santa Catarina, 25 de julho de 1870. João Granato dos Santos.

**Participa da Lista das famílias polacas segundo requerimento de Saporski, em 12/08/1870 – APEP”


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