Com 100 jogos pelo Brusque, Wallace relata histórias e identificação com o clube
Capitão esteve certo de que o quadricolor se recuperaria no Catarinense, mas afirma que é necessário ter mais consistência
Capitão esteve certo de que o quadricolor se recuperaria no Catarinense, mas afirma que é necessário ter mais consistência
Wallace completou 100 jogos pelo Brusque no último sábado, 2, com uma grande vitória sobre o Marcílio Dias. Zagueiro e capitão desde 2022, o veterano de 36 anos encontrou um lar: gosta da cidade, se identificou com o clube e reencontrou alegria no futebol. No momento em que o time está invicto há cinco jogos, mantém os pés no chão, e nos maus resultados, esteve certo de que o time iria se recuperar.
Continuar no Brusque, para o zagueiro, não é surpresa. É algo que foi uma tendência em suaa carreira, que teve longos períodos em clubes como Vitória, Corinthians e Flamengo, de pelo menos duas temporadas. Até no Goztepe, da Turquia, Wallace jogou de 2018 a 2020.
“Acabo criando vínculos dentro do clube, e em Brusque não foi diferente, principalmente pela forma com a qual fui recebido. Por toda a comunidade, pelos torcedores, pelo staff. Então me senti em casa.”
Mas até que se sentisse em casa de fato, foi necessária uma adaptação. Revelado no Vitória, o zagueiro jamais havia passado por um clube tão pobre em estrutura e patrimônio quanto o Brusque. Em 2022, aos 34 anos, se assustou com a situação do quadricolor. No seu terceiro dia, chegou a ter uma crise de choro.
“Na primeira semana, quando cheguei aqui e fui me reportar ao clube, e me apresentei no estádio, aquilo foi um choque muito grande. Para mim, foi tudo novo. E me recordo muito bem (risos), porque nos dois primeiros dias, fomos treinar no Bandeirante e tomei outro susto (risos). Não imaginava qual era a realidade do futebol brasileiro, que é essa. Às vezes, a gente não tem noção.”
A obrigação de pagar os salários em dia se tornou uma tradição no Brusque, o que foi um atrativo para sua vinda. Mas a expectativa sobre o que encontraria num clube que jogaria o Brasileiro Série B naquele ano foi destroçada logo de cara. Estrutura modesta, estádio alugado e acanhado, treinos em diferentes locais.
Começou um processo de adaptação. Wallace passou vivenciar o Brusque ao máximo. Ia ao treino com o velho ônibus do clube, foi conhecendo seus colegas, e respirando a realidade quadricolor. Eram ares totalmente novos em uma carreira que já tinha mais de 15 anos.
“Foram passando os dias. A gente vai convivendo com funcionários, com atletas, vendo a história de um, de outro. Aquilo foi criando certa motivação, diferente da que eu tinha na minha carreira.”
“É preciso ter a estrutura, importante, porque senão você não vai se manter muito tempo no futebol. Mas se não tiver pessoas que queiram fazer, não adianta ter a melhor estrutura. E o Brusque tem. Não sei se é sorte ou se é muito seletivo, mas nos últimos tempos, vejo [o clube] acertando muito mais do que errando em relação aos seres humanos que trazem. Só talvez tenhamos pegado o caminho inverso na Série B”, explica.
Naquela Série B de 2022, o Brusque foi rebaixado com o pior ataque da era dos pontos corridos: 21 gols em 38 jogos. Wallace afirma que, de forma geral, o time não se entendia e tinha jogadores que não queriam estar no clube.
O ambiente muda para a temporada 2023, e o zagueiro acredita que o entendimento entre os atletas foi fundamental para os resultados obtidos. Mesmo com severas dificuldades financeiras, foi um ano de recuperação: título da Recopa Catarinense, e finalista no estadual e no Brasileiro Série C. No Campeonato Catarinense, somando 2022 e 2023, foram 29 jogos sem perder. Um recorde comprovado no século XXI.
“Já ouvi que os jogadores não têm que se gostar num time. Uma das maiores mentiras do futebol. Discordo em gênero, número e grau. Nunca vi uma equipe, que não se gostasse, vencer. Num exemplo bobo, a Argentina campeã do mundo a gente via isso de os jogadores se gostarem e quererem dar aquele troféu ao Messi.”
“Sou um cara insuportável por ser extremamente exigente. Num país desigual, a gente tem a sorte de fazer o que gosta e receber muito bem por isto. Não consigo aceitar que um jogador de futebol não se dedique ao máximo. (…) Na Série C, eu fazia cobranças extremamente incisivas, duras, e era cobrado também. Digo que, se falo, é porque dou liberdade para que o outro fale, sem nenhum tipo de melindre.”
O início ruim do Brusque no Campeonato Catarinense deste ano não esteve nem perto de preocupar o capitão da equipe. Ele relata que entre funcionários do clube mais próximos a ele, houve um momento de tensão. Mas hipóteses de eliminação na primeira fase ou rebaixamento nem passaram pela cabeça de Wallace.
As mudanças na equipe e as readaptações à forma de jogar são elementos que, para o zagueiro, podem ajudar a explicar os resultados até a sétima rodada. “É algo que demanda tempo. No futebol, são muitos elementos para administrar.”
A atual sequência de cinco jogos sem derrota não são motivo de euforia. “Ainda temos que melhorar muito. Precisamos ser um time muito mais consistente.” E Wallace acredita que, com exceção das derrotas sofridas para Nação e Inter de Lages, não há diferenças consideráveis entre os níveis de atuação no início do Catarinense e os que têm sido vistos nas últimas partidas.
“Essa evolução de que está se falando… Estávamos jogando exatamente do mesmo jeito. Talvez esteja havendo uma sinergia maior entre quem estava aqui e quem chegou, e isto leva tempo.”
“Não é nada que não tivesse nos jogos passados. Sinceramente, é o resultado. No futebol, temos que ser sinceros: se você não ganha, não vale de nada. Por mais que tenha criado mais, com mais posse de bola, boas triangulações, que tenha chegado mais ao gol adversário e que o adversário nem tenha chutado ao gol.”
O gosto pela cidade, aliada à sua tendência de não migrar com frequência de um clube para outro, fez com que Wallace renovasse seu contrato com o Brusque em duas ocasiões. Em 2023, aceitou uma redução salarial.
“Quando a gente foi rebaixado, eu tive algumas propostas, tinha feito uma boa Série B. Mas meu filho gostou muito daqui, e eu gostei muito daqui. E não sou um cara que gosta de ficar rodando muito. Gosto de ter um trabalho longevo, me relacionar com as pessoas, mesmo sendo um cara um pouco rústico (risos), e Brusque me trouxe isso novamente.”
“O Brusque me reavivou um pouco da infância, de voltar a jogar futebol com mais alegria. Sempre fui um cara muito sério, sempre joguei de forma muito séria, mas às vezes não desfrutava tanto do jogo como tenho desfrutado nestes últimos anos.”
No quadricolor, Wallace revisita sentimentos da infância, do prazer em jogar futebol. Afirma que era algo que se perdia na rotina de uma longa carreira, e que é grato ao Brusque por este sentimento. Após o acesso de volta à Série B, o capitão firma novo compromisso com o quadricolor. “Renovei mais uma vez, muito pensando na questão de estar em um clube que eu gosto.”
Confira as informações do Bruscão
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