E que obrigar nossos filhos a comer certos tipos de alimento ou determinada quantidade alimentar (restringindo ou forçando a comer), para atender às nossas expectativas é uma visão simplista sobre mudança de hábitos. E, além de não ser saudável, pode criar efeito oposto ao desejado?
Por exemplo: A criança obesa ou com sobrepeso, que se sente “proibida” de comer, tende a comer cada vez mais e pode desenvolver uma relação inadequada com a comida e com o comer, comendo escondido ou até mesmo desenvolvendo compulsão alimentar. Já a criança considerada “a que não come” costuma se sentir forçada a comer, e passa a querer se afastar da comida, por ser a comida e o momento de comer, verdadeiras fontes de estresse para essa criança.
Precisamos ir além do alimento! Precisamos repensar o contexto no qual essa criança está inserida. Precisamos de um plano estratégico com objetivos claros, realista, aplicável, muito bem montado e muito bem dirigido.
Os principais determinantes do comportamento alimentar da criança são:
– A família;
– O contexto social em que a criança está inserida;
– As estratégias que os pais utilizam.
Esses aspectos dizem respeito ao exemplo/modelo que os adultos representam. O ambiente, diz respeito aos alimentos e oportunidades a que a criança está exposta. E as estratégias dizem respeito a construção das sensações e emoções que a criança apresenta em relação aos alimentos e ao ato de comer.
Somos nós, pais/adultos, que damos o exemplo enquanto família, construímos o ambiente e desenvolvemos as estratégias para lidar com a criança diante da alimentação, resultando nas escolhas alimentares, no tempo e no intervalo para comer, estabelecendo regras e normas da alimentação desde a introdução alimentar.
Posso afirmar hoje, que grande parte das dificuldades alimentares da infância, foram construídas através da soma de ambiente inadequado, estratégias equivocadas e relações interpessoais de conflito. Esse conjunto gerou uma relação desajustada da criança com a comida e com o comer. Isso normalmente costuma se arrastar ano após ano, sendo reforçada e consolidada negativamente. Até mesmo, casos de condições orgânicas (doença) da criança costumam ser pioradas por essas questões, até chegar ao ponto em que identificar causa ou consequência se torna um verdadeiro desafio.
O primeiro passo é compreendermos que nosso papel como cuidadores, não é “fazer a criança comer”, mas gerar oportunidades à criança de se familiarizar com uma alimentação equilibrada, construindo boas experiências e boa relação com a comida. Nosso papel principal diz respeito “aos bastidores” da alimentação. Pais costumam dizer que pararam de oferecer, porque a criança não come. Porém deveríamos compreender que, na verdade, a criança não come, porque paramos de oferecer e gerar oportunidades. Afinal, como ela irá comer se não oferecermos?!
Precisamos compreender que o objetivo da educação alimentar, é dar oportunidade aos nossos filhos de aprenderem a lidar com o mundo alimentar ao qual estamos expostos hoje e não evitar a todo custo que coloquem um salgadinho, um brigadeiro ou um refrigerante na boca, ou que comam brócolis, beterraba ou raspem o prato.
Portanto o comportamento alimentar da criança, não seria apenas a ponta do iceberg? Ou toda a parte que fica debaixo d’água: nossa própria relação com a comida e com o comer, nossa desorganização, falta de conhecimento, de planejamento, de tempo ou de sermos modelo seriam as verdadeiras causas?
Repensar nossa alimentação e nossa relação com a comida não seria o primeiro passo, para modificarmos/ajustarmos o comportamento alimentar das nossas crianças?
Nossas expectativas (que são muitas e gigantescas) sobre a alimentação das crianças simplesmente perdem o sentido, quando analisamos a alimentação do ponto de vista de um processo pedagógico, como aprender a ler e escrever por exemplo. Um aprendizado que requer conhecimento, condução adequada e respeito às necessidades e habilidades de cada fase de vida da criança para que a evolução aconteça.
Janaina Kühn Barni – nutricionista