Recentemente, um caso entre aluna e professora, integrantes do programa de Mestrado em História da Udesc, chamou a atenção da imprensa do estado e apimentou a discussão sobre poder, preconceito, relação aluno e professor. As duas divergem sobre o movimento feminista. A Professora atua nas linhas de pesquisa de relações de gênero, mulheres e história; e, a aluna entrou no programa de mestrado em história, para pesquisar, também, sobre questões de gênero e o feminismo. Aliás, para ser aceito em um programa de mestrado é preciso que o aluno tenha um projeto de pesquisa cujo tema o professor orientador tenha domínio. Porém, a relação entre as pesquisadoras passou a gerar desconfortos quando as mesmas começaram a se posicionar conforme suas crenças ideológicas e religiosas. A professora, defensora dos movimentos  feministas, e a aluna se declarando cristã e antifeminista.

O caso foi levado às estâncias judiciais, em que a aluna processa a professora alegando perseguição ideológica. Há reportagens e vídeo da aluna na TV Câmara, disponível no Youtube, em que conta sua parte da história. Várias entidades que representam o ensino Superior defendem a posição da Professora. O movimento Escola sem Partido entrou em defesa da aluna.

Em tempos dualistas, há quem argumente em favor da professora e há quem defenda a aluna. Sempre há um lado que se diz certo e acusa o outro de estar errado. E ainda, os lados que vivem à margem da discussão e se aproveitam para achar um espaço para tomar força.

Nas redes sociais, cheia de juízes, achismos e opiniões, as discussões fervem. Mas, como sempre, não há diálogo. Agressões verbais, morais, e falta de sensibilidade norteiam os debates. É a era da pós-verdade, criando inseguranças, incertezas, e preguiça de pensamento crítico.

Mas, voltando ao caso, há grupos que defendem que professores devem estar isentos de opiniões ao ensinar determinado assunto. E, por outro lado, há uma linha de pesquisa, chamada reflexiva, defendida por muitos pesquisadores da área de humanas, dentre eles Anna Campo e Isabel da Costa, que afirmam que os tempos de observância distanciada e rigorosa aos procedimentos se foram. Acreditava-se, em outro período da ciência, que fosse possível se descolar de seus valores para se ater somente aos métodos. Hoje, no campo da ciência humana e áreas afins, reconhece-se que o que fazemos e o que somos caminham juntos. Wright Mills acredita que  os pensadores mais admiráveis dentro da comunidade intelectual, não separam seu trabalho de suas vidas.

Então, ficam as reflexões: é possível ensinar, orientar projetos de pesquisa, atendo-se ao um conteúdo escrito em um livro? Ainda assim, ao escolher determinado autor, estaria seguindo a linha de pensamento de um referido escritor. Como se manter isento de opiniões, crenças e valores, ao explicar a história,  ou uma teoria?

E, por fim, como uma professora, pesquisadora de gênero, da mulher e movimentos feministas, poderia orientar uma aluna em uma pesquisa, ao descobrir que a aluna é antifeminista?

Como diria Leandro Karnal, “sou de um tempo em que o professor tinha sempre razão, e agora que sou professor, o aluno é quem tem sempre razão”. Será que vamos chegar a um tempo em que ambos consigam exercitar o diálogo verdadeiro, de construção do saber?

 

Clicia Helena Zimmermann – professora, consultora e especialista em mapeamento de ciclos