No Brasil e no mundo, milhões de pessoas usam o medicamento Metformina (nome comercial de Glifage) para o tratamento da Diabetes Mellitus, principalmente da Diabetes tipo 2. É também o único medicamento recomendado pela Associação Americana de Diabetes para o tratamento da pré-diabetes.

A metformina foi isolada pela primeira vez em 1922 por uma dupla de químicos irlandeses, Werner e Bell, a partir de uma planta chamada lilás francês. Sendo a diabetes uma doença crônica, os pacientes usam este medicamento durante muitos anos, por isso é frequente que estejam preocupados com os efeitos colaterais a longo prazo que a metformina possa provocar.

Tentaremos esclarecer estas dúvidas e comentar sobre novos possíveis efeitos terapêuticos desta conhecida droga. Trata-se de um medicamento antigo, cuja versão sintética é utilizada clinicamente desde 1959. Foi aprovada para seu uso na Europa somente na década de 80 e nos Estados Unidos após 1994. Faz parte da lista de medicamentos do programa “Farmácia Popular” do governo federal.

É o antidiabético por via oral mais usado no mundo, seja de forma individual ou mais frequentemente em associação com outros medicamentos para o controle da diabetes. É também um medicamento barato, raridade nos tempos atuais. Um dos motivos do seu baixo custo é que nunca foi patenteado.

Sabemos que não existe medicamento 100% seguro, a metformina pode provocar efeitos colaterais e reações alérgicas que acontecem principalmente nas primeiras semanas de uso. Os efeitos colaterais mais frequentes são náuseas, vômitos, diarreia ou constipação intestinal e flatulência, que geralmente vão diminuindo em poucas semanas. Não deve ser usado por pacientes que costumam ingerir bebidas alcoólicas, que têm disfunção renal, grávidas e mulheres lactantes.

É um fármaco que tem mostrado sua eficácia e segurança ao longo do tempo, tanto assim que hoje existe também em associação com antidiabéticos mais modernos. O principal mecanismo de ação da metformina acontece pela ativação de uma enzima (AMP protein kinase) que é importante na regulação do metabolismo celular, a proteção celular e a sobrevivência das células.

A metformina diminui a produção de glicose pelo fígado, esse processo chamado de gliconeogênese é parcialmente bloqueado pelo fármaco. Ao mesmo tempo, atua a nível muscular aumentando o consumo de glicose pela musculatura e, portanto, diminuindo os níveis de glicose no sangue.

Uma das vantagens da metformina é que não provoca hipoglicemia, quer dizer que não diminui a glicemia abaixo dos valores normais. A hipoglicemia é uma complicação que pode provocar até perda de consciência e, em caso de não ser revertida rapidamente, pode deixar sérias sequelas cerebrais ou levar ao óbito.

Sempre que fazemos uso de um medicamento é importante conhecer os potenciais efeitos colaterais, dessa forma podemos identificar os mesmos mais rapidamente e tomar medidas para controlá-los. Quando se trata de uso crônico ou prolongado, como acontece com os usuários de metformina, esse conhecimento tem ainda mais valor.

Além de ter se mostrado um medicamento de uso seguro, nos últimos tempos tem aparecido algumas evidências de que a metformina pode ter alguns outros efeitos benéficos para os usuários. Estudos em animais têm mostrado que a metformina inibe o desenvolvimento de aterosclerose, reduz o tamanho do infarto cardíaco, melhora a função do endotélio (parede interna dos vasos sanguíneos) e tem atividade contra arritmias cardíacas, mesmo em ratos sem diabetes.

O pesquisador Gregory Schwartz da Universidade de Colorado-EUA comanda um estudo clínico randomizado com mais de 7000 pacientes com pré-diabetes para confirmar estes benefícios em humanos. Os dados estarão disponíveis no mês de março de 2029. Sim, conhecimento científico demora para ser produzido.

Outra novidade é que estudos retrospectivos (analisam dados de pacientes tratados anteriormente) têm mostrado que a metformina poderia prevenir o câncer de pulmão em pessoas com sobrepeso ou obesidade. Em pessoas com obesidade, há um aumento da incidência de câncer de pulmão devido a uma supressão do sistema imune pulmonar. Parece ser que esse efeito pode ser revertido pela metformina.

O Dr. Sai Yendamuri de Buffalo, New York, está realizando um estudo clínico de fase 2 e seus resultados vão ficar prontos em 2025. Outros grupos estudam este efeito protetivo também em relação ao câncer de endométrio e neoplasias cerebrais.

Já o Dr. José Luchsinger, da Universidade de Columbia, lidera um estudo com 326 pacientes que procura conhecer a eficácia da metformina na prevenção da Doença de Alzheimer. Neste caso, a hipótese é que melhorando os níveis de insulina e de glicemia possamos diminuir os riscos de desenvolver este tipo de demência. Os resultados devem estar prontos em 2026.

Finalmente, há vários estudos de fase 3 em curso para confirmar ou não a eficácia da metformina para diminuir as complicações e a mortalidade por Covid-19, alguns estudos mostram que pode exercer também um efeito protetor contra o Covid prolongado.

Enquanto não temos a confirmação destas pesquisas em andamento, a metformina deve ser usada apenas para o tratamento da diabetes e de forma “off label” (sem indicação de bula) em algumas patologias como, por exemplo, a Síndrome do Ovário Policístico.

Um comentário adicional, embora afastado da temática deste artigo: no dia 23 de abril, comemoramos o Dia Internacional do Livro, esse invento fantástico que faz tanto para nosso crescimento pessoal e para nossa saúde mental. Infelizmente, não houve maior repercussão ou celebração; em vez disso, vimos agentes públicos jogando livros no lixo. Fomentar a leitura em crianças e jovens é imprescindível se não queremos deixar morrer este hábito tão prazeroso e compensador.