“…todos os dias quando acordo, não tenho mais o tempo que passou… nosso suor sagrado é bem mais belo que esse sangue amargo e tão sério… somos tão jovens. Tão jovens. Tão jovens…”

Na voz dos amigos e familiares, estes foram os últimos versos cantados em homenagem e despedida do pai, do filho, do primo, do sobrinho, do amigo…  Aquele mesmo rapaz, de sorriso esgaçado, que ao ouvir esta música se emocionava. Ele com certeza já havia tido o maior aprendizado da vida: “temos nosso próprio tempo”.

Embora saibamos que a morte é a única certeza da vida, nunca estamos preparados para perder quem amamos. Ainda mais quando a ordem natural se altera, e um pai e uma mãe velam seu filho.

Como nos diria Baudelaire: “aos olhos da saudade como o mundo é pequeno”.

Um senhor seguia dizendo “se mudarmos o questionamento do Porquê para o Para quê, do Porquê da fatalidade da perda para o Para quê esta pessoa veio ao mundo. Nossa memória nos leva e nos conforta diante de tantos momentos passados juntos, de tantas felicidades, que jamais caberiam no signo único da partida”.

 

A morte nos faz pensar sobre a vida!

Digerir a perda é fato moroso, sofrível. Necessitado de esforço, entendimento, amor e tempo.  É preciso compreender, respeitar e se ter bom senso, diante do luto, das carências da própria humanidade, das fragilidades humanas, da vida, da morte.

 

E, infelizmente não é o que ocorre na cidade de Brusque. A ausência de médico legista, a falta de estrutura do IML, deixam os mais necessitados diante da própria complexidade dos fatos e dos seus sentimentos ao “deus dará”. Em uma espera ansiosa, indigesta.

mais de treze horas…

Famílias velam o seu ente querido, sem corpo presente. Velam a sua própria impotência. Em pensamento ela aninha o jovem. A noite vaga acordada, em meio ao desespero, à dor, a incompreensão e a impossibilidade dele estar, em meio a sua gente. A tristeza além da tristeza.

 

Porquê? Para que?

descaso, descaso, descaso

 

 

além da dor, é hora de nos manifestarmos:

qual será a próxima família a sofrer do mesmo mal?

a sua?

 

lembremo-nos:

todos temos o nosso próprio tempo!

 

 

Méroli Habitzreuter – escritora, pintora e ativista cultural

 

 

ilustração: A persistência da memória, Salvador Dali (1931)