Sempre gostei da palavra equinócio. Ela tem uma sonoridade, uma certeza em sua pronúncia. Só dize-la me parece conter um mundo e uma possibilidade. Em sua definição mais comum seria o momento em que a força do dia e da noite tornam-se iguais, renovando o ciclo de nascimento e ressurreição. Como sempre gostei de brincar com as palavras e movê-las para instâncias nem sempre associadas, resolvo aqui trazer essa palavra para nosso encontro conosco mesmos.
Algo urge nesses dias de individualismo exacerbado. Me parece paradoxal que tal individualismo nos distancie de nossa individualidade. Vivemos em um mundo que a privacidade deixou de ser importante e é constantemente invadida, infelizmente com nossa permissão. Estampamos nossas faces e nossas vidas em redes sociais como troféus. Mas, no final das contas, perdemos o contato com elas. Já não sabemos qual retrato nos representa, e entre identidades construídas a mercê de modismos, acabamos por diagramar seres rotulados, mas não vividos. Também nosso cotidiano, refém de mandatos coletivos, se afasta de nós, pois queremos pertencer…não sabemos a que, mas pertencer para ser.
Proponho então que pratiquemos equinócios. Que possamos equalizar nosso dentro com o nosso fora. A gente não precisa de espelho para corresponder a expectativas, basta um silêncio povoado de sóis interiores. Seu calor e brilho pode espelhar sem reflexos indesejáveis um ser único e indivisível, pois não fragmentado por um fora alheio e imposto. Podemos sim recomeçar, desenterrar do longo inverno a mercê de aparências, as sementes de um possível solstício (em astronomia é a época do ano em que o sol incide com maior intensidade em um dos hemisférios). E então, podemos por luz onde a escuridão instalou-se.
Penso que é preciso um equinócio para que nos fique claro a medida das coisas. Até que ponto estamos dando uma ênfase exacerbada para o que esperam de nós, e uma menor, por vezes muito rasa, para aquilo que somos e podemos ser. Eu proponho individualidade e não individualismo, pois um ser inteiro, poderoso em sua essência, jamais será individualista. Um ser essencial promoverá equinócios e igualdades porque não se recente do que não é. Um ser que faz brilhar seu potencial, sem vergonha de ser o que é, promove no outro o mesmo status, e juntos ou separados, podem criar um ciclo de crescimento e renovação.
Eu proponho que não tenhamos medo dos invernos. São eles, com sua pausa e escuridão que podem nos fazer restaurar a concentração. No inverno somos menos distraídos pelas coisas de fora, e obrigados a interiorização, é mais fácil (nem tanto…) encontrar aquele alguém que conhecíamos muito, mas que de algum modo perdemos de vista: nós mesmos.
Silvia Teske – artista