A data de 11 de fevereiro de 2017 assinala marco singular para Brusque, para a arquidiocese de Florianópolis, nosso Regional Sul IV, para a Igreja do Brasil, e porque não dizer – com humildade, para a Igreja Universal: a fundação do Seminário Menor Metropolitano da Arquidiocese de Florianópolis. Iniciado na capital de Santa Catarina, foi transferido para o prédio do Hospital Azambuja, em Brusque, em abril do mesmo ano. Voltar à memória desta longeva instituição, nos faz refletir sobre sua benfazeja atuação nesses 90 anos. Queremos enaltecer as maravilhas que Deus fez em centenas de pessoas – especialmente seminaristas – nessas décadas. Outro aspecto é a gratidão, ainda mais porque nos encontramos na função de formar os seminaristas no momento de impar ensejo comemorativo.
Nosso artigo visa primeiramente voltar à reflexão sobre o Vale de Azambuja, local humilde escolhido pela providência Divina, e labutado pelas pessoas para com suor e sangue, iniciar – e continuar – uma englobante obra: caritativa, hospitalar, cultural, educacional, catequética, espiritual, e de formação presbiteral. Não foi fruto do acaso a escolha de Azambuja – local meio inóspito; até o nome não soava bem – e instituir aqui a obra mais cara de um povo, de uma diocese. Uma obra de humana que deu certo, porque assistida pelo amor de Deus, pulsante em cada vida humana que de alguma forma deu seu contributo à Azambuja.
Azambuja: a gênese
Há pouco mais de 100 anos o vale de Azambuja era um lugar fechado, pantanoso e até insalubre para qualquer tipo de povoação que aí viesse a se desenvolver. Brusque teve colonização esparsa, porém contínua desde 1860 quando da chegada primeira leva. Os imigrantes alemães, também outras nacionalidades, que aqui se estabeleceram foram buscando terras onde havia mais planícies constituindo um núcleo citadino.
A partir de 1875, começam a chegar famílias de diversas regiões da Itália, e na iminência de estabelecimento, se assentaram nas localidades adjacentes da já constituída vila de Brusque. As ocupações, além do desenvolvimento comunitário, tinham a preocupação da defesa contra os ataques dos indígenas.
As linhas foram recebendo seus nomes oficiais e extraoficiais. Lotes foram demarcados, florestas devastadas. Dá-se início da agricultura, e, logo, a pecuária. A 3 quilômetros da sede, num estreito vale surgem alguns assentamentos. O local denominado inicialmente de Caminho do Meio, mas sem demora, de boca em boca, ressoa Azambuja – presume-se pela influência do diretor do departamento de terra Bernardo Augusto Nascentes Azambuja.
Primeiramente são citados os nomes de: Jacob Knihs e José Cipriani. Das benfeitorias edificadas por eles surgiu um pequeno núcleo. Logo, mais um grupo de nove agricultores vem ampliar a comunidade. Eram as famílias de Pietro Colzani, Girolamo Tomasini, Angelo Colzani, Paolo Benaglio, Angelo Bosco, Francesco Leoni, Carlo Franciosi, Dalmazio Paoli e Antônio Vanolli. Eram famílias vindas de Treviglio, perto de Milão em 22 de outubro de 1875, embarcadas rumo a América no porto de La Havre, na França.
A virgem de devoção da comunidade logo assume também a denominação do local. Passa a ser venerada como Nossa Senhora de Azambuja
Outros, do mesmo grupo, seguiram para outras localidades. O acesso à Azambuja, até o início do séc. XX, era uma picada margeando o riacho que corria vale afora até o rio Itajaí-Mirim. Posteriormente foi construída uma estrada para atender o transporte de material para o novo hospital, hoje museu arquidiocesano.
Em 1876 já se pensava em construir uma igreja. No centro natural da linha, uma bela fonte parece indicar o local da igreja, mas, ainda não. A fonte de água é coberta e vira um oratório. Três motivos impediram a construção da igreja: as poucas famílias, a proximidade com a igreja de Brusque, e a igreja doméstica que aconteceu solidamente nas casas. Para tudo há um tempo, segundo o livro bíblico do Eclesiastes.
Os tempos mudam, as coisas amadurecem trazendo seus frutos. No final de 1884, o plano se concretiza. Os residentes se unem em torno deste anseio. Com muita simplicidade, poucos recursos à ermidinha é construída. Fé, suor e amor fraterno, tripé da vida eclesial. Na capela construída é entronizado o quadro da padroeira, Nossa Senhora do Caravaggio. Em 26 de maio de 1885, podem celebrar sua Madonna na capela, mesmo com a igrejinha ainda inacabada. O nome da padroeira não era tão fácil de ser pronunciado, principalmente pelos descendentes de alemães. A virgem de devoção da comunidade logo assume também a denominação do local. Passa a ser venerada como Nossa Senhora de Azambuja. Então nossa padroeira foi “naturalizada e rebatizada” com o nome da localidade, recordando que a Mãe de Deus tem muitos nomes, sendo invocada pelo objetivo da prece. Este Deus vindo a nós de modo humano, teve uma mãe, Maria, a Mãe de todos nós.
A devoção foi crescendo… A gente de Brusque visitava a simpática igrejinha. Em 1892, nova igreja foi erguida, um pouco mais acima, exatamente na parte interna do atual santuário. Era pároco o zeloso padre Antônio Eising, um sacerdote que por inspiração divina e caridade definiria novos rumos que mudariam a localidade para sempre. A ermida primitiva continuou por dois anos servindo de igreja, e, depois que a nova igreja foi concluída em 1894, ficou servindo de oratório inclusive para acolher os muitos ex-votos deixados pelos devotos. Com a nova igreja, os participantes puderam ser melhor acolhidos e muito cresceu a afluência ao local.
A comemoração de 26 de maio, dia das aparições de Nossa Senhora a Gianetta passou a ser a data culminante das peregrinações e se torna sempre mais uma referência em toda Brusque, nasce um centro de peregrinação e de referência para expressão da fé. A localidade torna-se atração turística e local de lazer, determinando o afluxo de pessoas para Azambuja.
Padre Eising logo direciona essas rendas para a concretização de um plano acalentado, uma Santa Casa de Misericórdia! O pároco sentia diariamente as necessidades de seus paroquianos carentes de recursos médicos
As esmolas da igrejinha revelam-se cada vez mais pródigas. Padre Eising logo direciona essas rendas para a concretização de um plano acalentado, uma Santa Casa de Misericórdia! O pároco sentia diariamente as necessidades de seus paroquianos carentes de recursos médicos. Foi providencial sua iniciativa. Empenhar os recursos próprios da capela de Azambuja, e disponibilizar uma obra assistencial a todos os paroquianos. Inclusive os proventos do pároco e de seu coadjutor, padre José Sundrup, para que a obra avance sob o olhar maternal da padroeira da capela e guiada pela Providência Divina, atuante pela história humana.
A solenidade da Assunção de Nossa Senhora é de toda Igreja. Todas as comunidades da Igreja Católica celebravam liturgicamente essa festa. Mas, em Azambuja, a comunidade começou a celebrá-la com festejos externos. Assim, vai se caracterizando como sendo a festa da padroeira. No início, a festa de 15 de agosto era pequena se comparada a da padroeira, 26 de maio. Nesse tempo já estava estabelecido o hospital do padre Eising. Casas de saúde são naturalmente locais de sensibilidade humana. Se a igrejinha possibilitou a Santa Casa, a Santa Casa depois promoveu o Santuário. Romarias se constituem para ambas festas, e com o passar das décadas, tendo em vista 15 de agosto ser festa de guarda (feriado). E porque em maio eram constantes as chuvas e a de agosto que vai tomando grandes proporções, tornando-se a festa principal do Vale. Podemos de certa forma afirmar: em maio se celebra Nossa Senhora do Caravaggio e, em agosto, Nossa Senhora de Azambuja.
Azambuja começou a ser um local religioso atraente. Não por coisas mirabolantes, extraordinárias, maravilhosas aos olhos, mas por uma força irradiadora inexplicável, sem aparências externas. Singela como a gruta de Belém. A Igreja garantiu lotes de terra nas adjacências para expandir, sem maiores dificuldades, a obra.
A obra de Azambuja, que Padre Eising havia plantado, pôde florescer com o dinamismo do Padre Sundrup, homem dotado de tino administrativo, vontade de empreender e magnânimo pastor. Incluía igreja, hospital, asilo, hospício e escola catequética. Casas e benfeitorias anteriormente edificadas ou mesmo deixadas pelos antigos moradores dos lotes adquiridos pela Igreja, são partes importantes para abrigara obra. Mas não havia em Brusque pessoas preparadas e poucas predispostas para trabalhar nesse seguimento, muito menos especializadas em enfermagem.
Os padres recorreram a sua terra natal, a Alemanha, para conseguir o arrimo necessário. Então, na festa dos apóstolos Pedro e Paulo – 29 de junho de 1902, chegam precedidas do diretor da Congregação, Pe. Vicente Wienken as três pioneiras Irmãs da Divina Providência, da Alemanha. Godeharda Kreyemborg – (no Brasil desde 07/11/1897), Bárnaba Schäpermeier, (no Brasil desde 30/06/1898) e Friedburga Nothen, (no Brasil desde 08/061902). A primeira casa-convento foi uma velha residência enxaimel adquirida junto com o terreno.
A obra, mesmo carente de recursos, deslancha. Não há entraves que a fazem parar. Os obstáculos são removidos com a boa vontade. No mês de setembro do mesmo ano da inauguração, a casa estava lotada, logo a necessidade de aumentar ou construir outra edificação. A ideia vai tomando força. Para este fim o padre Sundrup, passou a residir em Azambuja. Com a transferência do Padre Eising de Brusque, o bispo diocesano de Curitiba entrega a administração da paróquia aos padres da Congregação do Sagrado Coração de Jesus. Os assim conhecidos dehonianos recebem todas as recomendações do Cura fundador, que partiu, mas, deixa seu coadjutor para inserir os novos padres em todas as frentes de trabalho.
Em 4 de outubro de 1904, o padre Jacó Gabriel Lux – SCJ – foi nomeado Vigário da paróquia de São Luiz Gonzaga em Brusque. Com a elevação da capela de Azambuja a Santuário Episcopal, em 1 de setembro de 1905, o padre Sundrup, pode partir com dor no coração, mas, com a convicção do dever cumprido, e o padre Lux é transferido para Azambuja, assumindo a importante missão de Fabriqueiro-administrador do recém criado Santuário Nossa Senhora de Azambuja.
Padre Lux inicia um novo prédio, obra arrojada, a tijolinhos à vista de muito bom gosto e funcional. Padre Lux é recordado como arquiteto e construtor. O prédio do Padre Lux, iniciado em 1905, foi finalizado pelos diocesanos em 1930, sob a direção do Padre Antônio Kondlick. Em 1909, é chegada a hora de dar independência ao hospício, em uma construção grande e adaptada, para que em 1911 pudessem ser acolhidos mais doentes mentais em espaço adaptado e próprio. Em 1911, foi a vez do asilo ganhar prédio, separado do hospital.
Localizava-se a 20 metros atrás do museu, onde havia sido edificado a primeira construção da Santa Casa.
O hospício estava construído onde hoje está uma parte do seminário. Fim de uma importante fase: Padre Lux foi transferido de Azambuja para a Paróquia de Vargem do Cedro, em 22 de setembro de 1919. Com a despedida do padre Lux, Azambuja é administrada por membros da mesma congregação, a dos padres do Sagrado Coração de Jesus, mas com residência na paróquia, o que arrefeceu o dinamismo das obras. A têmpera do padre Lux fez falta. No ano de 1927, novamente um padre residente, desta vez diocesano, os trabalhos seguem com novo ritmo.
Com a construção da nova e atual gruta dos peregrinos em 1928, ela recebeu a imagem de Nossa Senhora de Lourdes, por ser a padroeira do seminário recém fundado. O título Azambuja também lhe foi incorporado. O povo não se preocupava muito com os títulos, de Caravaggio – a imagem do santuário; de Lourdes, da gruta. Aqui todas rebatizadas de Nossa Senhora de Azambuja. A gruta e sua fonte são muito significativas para o povo. Além de beberem e levarem a água para casa, acendem piedosamente suas velas e cultivam o belo gesto de trazer flores à Nossa Senhora.
Quem move as coisas em Azambuja é o próprio Deus! Essa certeza é de capital importância para compreendermos Azambuja, iniciada por pessoas de fé, e por elas levada adiante com abnegação e devoção.