O maior polo têxtil do país fica em Brusque. O setor que emprega mais de 17 mil pessoas no município produziu quase R$ 1,9 bilhão em riquezas no ano passado, de acordo com levantamento da prefeitura.
De micro a grandes empresas, Brusque soma mais de 3 mil negócios no setor, que começou a ser fomentado pelas três grandes indústrias do passado da cidade, Renaux, Schlösser e Buettner.
Santa Catarina, aliás, tem destaque mundial no setor. De acordo com o Atlas da Competitividade, publicado pela Fiesc, o estado possui produtividade três vezes maior do que o segundo produtor mundial do segmento.
Diferentes faces
Dentre essas mais de 3 mil empresas de fabricação de produtos têxteis e confecção de artigos de vestuário está a Florisa, maior tinturaria da América, que fica no bairro São Pedro. Em junho, bateu recorde de produção em seus quase 50 anos de existência, com 4 mil toneladas de malha pronta.
A empresa tem quase 500 funcionários e atua no tingimento das malhas de seus clientes. “Somos a extensão do nosso cliente, temos que nos adaptar a eles”, explica Kelly Imhof, uma das proprietárias. A Florisa hoje atende o Brasil inteiro, mas não tem representantes comerciais.
Com mais de quatro décadas no mercado, a Atlântica é outra empresa que atende o Brasil inteiro. O foco é a produção de moda casa, principalmente felpudos, como toalhas.
A Atlântica, que fica no bairro Rio Branco, produz 250 toneladas por mês e tem 194 funcionários na tecelagem, somando mais de 490 no total, incluindo 140 detentos que trabalham na produção dentro dos presídios.
“Da mesma forma que Brusque se dividiu em várias categorias, não colocamos todos os ovos na mesma cesta. Fatiamos nossa produção para que, em uma dificuldade, tenhamos mais caminhos para seguir”, explica Susy Ogliari, presidente da Atlântica.
A quase centenária RenauxView, que fica no Centro, é outra empresa forte do setor têxtil de Brusque. A empresa de 97 anos e 700 colaboradores produz 1 milhão de metros mensais de tecidos planos voltados para moda, produção de camisaria e vestimentas femininas, e atende confecções do país inteiro, de marcas importantes como Hering, Le Lis Blanc, Reserva, Fábrica e Dudalina.
“Nosso principal diferencial está principalmente no desenvolvimento de produtos. Trabalhamos com coleções desenvolvidas pelos nossos designers e desenhos exclusivos. Os clientes vêm para cá, briefam mais ou menos o que eles querem e desenvolvem com a gente”, explica Marta Castelli, gestora administrativa.
A empresa nasceu em 1925, como uma “filha” da Fábrica de Tecidos Carlos Renaux, com o objetivo de fazer tecidos para decoração, como almofadas e cortinas. Tempo depois, focou em tecidos de vestuário, como sarja, e seguiu assim algum tempo até 2005 .
Todas essas empresas representam um setor que, embora pareça um só, possui diversas áreas, que contribuem umas com as outras para manter a cadeia produtiva em estabilidade.
Passando por cima das barreiras
As empresas têxteis sofreram um baque com a pandemia, superado com muito trabalho. Susy conta que, quando a Covid-19 apareceu, a Atlântica celebrava o resultado de 2019 e, de um dia para o outro, teve que enfrentar grandes desafios.
“Vivemos alguns anos em um só, foi surreal. Tivemos uma inadimplência muito grande, que chegou a 50%, mas tivemos uma perda muito pequena. Pelo dinheiro injetado pelo governo, as empresas honraram seus compromissos. Usamos todas as medidas para não demitir ninguém”, diz.
Inicialmente, a empresa decidiu paralisar algumas células, sempre tentando prezar pelos empregos. Na parte administrativa, financeira e comercial, a Atlântica teve a missão de escolher onde colocar o dinheiro, que era pouco.
“Vimos a parte de hotelaria parada, mas a hospitalar precisando. Os representantes, por telefone, focaram em supermercados, que era o que estava aberto, e sempre fomos especialistas nisso. Todo o nosso quadro que ficou trabalhando foi se dedicando para esses canais. Foi tudo tão rápido. No mesmo ano, no mês de julho, já não tínhamos mais estoque. O segundo grupo que estava em suspensão nem chegou a ficar todo o período previsto”, afirma Suzy.
“Algumas decisões, talvez, foram precipitadas. Paramos o terceiro turno da empresa, tivemos uma diminuição no quadro. Mas depois tivemos que investir em máquinas em julho – projeto que já tínhamos antes pela dificuldade em conseguir mão de obra -, e, no fim do ano, já estávamos recebendo-as e adequando a produção. Tivemos um primeiro semestre muito difícil, mas o segundo já foi de muito otimismo”.
No caso da RenauxView, quando foi necessário fechar a fábrica, de forma repentina, o sentimento foi desesperador, conta Marta. Por 15 dias, nada foi produzido e o faturamento foi quase a zero. “Tínhamos uma carteira de R$ 12 milhões para faturar e nosso faturamento, em abril de 2020, foi de R$ 2 milhões, que é irrelevante para a empresa”.
Aos poucos, a produção da fábrica foi retomada, mas, de acordo com Marta, 2020 foi um ano dramático em questão de faturamento. “Conseguimos, graças às medidas do governo, reduzir custos e não demitimos ninguém. O nosso maior marco na pandemia foi passar por aquilo sem fazer nenhuma demissão”.
Entre agosto e setembro, porém, uma guinada importante aconteceu e a empresa terminou o ano melhor do que previu. Em termos de investimentos, a RenauxView concluiu o que tinha sido planejado antes da pandemia. Em 2021, o faturamento foi um dos melhores da história.
“O Brasil e o mundo ficaram com medo, e, com a gente, não foi diferente”, conta Luiz Carlos Ferraz, gerente comercial da Florisa. Com a retomada do comércio, aos poucos, porém, a empresa correu atrás das novas oportunidades de mercado.
“Em todos os segmentos, existe uma visão pré e pós-pandemia. Sentimos que os clientes não estão vindo tanto para cá, realizamos mais atendimentos remotos. Para o têxtil, para a gente e nosso grupo de clientes, foi um baita aprendizado. Temos clientes que, hoje, vendem 100% on-line. Acelerou o processo de digitalização”, resume Kelly, uma das proprietárias da Florisa.
Novos desafios
Passado o período do auge da pandemia, os desafios para a indústria têxtil passaram a ser outros. Na Florisa, o objetivo atual é, cada vez mais, automatizar o parque fabril e crescer com sustentabilidade.
Hoje, a empresa conta com sete robôs que auxiliam no recebimento de malha e toda a produção é automatizada. Mesmo assim, a empresa tem uma política de remanejar os funcionários para outras funções para manter os empregos.
“Já estamos precisando da mão de obra para quando adquirirmos mais máquinas de tingimento e robôs, uma mão de obra mais qualificada. Por isso, temos que formar internamente. Mas não é de agora. Em 2008, quando começamos a automatizar nosso sistema, tínhamos funcionários que não sabia ler e escrever. Fizemos um auditório, em turnos separados, e contratamos o Ceja para dar aula aqui dentro da fábrica”, conta Ferraz.
No momento, o principal desafio da RenauxView é atender toda a demanda do mercado e encontrar profissionais. “Estamos com um volume de pedidos muito grande. Para lidar, vamos ajustando produção. Vivemos um pleno emprego aqui em Brusque”, lembra Marta.
Ela destaca que o setor é difícil de prever porque sofre muito a influência das importações, andamento da economia mundial e flutuação do dólar. Apesar disso, a projeção é otimista. “Acreditamos que não vivemos apenas um momento efêmero. A economia do país está se recuperando apesar da inflação. Temos muitos investimentos na nossa região”.
Susy, presidente da Atlântica, enxerga que, no momento, os comportamentos do público estão, outra vez, passando por mudanças. “Temos que trabalhar muito mais do que trabalhávamos no ano passado para fazer vendas. O setor de quem vende produtos para casa foi privilegiado. Ganhamos um merchan espontâneo do movimento “fique em casa””.
Mesmo com esse panorama desafiador, a Atlântica está atualizando seu maquinário, tornando-o mais eficiente e moderno, para superar os atuais e eventuais futuros desafios.
“As commodities ficaram, ao longo dos meses, fora do controle. Chegamos ao ponto de não saber se era melhor vender ou não. Com o consumo retornando ao normal e o poder aquisitivo que não comporta os aumentos, tivemos um primeiro semestre de 2022 bem desafiador. Mas superamos. Bola para frente. Acreditamos que o segundo será melhor, com a estabilização do preço do algodão e um semestre de resultados”.
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