O interior de Brusque, que até os anos 1960 era formado pelas áreas que hoje correspondem a Guabiruba, Botuverá, Vidal Ramos e Presidente Nereu – antigo distrito de Nilo Peçanha -, foi colonizado com base na agricultura familiar. As famílias que viviam nesta região se dedicavam às plantações e criações de porcos, galinhas e vacas para a sobrevivência. O excedente era vendido na vizinhança para se ter um lucro e melhorar as condições da casa.

Com o passar dos anos, a agricultura já não bastava para o sustento das famílias, que cresciam. Os lotes dos pequenos agricultores, da segunda e terceira geração dos colonizadores que trabalhavam na terra, não comportavam os filhos que se casavam e formavam novas famílias. As plantações de milho, aipim, batata, entre outros, não eram mais suficientes para uma vida confortável. Como nessas localidades não havia emprego, filhos e netos começaram a sair do interior em busca de uma vida melhor.

A região central de Brusque era o destino dessas famílias, pois as indústrias Renaux, Schlösser e Buettner estavam em pleno crescimento

A região central de Brusque era o destino dessas famílias, pois as indústrias Renaux, Schlösser e Buettner estavam em pleno crescimento e eram vistas como uma ótima oportunidade de melhorar as condições de vida.

O emprego com carteira assinada nas fábricas têxteis, na condição de operários, atraia os mais jovens. O historiador Aloisius Lauth lembra que naquela época não havia necessidade de conhecimento técnico. “Bastava o treinamento no próprio local de trabalho, que consistia em operar uma máquina de abridor de algodão, uma fiandeira, um tear ou um tanque de tinturaria”.

Aluizio Haendchen Filho/Curto Fotos Antigas de Brusque

Desta forma, a estrutura do município de Brusque começou a mudar. De acordo com Lauth, em 1940, a população da zona rural da cidade correspondia a 74,5%, enquanto que a urbana era de apenas 25,5% da total. A partir de 1940 a 1960, a estrutura demográfica de Brusque se inverteu. A população urbana atingiu 84,5%, devido ao êxodo rural no próprio município gerado pelo esgotamento da atividade agrícola.

Como impacto do êxodo rural em Brusque, Lauth destaca a urbanização crescente e desenfreada da área central da cidade, especialmente em torno das três grandes indústrias.

O êxodo do interior para a região central de Brusque gerou um excesso de mão de obra na cidade que as indústrias têxteis não conseguiram absorver. Lauth explica que, com isso, muitas pessoas de Brusque, nos anos 1950 e 1970, se transferiram para outros centros econômicos do país em busca de emprego e renda. 

“Acompanha o movimento da migração interna, do Sul para o Centro-Oeste brasileiro. Fenômeno semelhante ao anterior, porém a atratividade será agora as regiões mais distantes, como o Norte do Paraná e o Sul do Mato Grosso”.

Conforme Lauth, a migração originária de Brusque se deu a partir da procura por terras, salário e renda nas lavouras do Norte. O atrativo era terra barata no entorno de Londrina e Maringá.

A sociedade se tornou, na virada do século, mais aberta para o mundo, menos folclórica e tradicionalista

A migração tem como destino também a região, com a saída de pessoas para se empregar em Jaraguá do Sul, Joinville e Blumenau. Neste período, em Jaraguá, há o crescimento da WEG. Em Joinville, a atração da mão de obra se dá para a empresa Tupi e a nova fábrica da Consul. Em Blumenau, o atrativo é a Cia Hering e a Souza Cruz.

“Para Blumenau, em 1968, a ‘Rodoviária Expresso Brusquense’ abre linhas com ônibus direto de ida e volta para as fábricas da Hering e Sul Fabril, com saídas às 5h, 5h30, 6h e 6h30, quase sempre com assentos todos ocupados”.

Outro fenômeno observado pelo historiador é o que ocorreu em 1970, quando a classe média e a elite enviavam os filhos para estudar na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), em Curitiba e Florianópolis.

Foto: Erico Zendron/Curto Fotos Antigas de Brusque

 Os jovens que se formavam fora não retornavam mais à cidade porque não havia mercado para tanta gente.

Para Lauth, a migração de parte da população de Brusque para outros centros favoreceu a abertura da cidade para novas culturas, contribuindo para a busca por melhores padrões de vida. “A sociedade se tornou, na virada do século, mais aberta para o mundo, menos folclórica e tradicionalista. Assumimos o modelo de vida do neoliberalismo econômico mais depressa”, diz.

Essa abertura citada pelo historiador possibilitou a readequação do cenário migratório, e o início de um fluxo inverso: Brusque passou a ser, aos poucos, em vez de uma cidade exportadora de talentos e mão de obra, um lugar para onde aqueles com vontade de trabalhar e crescer se dirigiam.

Em sua tese de doutorado intitulada ‘Regimes de cidade: investigações acerca de experiências urbanas no Vale do Itajaí Mirim’, o historiador Álisson Sousa Castro aponta que entre os anos 1970 e 1980, a taxa de crescimento populacional do município era de 17%, bem abaixo do observado na década anterior, em torno de 33%.

De acordo com ele, Brusque volta a crescer significativamente a partir da administração do prefeito César Moritz, entre 1973 e 1977, quando novas indústrias se instalaram no município, o que contribuiu não só para a diversificação do parque fabril, mas também para a geração de empregos.

Tanto a diversificação fabril quanto a infraestrutura mais adequada foram preponderantes para a criação de empregos e, consequentemente, a atração de mão de obra

Além disso, ele avalia que o asfaltamento da rodovia Antônio Heil, em 1974, facilitou a vinda de turistas e clientes a Brusque o que possibilitou a intensificação na década seguinte das pequenas indústrias têxteis e culminou com o auge da rua Azambuja no início da década de 1990, assim como dos shoppings de moda neste mesmo período.

“Tanto a diversificação fabril quanto a infraestrutura mais adequada foram preponderantes para a criação de empregos e, consequentemente, a atração de mão de obra”, destaca.

É neste período que a cidade começa a receber famílias do Paraná e do Rio Grande do Sul. Anos mais tarde, chegam os migrantes do Norte e Nordeste e, mais recentemente, a cidade recebe haitianos e venezuelanos. Atualmente, Brusque é uma cidade plural, com oportunidades para todos. 

“Os poucos movimentos arredios perderam força ao longo do tempo, como foi a manifestação contrária a vinda de baianos para Brusque alguns anos atrás. Recebemos pessoas de várias regiões do país e até de fora que vem em busca de uma vida melhor, convivendo em harmonia”, avalia Lauth.


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